Londres – Jornalistas e entidades que defendem a liberdade de imprensa, incluindo a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês), Repórteres Sem Fronteiras, PEN International e Article 19, divulgaram uma carta pressionando o governo britânico a rejeitar a extradição de Julian Assange para os Estados Unidos.

Depois de todas as etapas processuais concluídas, a corte britânica devolveu no dia 20 de abril o caso do fundador do WikiLeaks ao Ministério do Interior do Reino Unido, chefiado pela secretária de Estado para Assuntos Internos, Priti Patel.

Assange é procurado pela Justiça americana desde 2010 por publicar segredos militares no site WikiLeaks e responde a processos que podem levar a 175 anos de prisão no país. Os EUA conseguiram reverter uma decisão de janeiro 2021, que impedira a extradição devido ao estado emocional de Assange.

Extradição de Assange é vista com ‘séria preocupação’

Na carta publicada pelo IFJ, 19 organizações defensoras da liberdade de imprensa e expressão cobram nominalmente a secretária britânica Priti Patel para que a extradição de Assange seja barrada.

O fundador do Wikileaks está detido na prisão de alta segurança de Belmarsh, em Londres desde que foi removido da embaixada do Equador na capital inglesa há três anos.

No documento, os signatários expressam “séria preocupação” com a possibilidade de extradição de Assange para os EUA.

“É altamente provável que ele seja detido lá em condições de isolamento ou confinamento solitário, apesar das garantias do governo dos EUA, o que exacerbaria severamente seu risco de suicídio.”

“Incitamos [Priti Patel] a agir no interesse da liberdade de imprensa e do jornalismo, recusando a extradição e libertando imediatamente Assange da prisão preventiva que vem cumprindo há três anos, apesar dos grandes riscos para a sua saúde mental e física.”

Ainda segundo as entidades, Assange seria incapaz de se defender adequadamente nos tribunais dos EUA.

Seu caso, prosseguem, abriria um “precedente perigoso” que poderia ser aplicado a qualquer veículo de comunicação que “publicasse reportagens baseadas em informações vazadas, ou mesmo a qualquer jornalista, editor ou fonte em qualquer lugar do mundo.”

Leia o documento na íntegra neste link.

Outras manifestações e petição contra a extradição de Assange 

Com a decisão sobre a extradição de Julian Assange nas mãos da secretária de Estado para os Assuntos Internos, Priti Patel, as próximas semanas serão de alta pressão sobre o governo britânico — prazo limite para que algo seja definido.

Manifestantes se reuniram diante do tribunal no dia do julgamento que devolveu o caso para o governo britânico. 

A mobilização de entidades de defesa da liberdade de imprensa e de expressão como a Anistia Internacional começou imediatamente após a sessão. 

A declaração da Anistia diz que se extraditar ou enviar Assange por qualquer outro meio para os EUA, o Reino Unido estará desrespeitando a legislação internacional de direitos humanos. 

https://twitter.com/wikileaks/status/1516709612027879428

A organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) lançou uma nova petição pedindo à secretária do Interior que rejeite a extradição de Assange para os Estados Unidos. 

“Por meio desta petição, buscamos unir aqueles que se preocupam com o jornalismo e a liberdade de imprensa para responsabilizar o governo do Reino Unido”.

“A ministra do Interior deve agir agora para proteger o jornalismo e aderir ao compromisso do Reino Unido com a liberdade de mídia, rejeitando a ordem de extradição e liberando Assange”, disse a diretora de operações e campanhas da RSF, Rebecca Vincent.

A petição foi encerrada com mais de 90 mil assinaturas.

No sábado (23), Stella Assange, esposa do fundador do WikiLeaks, participou de uma manifestação em apoio ao marido em Bruxelas.

Em entrevista à agência AFP, ela pediu que o governo britânico não assine o decreto de extradição de Assange para aos EUA, considerando que, agora, o futuro dele está à mercê de uma “decisão política” que “terá repercussões para toda Europa”.

“Trata-se de um problema europeu, em que está em jogo o coração dos valores democráticos. O que se decidir terá repercussões para todo o mundo, para os jornalistas, em toda Europa.”

Stella e Julian Asange se casaram no dia 23 de março, dentro da penitenciária onde o fundador do Wikileaks permanece detido, em Londres. No local, ativistas clamaram por sua libertação.

A noiva chegou à prisão usando um vestido de cetim criado pela estilista britânica Vivienne Westwood, e com os dois filhos que teve com Assange. A cerimônia foi acompanhada pelas duas crianças, pelo pai e irmão de Assange, e pela irmã e mãe da noiva.

O casal se conheceu em 2011, quando ele estava asilado na embaixada do Equador em Londres, onde passou quase sete anos. 

Advogada, Stella Moris tinha sido contratada para atuar na defesa do jornalista, que tentava evitar a extradição para a Suécia, onde respondia a um processo por agressão sexual que acabou sendo encerrado sem julgamento. 

Mas ele acabou permanecendo no prédio para se proteger contra a extradição para os EUA, e só saiu depois que a representação diplomática autorizou a polícia britânica a prendê-lo, em 2019.

Eles iniciaram o relacionamento amoroso em 2015 e tiveram dois filhos, Gabriel e Max, respectivamente com quatro e dois anos, que só viram o pai em visitas na penitenciária de segurança máxima onde ele aguarda a conclusão de sua saga jurídica. 

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Relembre o caso de Julian Assange

Julian Assange, um cidadão australiano, foi preso em Londres depois de passar mais de seis anos na embaixada equatoriana como forma de evitar a extradição para a Suécia, onde respondia a um processo por agressão sexual, e depois para os EUA, por crimes contra a segurança nacional. 

O fundador do WikiLeaks é processado pelos Estados Unidos sob alegação de uma conspiração para obter e divulgar informações de defesa nacional após a publicação de centenas de milhares de documentos vazados relacionados às guerras do Afeganistão e do Iraque no site. 

Ele pode ser condenado a até 175 anos de prisão por 18 acusações. Em janeiro de 2021, a juíza distrital Vanessa Baraister acatou a tese da defesa de Assange e impediu a extradição, sob a justificativa de que ele corria risco de cometer suicídio se fosse para uma prisão de segurança máxima nos EUA. 

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Em fevereiro, a justiça britânica concedeu ao país o direito de recorrer apenas em três aspectos processuais que não envolviam o laudo médico apontando risco de suicídio, e segundo analistas tinham pouca chance de mudar o veredito. 

Os advogados do Departamento de Estado americano apresentaram à corte uma série de garantias com o objetivo de atenuar o suposto risco de suicídio, entre elas a de que ele não ficaria submetido a regime especial de isolamento em uma prisão de segurança máxima. 

Um dos advogados de Assange, Edward Fitzgerald , disse na época que as “garantias qualificadas e condicionais” foram apresentadas “tarde demais para serem devidamente testadas” e “não prejudicam as principais conclusões” do juiz distrital que aplicou a lei “estrita e inteiramente de forma adequada”.

Em nova audiência em outubro, o advogado sustentou que a juíza Vanessa Baraister produziu em janeiro um “julgamento cuidadosamente considerado e totalmente fundamentado”, acrescentando que estava “claro” que ela “aplicou corretamente o teste de opressão em casos de transtorno mental”. 

E disse ao tribunal: “É perfeitamente razoável considerar opressor extraditar uma pessoa com transtorno mental porque sua extradição pode resultar em sua morte”, acrescentando que um tribunal deve ser capaz de usar seu poder para “proteger as pessoas da extradição para um estado estrangeiro onde não temos controle sobre o que será feito a eles ”.

Outro fundamento da defesa de Julian Assange na sessão de outubro foram as revelações feitas pelo site de notícias Yahoo em setembro a respeito de planos dos EUA para sequestrar e matar o fundador do WikiLeaks em 2007, quando ele estava asilado na Embaixada do Equador.

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Na época, Assange entrava em seu quinto ano asilado na embaixada do Equador em Londres, e, segundo o Yahoo, funcionários do governo Trump debatiam a legalidade e a viabilidade de uma operação para retirar o ativista do local, segundo a apuração.

Altos funcionários da CIA e da administração Trump teriam solicitado “esboços” de como assassiná-lo. As discussões sobre o sequestro e possível assassinato de Assange ocorreram “nos escalões mais altos” do governo Trump, disse um ex-oficial da contra-espionagem ao Yahoo.

A defesa de Assange tentou convencer a Suprema Corte de que ele não poderia ser extraditado para um país que tentou matá-lo. 

Mas não teve sucesso. O Departamento de Estado dos EUA conseguiu revogar a decisão em dezembro de 2021, abrindo caminho para a extradição. 

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