Londres – Em um baque para os que ainda acreditavam em punição no caso do jornalista Jamal Khashoggi, assassinado em solo turco, o Supremo Tribunal da Turquia atendeu ao pedido da promotoria e decidiu transferir o processo que investiga sua morte para a Arábia Saudita.
Colunista do Washington Post e crítico do regime comandado pelo príncipe Mohammed bin Salman, Khashoggi foi morto em 2028 dentro do consulado de seu país, onde havia entrado para uma audiência agendada a fim de receber documentos necessários ao casamento com a turca Hatice Cengiz.
As chances de que o governo saudita seja responsabilizado pelo assassinato em um julgamento em Riad são mínimas, o que revoltou entidades de defesa da liberdade de imprensa.
Processo do jornalista assassinado vai para Riad
O processo sobre o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi começou em julho de 2020. Vinte e seis réus – todos cidadãos sauditas – estão sendo julgados à revelia, com representação legal indicada pela Ordem dos Advogados de Istambul.
A decisão de mandar o julgamento para Riad foi anunciada em Istambul no dia 7 de abril.
Segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras, advogados da noiva do jornalista assassinado, que luta incessantemente por justiça, pediram em vão que o Tribunal aguardasse a decisão do Tribunal Administrativo contra a aprovação do Ministério da Justiça sobre a transferência do caso para Riad.
Como resultado, a Turquia encerrou o processo da morte de Khashoggi no país. Os advogados ainda podem contestar a decisão perante o Tribunal Superior, mas a anulação da decisão parece impossível, segundo a RSF.
“Estamos profundamente chocados […] com a decisão do Supremo Tribunal Criminal de enviar o processo do assassinato de Jamal Khashoggi de volta à Arábia Saudita”, disse o representante da RSF na Turquia, Erol Önderoğlu. “As esperanças de justiça foram frustradas, mas a RSF continuará desafiando por todos os meios essa impunidade inaceitável. “
Em 31 de março, na última audiência no julgamento do assassinato de Jamal Khashoggi no Tribunal Çağlayan de Istambul, após 21 meses de processo, o promotor turco apoiou o pedido formal da Arábia Saudita para assumir o caso e pediu que o caso fosse entregue e os procedimentos turcos encerrados. Suas recomendações foram rigorosamente seguidas pelo Tribunal Penal Superior.
Gokmen Baspinar, advogado de Cengiz, disse na quinta-feira que a decisão de transferir o caso para a Arábia Saudita é contra a lei, acrescentando que significa entregar a soberania da Turquia. “O fato de o julgamento estar sendo transferido para um país onde não há justiça é um exemplo de irresponsabilidade contra o povo turco”, disse Baspinar ao tribunal.
Responsabilidade do príncipe saudita no assassinato do jornalista
Em março de 2021, o tribunal rejeitou o pedido da noiva de Khashoggi, Hatice Cengiz, para aceitar como evidência o relatório de inteligência dos EUA nomeando a o príncipe Mohammed bin Salman como responsável pela aprovação do assassinato de Khashoggi.
Ao saber do envio do caso para a Arábia Saudita, ela afirmou que a luta por justiça não acabará.
"My fight for justice for Jamal is not over. The courts might have decided that they can ignore the truth about his case, but I will not stop and I will not be quiet about it. We all know who is guilty of Jamal's murder and it is now more important than ever that I keep going.” pic.twitter.com/x98ZImDRzf
— Hatice Cengiz خديجة (@mercan_resifi) April 7, 2022
A Arábia Saudita realizou seu próprio julgamento secreto no caso em 2020, que “zombou da justiça”, segundo a RSF.
Oito réus nunca identificados receberam sentenças que variam de 7 a 20 anos de prisão. Outros três acusados foram absolvidos, incluindo altos funcionários sauditas.
Eles estariam vivendo em um condomínio de luxo, segundo notícias da mídia internacional não confirmadas pelo governo saudita.
A Repórteres Sem Fronteiras afirma que existem 28 jornalistas presos em conexão com seu trabalho na Arábia Saudita.
O blogueiro Raif Badawi segue proibido de viajar para se reunir com a sua família que vive no Canadá após sua recente libertação da prisão depois de uma sentença de 10 anos.
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A Turquia está classificada em 153º e a Arábia Saudita está em 170º entre 180 países no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa de 2021 da RSF .
Entenda o caso do jornalista saudita assassinado
Em 2 de outubro de 2018, Khashoggi, um influente jornalista que escrevia regularmente para o jornal americano Washington Post, entrou no consulado para iniciar os trâmites do casamento com sua companheira turca Hatice Cengiz.
Eram 13h e ela ficou do lado de fora. Continuou aguardando por 12 horas, sem que ele deixasse o prédio.
Segundo autoridades americanas e turcas, um esquadrão saudita esperava pelo jornalista lá dentro. Ele teria sido estrangulado e seu corpo desmembrado para ser ocultado.
O assassinato do jornalista saudita gerou indignação internacional. Agências de inteligência ocidentais afirmaram que o príncipe herdeiro do reino, Mohamed bin Salman, autorizou o crime.
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O príncipe, de acordo com a agência AFP, afirma que aceita a responsabilidade da Arábia Saudita no caso, mas rejeita qualquer vínculo pessoal com o assassinato.
Autoridades da capital do país, Riad, afirmaram que o jornalista foi assassinado por agentes sauditas que teriam atuado por conta própria, algo difícil de acreditar levando-se em conta o controle absoluto do príncipe sobre o país.
Embora o governo tenha inicialmente negado qualquer papel no assassinato do jornalista, mais tarde responsabilizou funcionários no que chamou de “operação de captura mal sucedida”. Os condenados tiveram as penas amenizadas.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou na época do crime ocasião que a ordem para a morte do jornalista “veio dos níveis mais elevados” do governo saudita.
No entanto, a decisão da justiça turca de encaminhar o processo para a Arábia Saudita foi interpretada por analistas como uma tentativa de Erdogan de melhorar o relacionamento com Riad.
Em declaração à agência Reuters, a noiva do jornalista assassinado criticou a Turquia por “desistir de seus princípios para reparar os laços com outro país”.
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