Concretizando anúncio feito em setembro, o governo de Hong Kong aprovou a lei que permite a censura de filmes que atentem contra a Lei de Segurança Nacional do país, e estabelece a punição para a exibição de produções proibidas, com até três anos de prisão e multa de US$ 130 mil (R$ 722,2 mil), noticiou a imprensa internacional nesta quarta-feira (27/10).
A lei possibilita também censurar filmes antes em exibição no país, mas ao mesmo tempo deixa livre de punição a veiculação de produções na internet.
A aprovação da lei consolida mais um passo do endurecimento do controle do governo chinês sobre o território, usando a segurança nacional como base para sufocar vozes dissidentes, entre jornais, ativistas e agora produções cinematográficas.
Governo afirma que “indústria não será afetada”; cineasta teme autocensura
Filmes considerados questionáveis ficarão até 28 dias suspensos sob análise do órgão regulador da censura de filmes, que irá analisar o potencial ofensivo da obra e fazer as considerações jurídicas julgadas necessárias.
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O secretário de Comércio e Desenvolvimento Econômico, Edward Yau Tang-wah, que havia anunciado a mudança na legislação em setembro, disse que a maioria dos filmes não será afetada e que as novas regras não devem prejudicar a indústria de cinema de Hong Kong, considerada uma das mais importantes da Ásia.
“Nosso objetivo é simples e direto — é melhorar nosso sistema de censura de filmes e prevenir e suprimir efetivamente qualquer ato que coloque em risco a segurança nacional”, disse ele durante a reunião do Conselho Legislativo, que aprovou a nova lei.
O cineasta Kiwi Chow, cujo documentário Revolution of Our Times, sobre os protestos de 2019, foi apresentado no Festival de Cinema de Cannes este ano, disse à agência de notícias Reuters que a lei vai “piorar a autocensura e aumentar o medo entre os cineastas”.
China avança contra vozes de oposição em Hong Kong e já fechou jornal
O avanço da censura do regime chinês chega à indústria do cinema como uma nova fase de uma ofensiva que vem atacando opositores em diferentes setores da cultura em Hong Kong.
A mesma Lei de Segurança Nacional foi usada para reprimir manifestações críticas ao governo, e deu base ao fechamento do maior jornal pró-democracia de Hong Kong, o Apple Daily, em junho. A redação foi invadida por forças policiais.
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Os executivos do grupo Next Digital, dono do Apple Daily, foram detidos por “conluio com um país estrangeiro ou com elementos externos que ameacem a segurança nacional”.
As autoridades de Hong Kong anunciaram o congelamento das ações do grupo, e seu fundador, Jimmy Lai, foi detido também por “motivos de segurança nacional” .
Museu sobre massacre em 1989 foi fechado, tanto prédio quanto versão online
O Massacre da Praça da Paz Celestial (Tiananmen), quando tanques chineses avançaram sobre a multidão que protestava em Pequim contra o regime comunista, em 1989, só podia ser lembrado em HJong Kong, uma vez que o governo chinês proíbe qualquer menção ao episódio.
Com a escalada da censura, uma das principais ativistas envolvidas no tributo anual às vítimas, Chow Hang-tung, advogada e vice-presidente da Aliança de Hong Kong em Apoio aos Movimentos Democráticos Patrióticos da China, foi presa em junho acusada de incentivar a perturbação da ordem.
O Museu 8964, site na internet que reproduz o museu físico, já fechado, que relembra o massacre, teve sua página derrubada em outubro, numa iniciativa não claramente atribuída à censura governamental.
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Até hoje, a censura do governo chinês e a ausência de qualquer relatório oficial tornam impossível saber quantas pessoas morreram naquela madrugada em Pequim. Relatos de jornalistas estrangeiros que presenciaram o massacre indicam que houve de 2.000 a 3.000 mortes.
O primeiro caso de censura sob a Lei de Segurança Nacional que Pequim impôs à cidade em 2020 surgiu em janeiro, quando as autoridades bloquearam o acesso ao HKChronicles, um site inspirado nos protestos contra o governo de Hong Kong em 2019 que publicou informações pessoais de policiais.
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