Julian Reichelt, editor-chefe do Bild, o maior jornal diário da Europa, foi demitido após uma investigação de abuso de poder envolvendo o relacionamento dele com funcionárias da publicação.
Em março, Reichelt havia sido afastado para a averiguação das alegações e da conduta do jornalista na empresa. Contudo, o grupo Alex Springer, dono do jornal, afirmou posteriormente que o editor-chefe errou, mas “não de natureza imperdoável”.
Nesta segunda-feira (18/10), a companhia anunciou que novos fatos foram descobertos e levaram à demissão.
“Axel Springer SE dispensou o editor-chefe do Bild, Julian Reichelt, de suas funções com efeito imediato”, disse a empresa em um comunicado.
“Reichelt não conseguiu manter uma fronteira clara entre questões privadas e profissionais e também mentiu ao conselho executivo. O conselho executivo, portanto, considera o encerramento de seu cargo como inevitável”, publicou o grupo.
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Revelação do New York Times no domingo pode ter influenciado demissão
Uma reportagem do jornal The New York Times deste domingo (17/10) revelou o relacionamento do jornalista com uma funcionária do Bild, que teria prestado depoimento nas investigações internas sobre o editor-chefe..
No comunicado do grupo Alex Springer nesta segunda-feira, a empresa menciona que “como resultado de investigações da imprensa, a companhia teve novas informações nos últimos dias” sobre a “conduta recente” de Reichelt..
O grupo afirma que as investigações contra o editor-chefe nunca foram no âmbito de assédio ou abuso sexual.
“Houve, no entanto, alegações de relações íntimas consensuais com funcionárias do Bild e indícios de abuso de poder nesse sentido. Um relacionamento anterior com uma funcionária do Bild foi comprovado e admitido. Resta saber se essa funcionária se beneficiou de sua carreira como um resultado”, afirmou o grupo Alex Springer.
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Durante as investigações, uma funcionária admitiu ter mantido relações com Reichelt e posteriormente ter sido promovida a um cargo que “ela não se sentia preparada” para exercer, de acordo com o Times.
“É assim que sempre acontece no Bild”, teria dito ela aos investigadores, segundo o jornal americano. “Quem dorme com o chefe consegue um emprego melhor.” Ela teria 25 anos, e Reichelt, 36, quando se envolveram.
No começo das investigações, editor-chefe havia admitido “erros”
Após a investigação interna no início do ano, Reichelt admitiu erros, de acordo com um comunicado. “Sei que cometi erros em meu comportamento com os colegas e não posso e não irei encobrir isso”, disse o editor-chefe em março. “A principal coisa pela qual me culpo é que magoei as pessoas pelas quais sou responsável. Lamento muito por isso.”
O grupo Alex Springer afirma que está entrando com ações legais contra “terceiros” que vazaram transcrições confidenciais, “segredos comerciais e comunicações privadas”.
O comunicado da empresa nesta segunda-feira não especifica contra quem são as ações judiciais.
Os terceiros teriam agido, disse o comunicado, “para influenciar e instrumentalizar a investigação de compliance da empresa por meios ilegais, evidentemente com o objetivo de destituir Julian Reichelt do cargo, bem como prejudicar o Bild e Axel Springer”.
Jornal Bild já chegou a ter 5 milhões de exemplares diários
O grupo de mídia Axel Springer tem mais de 16 mil funcionários em mais de 40 países.
Com capital aberto, o grupo está em meio a um processo de expansão nos Estados Unidos, após a aquisição do site de notícias financeiras Business Insider e a negociação do portal americano Politico, em um contrato avaliado em US$ 1 bilhão (R$ 5,5 bilhões) a ser concluído até o final do ano.
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O grupo ainda controla marcas líderes nacionais europeias, como Die Welt e Die Dame, na Alemanha, e Fakt, o jornal mais lido da Polônia.
O Bild é um tabloide de direita com circulação diária de cerca de 1,2 milhão de exemplares, mas que já chegou a ter mais de 5 milhões na década de 1980.
É o tabloide mais vendido não só na Alemanha como na Europa, acima do britânico The Sun, com cujo estilo é comparado. Tem cerca de 25 milhões de leitores por mês em seu site.
Veículos concorrentes criticam os padrões do Bild e o acusam de estar empurrando a Alemanha ainda mais para a direita.
Reichelt, que comandava a edição digital do jornal, assumiu como editor-chefe em 2018 e adotou uma linha crítica à primeira-ministra alemã, Angela Merkel, anti-Putin e pró-Israel.
Em abril do ano passado ele publicou um editorial intitulado “O que a China nos deve”, acusando o governo do líder chinês Xi Jinping de práticas contra os direitos humanos.
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