Londres – O Relógio do Apocalipse, que usa a metáfora do tempo que falta para a meia-noite do “juízo final” para simbolizar os riscos de extinção da humanidade, nasceu inspirado pela ameaça nuclear, mas ao longo dos anos incorporou outros riscos, como o das armas biológicas e das crises de saúde pública globais.
No segundo do aniversário da decretação da covid-19 como pandemia global pela Organização Mundial de Saúde e com o mundo em suspense com a possibilidade de a Rússia usar armas químicas contra a Ucrânia, vale conferir o que o painel de cientistas do Doomsday Clock, que inclui 11 detentores de prêmios Nobel, alertou no boletim de 2022 para justificar a manutenção dos ponteiros a 11 segundos para meia-noite.
Eles afirmam que o coronavírus está longe de ser o pior cenário. E que a má resposta global à covid-19 mostra que um ataque usando agentes biológicos capazes de resistir aos recursos médicos existentes pode levar a uma catástrofe caso essas armas sejam usadas por organizações terroristas – ou em guerras como Rússia e Ucrânia.
A história do Relógio do Apocalipse
Criado em 1945 por Albert Einstein e cientistas da Universidade de Chicago que ajudaram a desenvolver as primeiras armas atômicas no Projeto Manhattan, o Bulletin of the Atomic Scientists (Boletim de Cientistas Nucleares) estabeleceu o Doomsday Clock dois anos depois.
Foi uma ótima ideia de relações públicas, usando as imagens do apocalipse (meia-noite) e o idioma contemporâneo da explosão nuclear (contagem regressiva para zero) para simbolizar as ameaças à humanidade e ao planeta.
O horário do Relógio do Juízo Final é definido todos os anos pelo Conselho de Ciência e Segurança, um grupo de especialistas que inclui 11 ganhadores do Prêmio Nobel.
O Doomsday Clock tornou-se um elemento da cultura pop e um indicador universalmente reconhecido da vulnerabilidade do mundo diante das mudanças climáticas, de tecnologias disruptivas, das armas nucleares e das guerras biológicas.
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Os cientistas alertam que apesar de toda a atenção dada pelos governos mundiais ao combate à pandemia, ela acaba de completar dois anos desde seu reconhecimento oficial pela Organização Mundial de Saúde (em 11 de março de 2020), com taxas de vacinação lentas que permitiram as mutações do vírus.
O resultado foi o adoecimento e morte de dezenas de milhões, o enfraquecimento das economias e a desestabilização de governos e sociedades. Mas isso, segundo a análise, está longe de ser o pior cenário.
Os cientistas dizem que o potencial da ameaça biológica é ainda mais grave. E que prevenir e mitigar danos ainda maiores no futuro exigirá uma lente mais ampla e esforços maiores.
O problema maior, segundo eles, é que esse perigo vem sendo menosprezado, com a falta da atenção à resistência crescente aos antibióticos, que pode desencadear uma nova pandemia mundial envolvendo organismos patogênicos resistentes dentro de uma década.
Além disso, a falta dos cuidados adequados para monitorar e regular laboratórios de pesquisa, que exigiriam processos muitas vezes percebidos como excessivamente onerosos e restritivos, tem aumentado os riscos de liberação inadvertida de organismos nocivos no meio ambiente.
O relatório enfatiza que o Departamento de Estado dos EUA declarou que a Rússia e a Coreia do Norte possuem programas ativos de armas biológicas. Além disso, o órgão expressou preocupação com os programas de pesquisa biológica de dupla finalidade na China e no Irã.
Por outro lado, o painel alerta que organizações terroristas como Al Qaeda e Estado Islâmico e algumas organizações criminosas continuam a anunciar sua determinação em construir, adquirir e usar armas biológicas para atingir seus objetivos.
A resposta globalmente inadequada à covid-19, segundo o estudo, serve para enfatizar as vantagens táticas, operacionais, estratégicas e econômicas que um ataque usando uma arma contendo agentes biológicos pode fornecer aos agressores.
Os cientistas alertam que a preocupação com essa perspectiva está fazendo com que o Departamento de Defesa dos EUA realize uma ampla revisão de suas estratégias na área biológica.
Os prós e contras da inovação biológica, segundo o painel do Relógio do Apocalipse
A atual era de inovação biológica, caracterizada por esforços de pesquisa e desenvolvimento inovadores, tem o poder de diminuir e aumentar simultaneamente o risco biológico.
Para os cientistas do Relógio do Apocalipse o cenário está se movendo rapidamente. A CRISPR-Cas9, a revolucionária ferramenta de engenharia genética que cientistas dos Estados Unidos e da Suécia descobriram em 2012, é barata e onipresente hoje, estimulando investimentos em testes genéticos e tecnologias de células-tronco adultas.
“Muitos países e corporações estão fazendo enormes investimentos em ciência biológica, biotecnologia e ciência e tecnologia combinadas (nas quais a biologia se combina com outros campos), reconhecendo que têm imensas oportunidades para estabelecer e desenvolver bioeconomias.
Países e corporações estão explorando maneiras de criar super soldados, personalizar a medicina, aumentar o desempenho humano e melhorar a terapia genética.
Inovações como a biologia sintética têm propiciado novas áreas de descoberta, mas testando os limites de saúde pública, segurança e proteção.”
Para o painel, o mundo está falhando em reconhecer a natureza multifacetada da ameaça biológica:
“Os avanços na ciência e tecnologia biológicas podem nos prejudicar e também nos ajudar. Os líderes devem reconhecer que a covid-19 não é a última ameaça biológica que teremos que enfrentar em nossas vidas – ou, talvez, neste ano.”
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