A greve realizada na Tunísia por jornalistas de quatro organizações púbicas de mídia no sábado (2) contra a repressão governamental e tentativas do presidente Kaïs Saied de controlar a imprensa estatal foram uma reação a um movimento que tem se repetido em outros países.

Governos autoritários em diversas partes do mundo tentam controlar a mídia estatal e jornalistas resistem às interferências o máximo que podem.

Exemplo recente foi visto no protesto contra a guerra na Ucrânia feito pela editora russa Marina Ovsyannikova, que invadiu a transmissão ao vivo do jornal de maior audiência do Channel One com um cartaz denunciando a propaganda estatal de Vladimir Putin.

Jornalistas fazem greve dias depois da dissolução do Parlamento da Tunísia

Na Tunísia o protesto foi diferente. Jornalistas da TV nacional, da rádio nacional, da agência de notícias Tunis África (TAP) e da editora La Press paralisaram suas atividades por um dia inteiro para chamar a atenção sobre o aumento da repressão contra a imprensa na Tunísia.

A greve ocorreu três dias após Saied anunciar a a dissolução do Parlamento, que já estava suspenso há oito meses, quando o mandatário assumiu plenos poderes em julho de 2021.

A iniciativa também foi em protesto contra a prisão do jornalista Khalifa Al-Qasimi por se recusar a revelar suas fontes às autoridades. Sua prisão provocou manifestações de grande parte do setor de mídia da Tunísia.

Comunicado do Sindicato Nacional dos Jornalistas da Tunísia (NSTJ, na sigla em inglês) disse que a greve geral de 2 de abril era uma reação às “tentativas de controle da mídia pública” e “políticas de indiferença e negligência praticadas pelas autoridades”, que deixaram a mídia tunisiana “subfinanciada, marginalizada e desprotegida”.

A greve foi forçada por “falta de interação séria ou negociação de qualquer pessoa dentro do governo”, acrescentou o comunicado.

Os veículos envolvidos suspenderam quase toda a cobertura, concentrando sua atenção apenas na greve em si – e em “assuntos extremamente urgentes de interesse público necessário”, informou o sindicato.

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A greve estava sendo organizada e comunicada publicamente desde o dia 11 de março, segundo informações do site The New Arab

A paralisação dos jornalistas da mídia estatal da Tunísia começou às 11h (horário local), depois que o sindicato disse que as demandas dos profissionais não foram atendidas.

Jornalistas na Tunísia recebem apoio de entidades internacionais

A greve teve o apoio da Federação Internacional de Jornalistas (IFJ) e outras entidades internacionais que defendem a liberdade de imprensa.

O vice-diretor regional da Human Rights Watch, Eric Goldstein, disse na semana passada que o presidente Kaïs Saied “começou a desmantelar as verificações institucionais sobre sua autoridade desde sua tomada de poder em julho, e a televisão estatal é um alvo óbvio”.

“A televisão da Tunísia está passando por seu pior período desde a revolução de 2011”, disse o presidente do NSTJ, Mohamed Yassine Jelassi, ao site parceiro do New Arab, al-Araby al-Jadeed.

“[A mídia estatal] tornou-se monopolizada pelos partidários do presidente Saied e suas decisões, e ficou livre de qualquer oponente”, afirmou Jelassi.

A liberdade de expressão e de imprensa foi um ganho fundamental para os tunisianos após a revolução de 2011 que encerrou o governo do ex-presidente Zine El Abidine Ben Ali e desencadeou os protestos da Primavera Árabe, destaca o New Arab.

No entanto, o sistema democrático adotado após o levante está em profunda crise desde que Saied suspendeu o Parlamento no ano passado, tomou o Poder Executivo e ignorou a constituição para governar por decreto.

A repressão a jornalistas, como era de se esperar, também foi intensificada nesse período.

Há um ano, a polícia invadiu a sede da agência de notícias TAP para tentar conter a reação dos jornalistas à nomeação de um político como diretor-geral. 

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