Um ano após a jornalista filipina Maria Ressa ser anunciada como uma das vencedoras do prêmio Nobel da Paz, a morte de um dos mais famosos radialistas do país chocou as Filipinas.

Percival Mabasa, mais conhecido como Percy Lapid, de 63 anos, foi baleado na cabeça dentro de seu carro por dois homens em uma moto enquanto ia para o trabalho, na capital Manila, na segunda-feira (3).

Nesta sexta-feira, a polícia apresentou a foto de um suspeito e pediu que ele se rendesse, colocando uma recompensa de 1,5 milhão de pesos filipinos (R$ 254 mil) para informações que levem à sua captura. 

Jornalista denunciou ‘red-tagging’ nas Filipinas

Crítico do governo de Ferdinand Marcos Jr. e seu antecessor Rodrigo Duterte, a morte de Mabasa gerou comoção internacional imediata e protestos nas ruas filipinas. 

Governos dos EUA, Canadá e França estão entre os que os se manifestaram cobrando apuração e lamentando o efeito da morte sobre a liberdade de imprensa, desestimulando jornalistas a denunciarem crimes e más práticas, o chamado “chilling effect”. 

O Nobel da Paz dividido no ano passado entre a filipina Maria Ressa, do site Rappler, e Dmitry Muratov, do veículo russo Novaya Gazeta, não amenizou as tensões entre os jornalistas e as autoridades das Filipinas.

A morte de Percival Mabasa é a segunda de um profissional da imprensa desde que Marcos Jr. assumiu o cargo em 30 de junho, segundo o Sindicato Nacional dos Jornalistas da Filipinas (NUJP, em inglês).

No dia 18 de setembro, outro radialista, Rey Blanco, morreu após ser esfaqueado em um crime que também é investigado pela polícia. Ainda não é possível relacionar esse caso com o trabalho de Blanco, segundo o Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ).

Mabasa era apresentador do programa “Lapid Fire” na rádio DWBL 1242. Em suas últimas transmissões no seu canal do YouTube, o jornalista falou sobre os perigos da tática de “red-tagging”, usada pelo governo para intimidar a imprensa e ativistas de direitos humanos associando-os a grupos comunistas ou terroristas.

“Esse assassinato mostra que o jornalismo continua sendo uma profissão perigosa no país”, diz o NUJP, em nota. “O fato de ter ocorrido na região metropolitana de Manila indica quão descarados foram os atacantes e como as autoridades falharam em proteger jornalistas e cidadãos comuns de danos.”

O irmão do radialista, o também jornalista conhecido Roy Mabasa, divulgou duas notas em nome da família condenando o assassinato e cobrando investigações das autoridades:

“Meu irmão Percy, conhecido por seus milhares de ouvintes leais em todo o mundo como Percy Lapid, foi emboscado a caminho do estúdio onde transmitia seu programa Lapid Fire.

Ele era um grande pai de família, pai amoroso para seus filhos e um marido dedicado para sua esposa, Liza. Sempre me lembrarei de meu irmão por sua profunda fé em Deus e seu amor eterno por seu país.”

“Estamos profundamente entristecidos e irritados com o assassinato brutal do destemido radialista, pai e marido, irmão e amigo Percy Lapid. Condenamos veementemente este crime deplorável, que foi cometido não apenas contra Percy, sua família e sua profissão, mas contra nosso país e a verdade.

Percy era amado por muitos e altamente respeitado por colegas, fãs e inimigos. Seus comentários ousados ​​e afiados cortam a enxurrada de notícias falsas nas ondas do ar e nas mídias sociais. Exigimos que seus covardes assassinos sejam levados à justiça.” 

Filipinos vão às ruas contra morte de jornalista

Após a repercussão da morte de Percival Mabasa, a Força-Tarefa Presidencial para Segurança da Mídia, órgão do governo composto por diversas agências estatais, anunciou que investiria o caso. 

Segundo órgão, os primeiros indícios apontavam que o crime estava “relacionado ao trabalho” da vítima, embora fosse precipitado estabelecer isso como o motivo para o atentado.

Em coletiva à imprensa nesta segunda-feira, os investigadores apresentaram a imagem do suspeito capturada por uma câmera de segurança e disseram já ter feito contato com ele pedindo que se entregasse, mas não adiantaram a motivação do crime. 

Convocadas pelo sindicato, dezenas de pessoas, incluindo profissionais de imprensa e defensores dos direitos humanos, foram às ruas das Filipinas protestar contra a morte do jornalista.

“O assassinato do jornalista de rádio Percival Mabasa mostra mais uma vez que as Filipinas continuam sendo um dos lugares mais perigosos para os jornalistas”, disse Beh Lih Yi, coordenador do programa do CPJ na Ásia.

“O presidente Ferdinand Marcos Jr. deve acabar com a cultura de impunidade nos casos de assassinatos de jornalistas filipinos. Isso não pode continuar”, acrescentou.

As Filipinas ficaram em sétimo lugar no Índice de Impunidade de 2021 do CPJ,  que avalia países em todo o mundo onde jornalistas são mortos e seus assassinatos são libertados.