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Análise | Ao pedir a súditos que aceitem Camilla como rainha consorte, Elizabeth II confirma Charles no trono

Príncipe Charles e sua mulher Camilla (foto: Instagram Clarence House)

Londres – No Jubileu de Platina da rainha Elizabeth, comemorado neste domingo (6), quem ganhou o maior presente foi a nora Camilla.

A mensagem oficial da soberana sobre a data alvoroçou os súditos e a mídia britânica na noite de sábado ao expressar o “desejo sincero” de que a mulher do príncipe Charles seja conhecida como rainha consorte. 

Mais do que um ato de simpatia à nora, de quem se tornou bem próxima, a mensagem coloca fim a uma especulação recorrente no país: a de que Charles poderia abrir mão do trono em favor de seu filho, William, como forma de modernizar a imagem da monarquia e ajudar a garantir sua continuidade. 

Mais do que rainha Camilla, o futuro da monarquia

Os 70 anos de reinado de Elizabeth II têm sido marcados por uma extrema habilidade de manejar a opinião pública, combinando charme, simpatia e movimentos bem sincronizados de comunicação. Este é mais um deles. 

Como é habitual, a comunicação do Palácio sobre quem a rainha quer que a suceda não foi direta e objetiva. Bem ao estilo “Elizabeteano” de comunicar, o recado sobre quem será o futuro rei foi passado nas entrelinhas. 

Na prática, o pedido da rainha Elizabeth não muda em nada a situação legal. Camilla já seria rainha consorte de qualquer forma quando Charles assumir o trono. 

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Divulgação Itamaraty

O que a soberana fez foi dar a ela uma demonstração pública de apoio, que alguns comentaristas especializados em assuntos da realeza chamaram de “selo de aprovação”. E que pode ir além da generosidade familiar.

Ao fortalecer a imagem de Camilla e colaborar para reverter a aversão sobre ela, a rainha indiretamente fortalece Charles, e por tabela a monarquia, que um número cada vez maior de britânicos questiona se deveria continuar após sua partida. 

É mais um exemplo de como a monarca quer continuar influenciando o futuro da instituição, tornando mais fácil a transição e o início do reinado de seu primogênito.

A mensagem da rainha sobre Camilla

Refletindo sobre o apoio que as pessoas mostraram a ela durante seu reinado de 70 anos, a rainha escreveu:

“Gostaria de expressar meus agradecimentos a todos vocês por seu apoio.

“Eu permaneço eternamente grata e humilde pela lealdade e carinho que vocês continuam me dando.

E quando, na plenitude dos tempos, meu filho Charles se tornar rei, eu sei que vocês darão a ele e à sua esposa Camilla o mesmo apoio. que vocês me deram; e é meu sincero desejo que, quando chegar a hora, Camilla seja conhecida como rainha consorte, continuando a servir lealmente.”

Camilla, a megera 

Aos 74 anos e com imagem bem diferente do glamour que da ex de Charles, a princesa Diana, Camilla é um case de sucesso de reposicionamento de imagem pessoal. 

Ela chegou a ser tachada pela mídia britânica de “a mulher mais odiada da Grã-Bretanha” na década de 90, por ser considerada o pivô da separação de Charles com a princesa adorada pelo povo. 

Charles e Camilla se conheceram na década de 70, eram amigos próximos e teriam namorado, mas cada um seguiu seu caminho. Ela casou-se com o oficial militar Andrew Parker-Bowles em 1973. Charles casou-se com Diana em 1981.

O relacionamento dos dois foi retomado durante seus casamentos, com lances dignos de novela. Um deles foi o chamado Camillagate, em que uma conversa telefônica entre os então amantes foi gravada ilegalmente. 

O futuro rei disse a Camilla que “queria ser o absorvente íntimo dela para morar dentro de sua calcinha.”

Diana não foi tão longe em indiscrições, mas na histórica entrevista à BBC em 1995 em que revelou a infelicidade na sua relação conjugal, deu a célebre declaração de que “havia gente demais naquele casamento”. 

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Reprodução BBC

Camilla, a princesa companheira 

Depois da morte de Diana, em 1997, a imagem da família real despencou, e o relacionamento entre Charles e Camilla seguiu discreto, para não ser mais um elemento a irritar os súditos.

Somente em 1999 o casal faria sua primeira aparição pública, na festa de aniversário da irmã de Camilla. Bem ao gosto da futura sogra rainha, Camilla não deu declarações e assumiu a postura que seria a sua marca: a discrição.

Desde então, a “Firma”, como é apelidada a família real, colocou em marcha um sólido plano de comunicação para reposicionar a imagem da duquesa da Cornualha, que por sua vez cumpriu o roteiro à perfeição.  

Ela passou a aparecer sempre ao lado de Charles, mas sempre como um apoio, e não com vida própria como Diana.

Gradativamente, passou a assumir funções reais, comparecendo a eventos ou sendo nomeada madrinha de instituições de caridade, passando a defender causas como proteção de animais e literatura. 

Os críticos dizem que Charles não dá um passo sem ouvir sua opinião, em tom de recriminação à sua influência. Mas há um lado positivo: a trajetória deles também pode ser vista como uma história de amor, que venceu barreiras e acabou com final feliz.

E quando esse final feliz termina com uma coroa de rainha, melhor ainda para a paciente e eficiente Camilla.

Camilla, ‘minha querida esposa’

Bem diferente do que parecia ser o casamento com Diana, Charles e Camilla aparentam ser um casal em harmonia. Nas fotos e imagem estão sempre sorrindo um para o outro, com ar de cumplicidade. 

O muitas vezes sisudo príncipe de Gales não esconde seus sentimentos. Na mensagem em que expressou a consciência sobre a responsabilidade de cumprir o desejo da mãe, assumindo o trono depois que ela se for, ele chamou Camilla de “my darling wife (minha querida esposa). E disse que ela tem sido seu esteio. 

Até as causas que a futura rainha consorte da Inglaterra defende não parecem ser mero acaso.

Além dos temas que Charles já apoiava, ela se engajou na batalha contra o estupro e a violência doméstica, extremamente ao agrado das mulheres – justamente aquelas que mais a tachavam de demolidora do lar de Charles e Diana. 

O que dizem as pesquisas sobre Camilla rainha

Na época do casamento, assessores reais garantiram que ela não queria ser rainha e preferiria ser conhecida como princesa consorte, a primeira na história britânica. 

Isso foi visto como um reconhecimento de que o público estava achando difícil aceitar a nova esposa de Charles, após o rumoroso divórcio da princesa Diana.

Mas não há nada que o tempo – e um plano de relações públicas bem executado – não cure, ou pelo menos não melhore.

Em 2005, apenas 7% dos britânicos achavam que ela deveria ser rainha, de acordo com uma pesquisa do instituto YouGov.

Em dezembro passado, o percentual já dobrara para 15%. Desde 2019, esse apoio à nomeação de Camilla como rainha vem se mantendo estável na faixa entre 13% e 15%. 

 

Por outro lado, 42% continuam preferindo que ela receba o título de princesa consorte e não de rainha. Mas isso foi antes do recente movimento da sogra. O apelo da rainha pode fazer com que as opiniões sobre Camilla mudem. 

No site Royal Family, um grande sinal de prestígio: o perfil dela já é o terceiro apresentado, logo após os da rainha e do príncipe herdeiro.

Popularidade de Charles aumenta 

Charles também tem visto sua popularidade aumentar diante de seus futuros súditos.

Segundo o YouGov, ele ganhou seis pontos em três meses, passando de 54% no final de agosto para 60% no início de dezembro.

Foi o maior aumento de admiração entre os membros da Família Real durante esse período.

A popularidade do Príncipe de Gales é maior entre os britânicos mais velhos. Enquanto os jovens de 18 a 24 anos se dividem com a mesma porcentagem entre os que o apoiam ou não (43%), uma ampla maioria (73%) das pessoas com mais de 65 anos veem o príncipe de forma mais positiva do que negativa (31%).  

Camilla, Duquesa da Cornualha, não recebeu no período o mesmo aumento de popularidade que seu marido, mas também conquistou mais admiradores. A opinião positiva sobre ela estava em 43% em agosto, em comparação com 45% em dezembro, enquanto 42% têm uma opinião negativa sobre ela.

O percentual dos que achavam em dezembro que Charles seria um bom rei é de 34%. O problema é que esse índice já foi mais alto antes da pandemia.

Mas esse apoio vem crescendo, e com as manifestações da rainha Elizabeth, associadas aos festejos do Jubileu, tende a melhorar.

A reputação da soberana é tão forte que ela é capaz de transferir um pouco de admiração para os que apontar como seus favoritos, como acaba de fazer com Camilla e com Charles. 

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