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Homens são condenados à prisão na Bélgica e no Reino Unido por assédio a mulheres jornalistas

Myriam Leroy (esq) e Louise Minchin (dir). Fotos: perfis pessoais

Londres – No ano em que o assédio online e offline a mulheres jornalistas se tornou mais frequente, duas decisões judiciais condenando homens que perseguiram profissionais de imprensa mostram que nem sempre a impunidade prevalece.

Na Bélgica, um homem que assediou a jornalista e escritora Myriam Leroy por nove anos foi condenado à prisão e ao pagamento de uma indenização no dia 21 de dezembro. 

No Reino Unido, a ex-apresentadora da BBC Louise Minchin, cujo perseguidor ameaçou estuprar sua filha adolescente, recebeu a notícia da condenação dele em 22 de dezembro. O homem pegou dois anos e oito meses de prisão.  

Mulheres jornalistas sofrem assédio online e offline 

O aumento de assédio a mulheres jornalistas tem sido constatado por várias pesquisas.

Em abril, a organização Repórteres Sem Fronteiras listou o Brasil entre as nações onde as profissionais de imprensa correm mais riscos. 

A jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, é um dos casos mais notórios no país. Ela ganhou processos movidos contra o  presidente Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo, por ataques nas redes sociais. 

Em maio, outro estudo confirmou a extensão do problema. A pesquisa The Chilling: global trends in online violence against women journalists ouviu 901 profissionais de 125 países e revelou que o abuso online inclui ameaças de violência sexual ou física que acabam se tornando realidade.

Mais de sete em cada dez entrevistadas disseram ter sofrido violência online. E uma em cada cinco das jornalistas ouvidas disse ter sofrido ataques ou abusos diretos associados a ameaças online.

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Myriam Leroy: quase 10 anos de assédio online 

Esse foi o caso de Myriam Leroy, de 39 anos. Ela já escreveu para vários veículos belgas e franceses, tem quatro livros publicados e é autora de documentários, tratando de questões femininas em suas obras. 

A jornalista foi alvo de assédio online por quase 10 anos, até que em 2019 saiu de quase de todas as redes sociais.

O homem que a perseguia enviava regularmente fotomontagens pornográficas e calúnias sexistas e antissemitas.

Segundo a revista Le Fiv, que em 2019 publicou uma extensa reportagem sobre o caso, ela o conheceu em 2011, quando era colunista de cultura de uma emissora de radio e ele dirigia um blog de música. 

A jornalista sugeriu ao homem que participasse de um documentário para uma emissora de TV. Ele recusou e passou a atacá-la nas redes sociais por “suas convicções políticas de extrema direita”.

Os ataques incluíram o então companheiro de Leroy e comentários agressivos sobre o seu trabalho. 

O perseguidor foi condenado no dia 21 de dezembro pelo Tribunal Criminal de Bruxelas a uma pena de prisão de 10 meses. Terá ainda que se submeter a orientação sobre violência contra mulheres e pagar 3 mil euros (R$ 19,1 mil) de indenização  pelos atos que configuraram assédio.

Myriam Leroy falou:

“É uma decisão forte e simbólica. “Há um aumento na violência online contra jornalistas mulheres que trabalham com questões de gênero, e eu sou uma delas”.

Ela observou que a maioria dos ataques perpetrados contra mulheres jornalistas nas redes sociais são abusos sexuais.

Louise Minchin: ameaças à filha adolescente

Ao contrário de Myriam Leroy, a ex-apresentadora da rede BBC Louise Minchin não conhecia o homem que praticou o assédio online, o ex-soldado Carl Davies.

A jornalista tinha grande visibilidade, como apresentadora do programa matinal Breakfast por mais de 20 anos, até setembro passado. 

Davies, que antes havia escapado da prisão depois de perseguir uma ex-namorada, fez ameaças via Instagram e Snapchat de estuprar a filha adolescente de Minchin, que administrava suas contas nas redes sociais.

O juiz do Tribunal de Mould Crown, no País de Gales,  condenou o perseguidor a uma pena de prisão de dois anos e oito meses em 22 de dezembro.

Mesmo assim, ela disse que pode nunca mais se sentiu segura em sua própria casa depois da perseguição que sofreu:

 “Nós ainda estamos traumatizadas pelo que tem sido uma experiência angustiante. As ameaças horríveis e detalhadas feitas contra nós tiveram um impacto devastador e duradouro.

Um ano e meio depois, ainda estamos profundamente angustiadas com o que aconteceu. Isso mudou nosso comportamento e abalou nossa sensação de segurança. Ainda estamos com medo e ainda passamos noites sem dormir”.

Continuamos ansiosas e vigilantes e extremamente cautelosas sobre para onde vamos, com quem falamos e verificamos sempre se trancamos as portas”.

A apresentadora contou que se sentia desesperada e desamparada por alguém ter feito ameaças tão horríveis contra a sua filha adolescente e não poder protegê-la de graves danos físicos e psicológicos.

Após a sentença, Minchin postou um breve comunicado em sua página do Twitter.

Ela escreveu:

“O dia de hoje marca o fim de um período muito angustiante para nós duas. Gostaria de agradecer à Polícia do Norte do País de Gales e ao CPS por seu trabalho árduo na investigação e julgamento do caso.

Espero que transmita uma mensagem clara de que as pessoas que fazem ameaças violentas pelas redes sociais podem ser encontradas, podem ser processadas e podem esperar uma pena de prisão”.

Federação reforça importância de apresentar queixa 

A Federação Internacional de Jornalistas considera que os sindicatos e associações de jornalistas têm um papel fundamental a desempenhar na defesa das jornalistas alvo de assédio online. 

A Associação de Jornalistas Profissionais da Bélgica forneceu apoio financeiro e moral a Myriam Leroy durante todo o processo.

Anthony Bellanger, Secretário-Geral da IFJ, disse:

“O assédio online mina a integridade dos jornalistas, tem um impacto significativo no seu trabalho e na sua saúde mental. 

A liberdade de expressão não deve ser exercida com a intenção de prejudicar  terceiros. 

Incentivamos veementemente as mulheres jornalistas que são objeto de assédio a registrar uma reclamação e a solicitar ao seu sindicato e associação o suporte de que precisam”.

Efeitos do assédio online e offline sobre o jornalismo

O estudo da organização  Repórteres sem Fronteiras publicado em abril examinou como o sexismo –  todas as formas de violência sexual e de gênero, entre elas discriminação, insultos, assédio sexual, toque, agressões verbais e físicas de natureza sexual, ameaças de estupro ou estupro – afeta a atividade jornalística.

O relatório mostra que a internet é o local mais hostil para mulheres jornalistas: para 73% das participantes, a violência de gênero ocorreu em plataformas online.

Além disso, 51% delas disseram que os casos de sexismo ocorreram na própria redação, por parte de superiores hierárquicos. E 61% declarou que, mesmo depois dos casos serem denunciados, nada foi feito. E apenas um de cada dez agressores perdeu o emprego. 

No que se refere às consequências da violência de gênero, quase 80% das participantes disse ter desenvolvido estresse, 65% angústia e 54% têm medo de perder o emprego. Além disso, quase metade delas teme por sua própria vida.

Knight Center oferece curso de segurança para jornalistas 

Entre os cursos oferecidos pelo Knight Center para o Jornalismo nas Américas está um treinamento de segurança para mulheres jornalistas, que também pode ser feito por qualquer pessoa interessada em aumentar seu grau de segurança online e offline. 

O programa foi apresentado durante quatro semanas em maio de 2021, e agora foi transformado em um curso autodirigido, que pode ser feito no horário de conveniência dos participantes. 

A instrutora é a ex-soldado e fotógrafa de conflitos Alison Baskerville, consultora de segurança para jornalistas. 

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