MediaTalks em UOL

MI5 entra no Instagram para acabar com estereótipo de “espião bebendo martini”

Foto: Steve Smith/Unsplash

A entrada da agência de inteligência britânica M15 no Instagram é a prova mais recente de que não dá para ficar fora das redes sociais, nem mesmo para quem o sigilo é a alma do negócio. Depois de anos monitorando as mídias sociais para descobrir tramas terroristas e outras ameaças, uma das principais agências de espionagem do Reino Unido resolveu se render à rede controlada pelo Facebook, com mais de um bilhão de usuários em todo o mundo. 

A notícia divulgada nesta quinta-feira (22/4) foi recebida com simpatia e também muita ironia, dando margem a uma imensidão de trocadilhos nas redes. 

Agora é você quem pode seguir os espiões

Afinal, depois de 112 anos com a famosa agência secreta seguindo todo tipo de suspeito, a iniciativa abre a oportunidade de pela primeira vez você poder seguir os espiões! Ken McCallum, diretor geral do MI5, que aos 46 anos é o mais jovem da história a chefiar a agência secreta, não perdeu a piada.

Instando as pessoas a se inscreverem na nova conta @mi5official, ele disse:

“Você pode inserir sua própria piada sobre se estaremos seguindo você.”

Um dos motivos da mudança foi o espião mais famoso de todos, o legendário Bond, James Bond. McCallum disse que o esforço visa a mostrar um MI5 mais aberto, captar jovens para o serviço secreto, e, numa alusão a Bond, acrescentou:

“Queremos acabar com o estereótipo do agente secreto bebendo martini.”

Até 1993, nem o nome do diretor do MI5 era conhecido

Há três décadas, nem o nome de McCallum seria conhecido do público, e muito menos suas decisões.

O primeiro nome de um dirigente do MI5 que se tornou conhecido foi o de Stella Rimington, em 1993.

McCallum tem mais de 25 anos de serviço na agência secreta e supervisionou todas as operações de combate ao terrorismo durante as Olimpíadas de Londres de 2012. Formado pela Universidade de Glasgow, disse que nunca tinha pensado em ser agente secreto em seu período de formação.

O anúncio do ingresso do MI5 no Instragram aconteceu poucos dias depois de a agência ter alertado que as mídias sociais estavam sendo usadas por espiões estrangeiros para acessar informações confidenciais de mais de dez mil cidadãos britânicos.

O primeiro post a gente nunca esquece

O MI5 planeja usar a plataforma para desmascarar mitos populares sobre seu trabalho. Vai revelar na conta material de arquivo nunca visto, publicará perguntas e respostas com membros do serviço de inteligência e divulgará oportunidades de carreira.

Exposições históricas do museu do MI5, localizado no porão da sede em Londres, em Westminster, perto do rio Tâmisa, também serão compartilhadas pela primeira vez.

O primeiro post publicado mostra uma imagem rara para a maioria dos mortais: o hall de entrada da sede do serviço secreto.

Espiões não podem usar mídias sociais

A ironia da história é que o MI-5 inaugura sua nova fase mantendo a proibição de que seus espiões ingressem nas redes sociais. McCallum disse que a entrada nas redes foi um dilema que a agência teve que superar em um mundo cada vez mais aberto e conectado:

“Por um lado, nossa capacidade de servir ao público e manter o país seguro depende criticamente de operar secretamente. Por outro, seria uma vaidade perigosa imaginar que o MI5 pode fazer isso e construir todas as capacidades de que precisa dentro de sua própria bolha.”

Primeira vez que um diretor do MI5 escreve artigo

A nova era da agência rendeu outra novidade: a publicação do primeiro artigo de opinião escrito exclusivamente por um diretor-geral do MI5 para um jornal nacional em mais de um século.

O escolhido para a publicação do texto exclusivo foi o The Telegraph, que saiu na frente com a notícia ontem (21/4).

McCallum disse que o serviço secreto tinha uma “necessidade de se envolver” com o público, a academia e as empresas do setor privado, acrescentando: “É por isso que ser mais aberto é uma parte crucial da abordagem do MI5 na década de 2020 ”.

Hoje a cobertura conquistou grandes espaços em toda a imprensa britânica. E o Telegraph, retribuindo a gentileza, foi o que deu mais destaque em sua chamada de capa, enfatizando a nova era de abertura do órgão.

Dificuldade para quem atua no negócio de guardar segredos

Em seu artigo, McCallum disse que as operações da agência não se tornarão um “livro aberto” e que o ingresso nas redes sociais foi um pouco mais complicado do que para a maioria das organizações e empresas:

“Entrar no Instagram torna-se mais interessante quando você está no negócio de guardar segredos.”

Atração de novos agentes

A agência, famosa por ser retratada recrutando novos membros em encontros discretos e sombrios, passou a anunciar publicamente os cargos vagos nos últimos anos.

No artigo do The Telegraph, McCallum disse que a agência precisa continuar atraindo uma força de trabalho mais diversificada e superar qualquer associação “persistente” que as agências de inteligência possam ter com James Bond, o arquétipo do espião britânico branco, homem e educado nas universidades de elite de Oxford ou Cambridge.

Em uma referência à sua própria educação, crescendo em Glasgow, McCallum disse que o MI5 seria “mais forte” se recrutasse pessoas de “todos os tipos de lugares”, acrescentando:

“Incluindo, crucialmente, pessoas que nunca pensaram em trabalhar em lugares como o MI5. Eu já fui um desses. Nunca me passou pela cabeça que acabaria trabalhando na segurança nacional, muito menos em um cargo sênior. ”

Ele acha que a conta no Instagram pode ajudar no esforço de atrair os jovens para a carreira:

“Queremos transmitir um pouco mais do que o MI5 realmente é, para que as pessoas não se desestimulem por causa de barreiras imaginárias, como histórico socioeconômico, gênero, etnia, opção sexual, deficiência, ou em que parte do país nasceram.”

Dos cerca de 5 mil funcionários do MI5, 8,6% são negros, asiáticos ou de outras minorias étnicas.

Abertura prometida ao assumir cargo

Em seu primeiro compromisso com a imprensa em outubro de 2020, McCallum, que assumira o cargo em abril, já havia antecipado que queria que a agência altamente secreta “se abrisse e se expandisse de novas maneiras”, principalmente para se comunicar com o público mais jovem.

“Muito do que fazemos precisa permanecer invisível, mas o que somos não precisa ser. Na verdade, a abertura é a chave para nosso sucesso futuro.

Críticas às redes sociais

A escolha do Instagram acontece na semana em que seu controlador, o Facebook, foi criticado pela ministra do Interior, Priti Patel, a quem o MI5 é subordinado. A ministra uniu-se aos críticos da iniciativa da empresa de implantar a criptografia ponta a ponta no Instagram e no Facebook Messenger . Ela enfatizou que a medida, se implantada, por tornar mais difícil a identificação e captura de pedófilos justamente pelas agências de inteligência e de aplicação da lei.

O MI5 também criticou com frequência as mídias sociais e McCallum reconheceu isso.

Em seu artigo no Telegraph, ele aludiu à necessidade de as empresas de tecnologia fazerem mais para “combater a desinformação prejudicial apoiada pelo Estado e garantir que os terroristas não possam usar suas plataformas para planejar ou encorajar atos terroristas”.

Mas também elogiou as empresas de mídia social por sua capacidade de manter as pessoas em contato, ainda mais crucial durante a pandemia.

Outras iniciativas

O MI5 está relativamente atrasado quando se trata de espiões nas redes sociais.

No próprio Reino Unido, Richard Moore, o recém-nomeado chefe do Serviço de Inteligência Secreta (SIS), também conhecido por MI6 e lar de James Bond, tuíta frequentemente. Em uma de suas postagens recentes ofereceu condolências à rainha.

A agência de segurança cibernética GCHQ está no Twitter e tinha aderido ao Instagram em 2018. Nesse ano, um relatório de um comitê parlamentar criticara as agências de espionagem do país por não refletirem a Grã-Bretanha moderna e pela falta de mulheres e minorias étnicas em cargos de chefia.

Nos Estados Unidos, a CIA conta com 3,2 milhões de seguidores no Twitter.

Embora mais atrasada, deve-se reconhecer que a estreia do MI5 nas redes foi bem menos complicada do que a da pioneira GCHQ. Naquela ocasião, demorou semanas para que os funcionários da GCHQ concordassem com a redação de seu primeiro tweet, que dizia:

“Olá, mundo.”

Leia também

https://mediatalks.com.br/2021/04/22/estudo-do-instituto-reuters-sobre-confianca-na-imprensa/

 

Sair da versão mobile