A organizaรงรฃo nรฃo governamental Access Now, dedicada a defender os direitos humanos na internet, lanรงou um movimento para convencer governos e empresas a suspenderem desenvolvimento, comercializaรงรฃo e uso de tecnologias de reconhecimento facial e reconhecimento biomรฉtrico remoto, que na opiniรฃo da entidade permitem vigilรขncia em massa e discriminatรณria.
No Brasil, a discussรฃo recentemente girou em torno da aquisiรงรฃo pela Polรญcia Federal (PF) de um sistema com essa aplicaรงรฃo, o Abis. A meta seria criar uma base nacional de identificaรงรตes que facilite a busca por suspeitos e foragidos da Justiรงa.
A ferramenta, que cruza impressรฃo digital com reconhecimento facial, tem potencial de catalogar cerca de 50 milhรตes de brasileiros nos prรณximos 4 anos, podendo no futuro chegar a 200 milhรตes de pessoas, afirmou a PF.
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Para a ONG, as ferramentas de vigilรขncia tรชm a capacidade de identificar, seguir, selecionar, traรงar o perfil e rastrear pessoas onde quer que elas estejam, comprometendo os direitos humanos e as liberdades civis. A tecnologia de reconhecimento facial, segundo a organizaรงรฃo, รฉ “um ataque ร privacidade e ร proteรงรฃo de dados, aumentam a desigualdade e a discriminaรงรฃo e acabam impedindo a liberdade de expressรฃo e reuniรฃo, favorecendo a criminalizaรงรฃo de protestos”.
A Access Now formou uma coalizรฃo que inclui mais de 170 entidades da sociedade civil como a Anistia Internacional, Internet Freedom Foundation รndia, European Digital Rights, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e Human Rights Watch, alรฉm de ativistas, pesquisadores e especialistas em tecnologia.
Falha tรฉcnica pode gerar viรฉs racista, aponta organizaรงรฃo
Uma das demandas do movimento รฉ que governos suspendam investimentos de recursos pรบblicos em reconhecimento facial e tecnologias biomรฉtricas remotas. O analista de polรญticas da Access Now nos Estados Unidos, Isedua Oribhabor, explica:
โAmazon, Microsoft e IBM jรก deixaram de vender tecnologias de reconhecimento facial para a polรญcia. Os investidores estรฃo pedindo limitaรงรตes sobre como essa tecnologia รฉ usada. Isso mostra que o setor privado estรก ciente dos perigos que a vigilรขncia biomรฉtrica representa para os direitos humanos.”
Alรฉm das questรตes sobre privacidade, a Access Now sustenta que o reconhecimento facial e biomeฬtrico remoto tem falhas teฬcnicas que favorecem um viรฉs racista, porque a tecnologia รฉ menos acurada para pessoas com tons de pele mais escuros.
Dados sรฃo recolhidos sem consentimento, argumenta ONG
Mesmo que os sistemas sejam aprimorados para corrigir isso, a entidade acha que o reconhecimento facial ainda compromete os direitos individuais em duas frentes.
A primeira รฉ que os bancos de dados de rostos armazenados por esses sistemas saฬo geralmente obtidos sem o conhecimento, consentimento ou escolha livre daqueles que estaฬo incluiฬdos neles. Em segundo lugar, a possibilidade de identificaรงรฃo imediata de pessoas em espacฬงos acessiฬveis ao puฬblico inibe as pessoas de excercerem seus direitos, como a livre manifestaรงรฃo.
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“Apesar de alegacฬงoฬes questionaฬveis de que essas tecnologias aprimoram a segurancฬงa puฬblica, seus benefiฬcios nรฃo sรฃo compensados com a violaรงรฃo dos direitos individuais. Vemos cada vez mais provas de como essas tecnologias saฬo usadas de modo abusivo e implementadas com pouca ou nenhuma transpareฬncia”, diz o manifesto.
A Access Now aponta pesquisas que mostram que o uso de tecnologias de vigilaฬncia frequentemente leva ร criminalizaรงรฃo de comunidades marginalizadas e de baixa renda — as mesmas comunidades que tradicionalmente enfrentam o racismo estrutural e a discriminacฬงaฬo.
O manifesto pode ser assinado aqui.
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