O Governo britânico criou nesta terça-feira (9/3) um Comitê Nacional para a Segurança do Jornalistas. Com representantes da administração pública, do setor jornalístico, das forças policiais, das promotorias de justiça e de entidades de defesa da liberdade de imprensa, o grupo tem a missão de implantar medidas que assegurem aos profissionais as condições para realizar seu trabalho livres de danos físicos e de ameaças.

A primeira tarefa do Comitê será a de desenvolver um Plano de Ação Nacional, com iniciativas para garantir a segurança dos jornalistas. Algumas delas já saíram do papel mesmo antes do plano. O Conselho Nacional de Chefes de Polícia nomeou um representante, Gavin Stephens, para assumir a responsabilidade em nível nacional por crimes contra jornalistas. E cada unidade local da polícia terá um oficial designado para cuidar de ameaças à imprensa.

O Comitê anunciou também o plano de treinar policiais para a investigação de crimes contra a imprensa e para a proteção dos jornalistas em coberturas de manifestações públicas, com o apoio do Sindicato Nacional de Jornalistas e da Sociedade de Editores.

Para subsidiar as próximas ações, a Secretaria Nacional de Tecnologia Digital, Mídia, Cultura e Esportes fará uma consulta pública junto com o departamento de Home Office (que reúne as funções de justiça e segurança) para quantificar e compreender a natureza das ameaças e abusos contra jornalistas.

A Secretaria está estudando ainda a possibilidade de criar um fundo de segurança de emergência para profissionais de imprensa. E anunciou que vai publicar uma cartilha de educação midiática para ajudar o público a entender melhor o papel do jornalismo na sociedade.

“Devemos proteger a segurança dos jornalistas e também sua liberdade de escrever e reportar. Enfrentamos tendências preocupantes de censura online a conteúdo jornalístico e a visões divergentes. Queremos garantir que nossas leis de segurança online incorporem proteções robustas para o jornalismo ”, disse o Secretário Oliver Dowden. 

Segundo o Secretário, Facebook e o Twitter se comprometeram a responder prontamente a ameaças à segurança dos jornalistas por meio das redes sociais. O Governo anunciou em dezembro um pacote legislativo para regular conteúdo nas plataformas digitais, que está em tramitação.

A Media Lawyers Association (Associação de Advogados de Mídia) comprometeu-se a produzir orientação para que jornalistas possam reconhecer quando o abuso infringe a lei e o que pode ser feito a respeito.

Outras iniciativas confirmadas são um treinamento em segurança para estudantes de jornalismo, um pacote de suporte online para profissionais de imprensa a ser implementado em conjunto pela Sociedade dos Editores e pela União Nacional de Jornalistas e um treinamento para funcionários e freelancers sobre como gerenciar ameaças e interagir com as forças de segurança pública em caso de ataques.

Ataques aumentaram 

O Reino Unido não tem tradição de ataques à mídia praticados pelo Estado ou por autoridades, embora em novembro de 2020 o Centro Europeu de Liberdade de Imprensa e Mídia (ECPMF) tenha pedido uma investigação independente a respeito de uma suposta manipulação de pedidos amparados pela legislação de acesso a informações públicas.

Mas durante a cobertura de protestos relacionados às medidas de controle da Covid-19, os casos de ataques a profissionais de imprensa aumentaram não só no Reino Unido como em várias nações europeias. Além disso, os registros de ameaças a jornalistas cresceram na Irlanda do Norte. 

O primeiro-ministro Boris Johnson, que antes de entrar para a política foi jornalista em importantes redações e é severamente escrutinado pela imprensa, deixou as diferenças de lado. Ele disse:

“A liberdade de expressão e a liberdade de imprensa estão no cerne da nossa democracia, e os jornalistas devem realizar seu trabalho sem serem ameaçados. Os ataques covardes e abusos dirigidos aos repórteres simplesmente por fazerem seu trabalho não podem continuar. Este plano de ação é apenas o início do nosso compromisso de proteger aqueles que mantêm o público informado e cobram o governo.”

A formação do comitê segue uma recomendação feita em abril de 2019 pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), a maior entidade intergovernamental voltada para a segurança do mundo. Diante do aumento generalizado de violência contra jornalistas, ela determinou aos Estados-membros o estabelecimento de grupos de trabalho dedicados a reforçar a segurança dos profissionais, formados por representantes de todas as áreas relacionadas.

Segundo a OSCE, os comitês de cada país devem verificar se todos os ataques e ameaças a jornalistas estão sendo devidamente investigados, além de melhorar os procedimentos de segurança, propor medidas de proteção e adotar ações preventivas para coibir ataques. 

No comunicado emitido após a primeira reunião do comitê, o Governo reconheceu que os jornalistas nem sempre estão seguros. O grupo se reunirá duas vezes por ano para monitorar as ações.

O Ministro da Mídia e Dados, John Whittingdale, lembrou a importância do jornalismo durante a crise de saúde pública:

“O aumento da desinformação durante a pandemia destacou mais uma vez o valioso papel desempenhado pelos profissionais das organizações de notícias para produzir jornalismo preciso, equilibrado e de alta qualidade. Devemos fazer tudo o que pudermos para garantir que eles possam cumprir sua missão livres de ameaças e de intimidação. ”

O Comitê poderá convidar jornalistas para ouvir suas experiências e sugestões. E convocar observadores para fornecer perspectivas internacionais. A Sociedade de Editores, que reúne as principais organizações jornalísticas britânicas, é uma das entidades participantes. O Diretor Executivo Ian Murray salientou a importância da iniciativa:

“O jornalismo desempenha um papel importante para manter a sociedade livre. No entanto, vemos cada vez mais jornalistas sendo alvo de violência e abuso. O papel deste comitê em apontar ações para combater isso é bem-vindo e de vital importância.”

Entre as forças de segurança pública que integram o Comitê destacam-se a Scotland Yard, a Procuradoria Real e a Polícia da Irlanda do Norte. Representando a imprensa do Reino Unido, também participam a News Media Association, a BBC, o Sindicato Nacional de Jornalistas e a CensorIndex. Como observadores, integram o grupo entidades como a Unesco, a Federação Internacional de Jornalistas e o Comitê para a Proteção de Jornalistas. 

A organização Repórteres Sem Fronteiras também aderiu. Rebecca Vincent, Diretora de Campanhas Internacionais da entidade, observou que a iniciativa chega num momento em que os riscos enfrentados pela imprensa nunca foram tão altos:

“Esperamos trabalhar com o Comitê para garantir mais proteção para jornalistas em todo o Reino Unido. Esse esforço serve de exemplo para outros países na defesa da liberdade de imprensa em todo o mundo.”