Londres – Nos dias que antecedem o início dos Jogos Olímpicos de Inverno de Beijing, marcados para esta sexta-feira (4), organizações internacionais de defesa do jornalismo e da liberdade de expressão estão elevando o tom de suas manifestações contra o ambiente de vigilância e de repressão à imprensa na China.
A Federação Internacional dos Jornalistas (IFJ) encaminhou uma carta ao presidente do Comitê Olímpico Internacional, Thomas Bach, afirmando que o sucesso da competição depende da capacidade de os jornalistas de trabalharem sem censura, ameaças ou espionagem por parte autoridades chinesas.
A Repórteres sem Fronteiras (RSF), em conjunto com outras 242 organizações de direitos humanos, cobra ampliação do boicote diplomático em resposta às violações praticadas no país.
Histórico de repressão na China
Além das manifestações formais, protestos aconteceram pelo mundo nesta quinta-feira, em países como EUA, Alemanha e Reino Unido.
Um deles reuniu ativistas tibetanos diante da sede do Comitê Olímpico Internacional em Lausanne, Suíça, acusando o COI de cumplicidade em “atrocidades” cometidas contra minorias étnicas na China ao realizar os Jogos em Pequim.
A carta enviada ao Comitê pela Federação Internacional de Jornalistas é assinada pelo secretário geral, Anthony Bellanger.
Ele explica que as preocupações com o trabalho dos jornalistas durante os jogos vêm de um longo histórico de repressão e violações da liberdade de imprensa na China nas últimas décadas, e de seu status de maior carcereiro de jornalistas do mundo.
A Federação afirma que as autoridades chinesas ignoraram repetidamente as exigências do Clube de Correspondentes Estrangeiros da China (FCCC) para melhorar o ambiente de trabalho dos jornalistas que cobrem os Jogos Olímpicos de Inverno, “e planejaram restrições profundas à liberdade de movimento dos jornalistas que levar à censura inevitável e reportagens limitadas durante os Jogos”:
“Vários repórteres internacionais denunciaram intimidação, ameaças, censura e tiveram credenciamento negado pelo Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim (BOCOG), enquanto muitos alertaram para o alto risco de dispositivos de jornalistas serem hackeados e rastreados.”
Bellanger faz um apelo ao Comité Olímpico para que defenda claramente os direitos dos jornalistas “e diga às autoridades chinesas que devem comprometer-se com os princípios fundamentais da liberdade de imprensa e proteger os direitos dos jornalistas”:
“A China deve tratar nossos colegas com igualdade, independentemente de seu país de origem, e não deve interferir em suas comunicações durante sua permanência profissional na China.”
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Críticas ao COI pela tolerância com a China
Muitos acham que apelos como o da Federação dos Jornalistas são em vão.
A presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, disse nesta quinta-feira (3) em uma audiência do Congresso sobre a China que os EUA têm o dever moral de condenar os abusos dos direitos humanos no país, e pediu aos atletas americanos que não se arrisquem a irritar o governo chinês “impiedoso”.
Pelosi criticou o Comitê Olímpico Internacional por “fazer vista grossa” às violações. Enquanto isso, nas redes sociais várias campanhas pedem boicote aos jogos.
#NoBeijing2022 #BoycottBeijing2022 pic.twitter.com/KpV1RVBPy0
— Heidi (@Heidi9070) February 3, 2022
Clube de Correspondentes relata crise sem precedentes
Na segunda-feira (1/2) o FFFC (Foreign Correspondents Club of China) publicou um relatório criticando duramente as condições de trabalho para os profissionais de veículos globais, consideradas fora dos padrões internacionais por 99% dos entrevistados.
Entre as denúncias feitas no documento intitulado “Confinado ou Expulso: cobrindo a China” está a de que vários jornalistas estrangeiros são vigiados de forma permanente, online e offline, e que pelo menos seis já tiveram que sair do país.
Problemas de credenciamento para os Jogos de Inverno e acesso permitido apenas à mídia estatal ou a jornalistas que não escrevem contra o governo foram também denunciados.
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Boicote diplomático contra a repressão
Como forma de protesto contra a perseguição massiva de jornalistas, a declaração que reuniu mais de 200 organizações, publicada em 27 de janeiro, pede que mais nações se unam a causa e que os patrocinadores corporativos dos Jogos incentivem os espectadores de todo o mundo a se informarem sobre repressão à livre expressão e situação dos direitos humanos na China.
“A comunidade internacional não pode ignorar os desastrosos registros de direitos humanos do presidente Xi Jinping e não deve permitir que ele instrumentalize os Jogos Olímpicos para encobrir seus crimes”, diz a carta.
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As entidades chamam atenção também para os abusos em massa contra uigures, tibetanos, grupos étnicos e de grupos religiosos independentes.
A ação tenta alertar a população sobre tudo que está ocorrendo por trás da realização dos jogos, pressionando o governo a se posicionar e agir de modo a combater a censura e a brutalidade.
Austrália, Canadá, Japão, Lituânia, Reino Unido e Estados Unidos estão entre os países que anunciaram um boicote diplomático aos Jogos em resposta às violações dos direitos humanos do governo chinês e não enviarão altos funcionários para as cerimônias de abertura ou encerramento.
O ‘Salto para Trás’ da China
A Repórteres Sem Fronteiras publicou no fim de 2021 um relatório intitulado ‘O Grande Salto para Trás do Jornalismo na China’, que revela a campanha de repressão liderada por Pequim contra o jornalismo e o direito à informação em todo o mundo.
A China ocupa o 177o lugar entre 180 no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da RSF, apenas dois lugares acima da Coreia do Norte, um país em que o jornalismo é sinônimo de propaganda estatal.
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Liberdade de imprensa
Em dezembro do ano passado, a China foi eleita pelas principais entidades de defesa da liberdade de imprensa como um dos piores países para o jornalismo em 2021, ao lado do México e do Afeganistão.
Nos dois últimos o problema é a alta taxa de mortes. Na China, as prisões.
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Os relatórios das organizações mostram a China como a nação que mais prende profissionais de imprensa.
As perseguições ao jornalismo agravaram-se em 2021, com o governo investindo contra jornalistas locais correspondentes estrangeiros baseados no país, assim como também vem fazendo a Rússia.
Zhang Zhan, jornalista chinesa presa no país por ter transmitido notícias sobre a Covid-19 a partir da cidade de Wuhan, em 2020, entrou em greve de fome e seu estado de saúde gerou um clamor internacional por sua libertação.
A censura na China afeta também empresas de mídia digital e veículos internacionais. Após o encerramento da operação do Linkedin na China, em outubro, o Yahoo decidiu também interromper todos os seus serviços de internet no país, em 1 de novembro.