Londres – A Comissão Europeia, braço político do Parlamento Europeu e responsável por definir as prioridades para a União Europeia (UE), colocou a segurança de jornalistas e a liberdade de imprensa oficialmente na agenda do bloco, determinando que os países-membros se empenhem em proteger profissionais de imprensa física e juridicamente.

Em discurso feito nesta quinta-feira (16/9), a vice-presidente da comissão, Vera Jourová, anunciou que o bloco prepara um conjunto de leis para assegurar o trabalho dos jornalistas na Europa, o Media Freedom Act. 

Segundo Jourová, o discurso é “o primeiro passo nas ações para fortalecer a resposta europeia no apoio à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação”. 

A comissão trabalha em dispositivos que protejam a imprensa dos abusos judiciais, usando processos contra jornalistas e empresas como meio de frear investigações jornalísticas.

“Esperamos que os países-membros investiguem e processem vigorosamente todos os atos criminosos contra jornalistas, fazendo pleno uso da legislação nacional e europeia existente. Os países-membros são incentivados a envolver as autoridades europeias, como a Europol e a Eurojust.”

Ela citou o caso do assassinato da jornalista maltesa Daphne Galizia como exemplo de que mulheres e representantes de minorias ameaçadas devem receber atenção especial contra o assédio e a violência contra a imprensa.

Galizia foi morta em uma explosão no seu carro. A jornalista era reconhecida pelo trabalho investigativo sobre corrupção e crimes ligados à elite financeira e política na ilha mediterrânea de Malta. Um empresário do ramo de cassinos, ligado a outras acusações de crimes financeiros, é o principal suspeito pela morte da jornalista.

No discurso da Comissão Europeia fica clara a condição de Rússia, Belarus e Afeganistão como o centro das preocupações em relação à liberdade de imprensa no momento. 

“Nossos esforços não se limitarão apenas à Europa. Queremos que a UE conduza esforços internacionais. Penso nas jornalistas no Afeganistão e, mais perto de nós, jornalistas detidas em Belarus e na Rússia”, apontou Jourová.

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Assédio online no caminho da liberdade de imprensa

A vice-presidente da Comissão Europeia apontou a relevância dos ataques virtuais, que podem levar à violência física. “Deixe-me ser claro em um ponto: é inaceitável quando a violência vem da boca — ou dos tweets — de líderes políticos”.

Jourová apontou que 73% das jornalistas declararam ter sofrido violência online durante o trabalho.

Além das ameaças, a comissão alertou que os países do bloco devem estar atentos para a espionagem a jornalistas e boicote ao jornalismo usando sabotagem tecnológica. 

“Organismos nacionais de segurança cibernética devem, mediante solicitação, ajudar os jornalistas que procuram determinar se seus dispositivos ou contas online foram comprometidos.”

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Assassinatos de jornalistas chocam a Europa

Além do sufocamento da liberdade de imprensa, principalmente no leste, em países como Polônia, Hungria, além de Rússia e Belarus, a Europa tem registrado ataques a jornalista com alto grau de violência em locais até então desacostumados com crimes desta natureza.

Na Holanda, a morte do jornalista Peter de Vries, rosto conhecido nacionalmente por uma carreira no jornalismo investigativo e programas de TV sobre crimes, chocou pela agressividade, um ataque a tiros, e também pelo local onde o crime ocorreu — o centro de Amsterdã. A principal tese é de que o jornalista foi alvo do crime organizado.

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A emissora RTL mudou a produção de local, saindo dos estúdios em Leidseplein para um bairro afastado na capital, que recebeu proteção policial especial devido às ameaças recebidas pela empresa após o assassinato do jornalista, que participava do programa RTL Boulevard.

Casos de agressões a jornalistas durante manifestações, registrados recentemente na Itália, mas também na França e na Inglaterra, foram citados pela vice-presidente da Comissão Europeia como uma preocupação. 

Em Malta, a investigação sobre a morte da jornalista Daphne Galizia mobiliza o país, que recentemente viu redações da imprensa, políticos e ativistas envolvidos no caso sendo alvo de uma campanha de desinformação, usando sites e emails falsos enviados em nome das vítimas, com o objetivo de destruir as suas reputações.

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