Londres – Jair Bolsonaro e Viktor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria que recebe nesta quinta-feira o presidente do Brasil, têm uma coisa em comum: ambos fazem parte da lista de 37 predadores da liberdade de imprensa”compilada pela organização Repórteres Sem Fronteiras em 2021.
Segundo a organização com sede na França, os selecionados para compor a lista são chefes de Estado ou de governo que “atropelam a liberdade de imprensa criando aparatos de censura, prendem jornalistas arbitrariamente ou incitam a violência contra eles, quando não têm sangue nas mãos porque pressionaram direta ou indiretamente para que jornalistas fossem assassinados.”
Orbán é o único governante europeu listado em 2021. E longe de ficar furioso, reagiu com ironia, postando um vídeo nas redes sociais em que tenta demonstrar a liberdade de imprensa no país ao comprar jornais de oposição em uma banca.
Bolsonaro e Orbán, da Hungria, estrearam na lista
A seleção da RSF inclui nomes veteranos em violações da liberdade de imprensa e alguns estreantes, entre os quais se incluem Jair Bolsonaro e Viktor Orbán, da Hungria.
Ao justificar a inclusão de ambos, em julho de 2021, a RSF disse:
“O presidente brasileiro Jair Bolsonaro mantém uma retórica agressiva e grosseira sobre a mídia, que atingiu atingiu novos patamares desde o início da pandemia.
O húngaro Viktor Orbán, autodidata proclamado campeão da “democracia iliberal”, tem minado constante e efetivamente o pluralismo e a independência da mídia desde que voltou ao poder, em 2010.”
Desde o retorno de Orbán ao poder como primeiro-ministro em 2010, a Hungria caiu 69 posições no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da RSF e agora está em 92º lugar entre 180 países.
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Segundo a Repórteres sem Fronteiras, a mídia independente da Hungria, país visitado por Bolsonaro como parte de seu roteiro na Europa, foi “subjugada ou reduzida ao silêncio” depois que os radiodifusão pública foi transformada em órgão de propaganda política governamental”.
” Os métodos podem ser sutis ou descarados, mas são sempre eficientes.
Graças a manobras político-econômicas e à compra de empresas de mídia por oligarcas próximos ao Fidesz, o partido no poder, ele agora controla 80% do cenário midiático do país.
No topo está a fundação Kesma, que possui aproximadamente 500 organizações de mídia pró-governo.”
A organização aponta também que os meios de comunicação independentes são discriminados na publicidade governamental e no acesso a informações oficiais.
“Seus jornalistas são sistematicamente denegridos na mídia pró-governo, que os chamam de fornecedores de “notícias falsas”.
Essa acusação foi criminalizada durante a crise da covid-19, gerando como efeito a autocensura dos jornalistas e de suas fontes.”
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Primeiro-ministro da Hungria ironizou lista
Em vez de reclamar ou justificar seus atos, o líder da Hungria Viktor Orbán preferiu reagir com ironia à presença na lista em que teve Jair Bolsonaro como “companheiro”.
Um vídeo de 80 segundos postado nas contas do Facebook e Twitter do governo húngaro em 7 de julho mostra Orbán visitando uma banca de jornais.
The press situation in Hungary is apparently so grave that there are at least a dozen papers available at every newsstand that are critical of Orbán's government. WATCH the PM as he talks to this newspaper vendor: pic.twitter.com/dhFnGre2Gk
— Zoltan Kovacs (@zoltanspox) July 7, 2021
“Eu vim aqui porque eles colocaram a Hungria em algum tipo de lista sobre os inimigos da liberdade de imprensa”, diz ele ao vendedor de notícias.
Ele então menciona “algum tipo de organização que pertence ao tio George Soros”, referindo-se ao filantropo bilionário americano nascido na Hungria, que Orbán culpa por todos os males da Hungria.
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À medida que a conversa supostamente espontânea continua, Orbán pergunta ao jornaleiro quantos jornais críticos ao governo ele vendeu.
O fornecedor lhe entrega cópias de vários semanários independentes, incluindo HVG, 168 Ora e Magyar Narancs, e diz que nenhum de seus clientes os comprou há várias semanas.
O vídeo termina com Orbán comentando ironicamente:
“A liberdade de imprensa deve estar em um estado realmente miserável se eles falarem mal apenas nesses jornais”.
Ele então leva a ironia ainda mais longe comprando uma cópia do Népszava, um diário independente que tinha sido recentemente multado e forçado a se desculpar por publicar um desenho animado crítico ao manejo do governo da epidemia de covid-19.
RSF reage furiosa a líder da Hungria
A RSF não achou graça na brincadeira de Viktor Orbán.
“Você pode brincar e encenar uma resposta risível, primeiro-ministro, mas sua política de perseguir o jornalismo está sendo levada muito a sério nas capitais europeias e em outros lugares”, disse o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire.
“A ironia e o escárnio não serão suficientes para você fazer as pessoas esquecerem a escala da destruição da mídia independente na Hungria e o pesado custo que ela está cobrando à imagem do país”.
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