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Médico que defendeu cloroquina no Brasil é destacado em pesquisa mostrando aumento de fake news na França

Foto: Hakan Nural/Unsplash

Uma pesquisa da BBC Monitoring, divulgada no momento em que a França enfrenta um surto preocupante de infecções por Covid-19, mostra que houve um aumento na proliferação de fake news antivacina em francês nas redes sociais no ano passado. O médico Didier Raoult, que chegou a defender a cloroquina no Brasil, foi identificado como uma das principais influências. 

O levantamento aponta também que o engajamento de seguidores das páginas que compartilham esses conteúdos disparou. Houve crescimento de 30% no número de curtidas ao longo de  2020, que passou de 3,2 milhões para 4,1 milhões.

O Facebook diz que está investigando os grupos e páginas sinalizados pela pesquisa da BBC contento fake news antivacina. E garante ter removido 12 milhões de informações errôneas sobre vacinas aprovadas e sobre a Covid-19.

 

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Segundo o Reuters Covid-19 Tracker, a França enfrenta seu pior momento da crise sanitária desde o início de novembro, quando foi registrado pico no número de casos. A média diária de sete dias já está em 64% do pico desse indicador no país. Além de ser a maior da Europa, já é a quarta do mundo, atrás apenas do Brasil, Estados Unidos e Índia.

A especialista em desinformação da BBC Mariana Spring aponta que a França é um dos países mais céticos do mundo quanto à vacinação. E diz que embora a batalha entre os que são contra e a favor das vacinas esteja sendo travada em todo o mundo, ela é particularmente feroz na França, onde as fake news antivacina proliferam.

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A jornalista ouviu o professor universitário Tristan Mendes France, que ajuda a administrar o site Conspiracy Watch. Ele ressalta que há quinze anos, apenas um décimo da população da França era cética em relação às vacinas. 

Foto: Twitter Didier Raoult

Efeito Didier Raoult

A matéria enumera três razões que podem estar inflando as teorias da conspiração francesas. As duas primeiras são uma paixão pela liberdade pessoal e uma profunda desconfiança do estado.

A BBC mostra que as páginas com conteúdo antivacina em francês tendem a se misturar com postagens anti-establishment. Muitas das discussões giram em torno de preocupações de que a liberdade pessoal possa ser posta de lado para dar vez a uma vacinação obrigatória. Isso faria com que a democracia francesa fosse substituída por uma “ditadura sanitária”.

A terceira é o “efeito Didier Raoult”, um médico polêmico de Marselha que alcançou projeção nacional ao defender teses sem comprovação científica, ajudando a turbinar o avanço das fake news antivacina.

A fama do médico e microbiologista ultrapassou as fronteiras da França. Chegou a influenciar os opositores da vacina nos Estados Unidos e até no Brasil. Em 2020 ele virou notícia no país defendendo o uso da hidroxicloroquina contra a Covid-19, com base em um estudo feito com apenas 42 pacientes. 

O incidente resultou em uma reclamação formal de médicos brasileiros.  Em janeiro, Raoult foi obrigado a admitir que a substância não reduz a mortalidade ou o agravamento da doença.  

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Ainda assim, ele se tornou uma espécie de herói para os ativistas que propagam fake news antivacina. E ganhou mais notoriedade ao manifestar dúvidas sobre se pessoas com menos de 65 anos deveriam se imunizar. Para completar, citações fictícias falsamente atribuídas ao médico têm agravado ainda mais a desinformação no país.

Gastos públicos questionados 

Na opinião do professor Mendes France externada à BBC, as fake news antivacina se alastraram na França porque o movimento  joga com o ceticismo preexistente nas autoridades e nas empresas farmacêuticas. Ele lembrou que, com relação às vacinas, esse sentimento foi agravado em 2009.

Naquele ano, o governo francês gastou 600 milhões de euros para adquirir doses suficientes contra o vírus H1N1 da “gripe suína” para vacinar toda a sua população. Mas como a doença causou poucas centenas de mortes, muitos não quiseram se vacinar.

E o gasto foi visto como um escandaloso desperdício de dinheiro público. Já em 2021, o governo voltou a dar gás ao movimento antivacina depois que suspendeu o uso da vacina Oxford-AstraZeneca Covid-19 para liberá-la alguns dias depois, fomentando assim as narrativas de conspiração. 

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