Londres – A jornalista Nina Goswami tem um ponto de vista privilegiado sobre representação e mulheres no jornalismo.
De 2017 até o ano passado, ela liderou o programa 50:50 da BBC, período em que o projeto, um dos mais importantes do mundo na busca da equidade de gênero na mídia, se espalhou por 750 equipes na emissora britânica e por outras organizações de dezenas de países, inclusive de outros setores profissionais.
Em entrevista, ela falou sobre a sua visão sobre o tema.
Desconfiança inicial
“Nos primeiros dias do 50:50, alguns criadores de conteúdo diziam ter certeza de que os convidados dos programas eram os melhores.
Ao serem obrigados a trazer mulheres, eles diziam temer comprometer a qualidade. Eu dizia:
“O que acontece se a melhor voz sobre o assunto for de uma mulher?” Então a ficha caía. Eles não estavam necessariamente optando pelas melhores vozes – escalavam as pessoas disponíveis e experimentadas”.
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Pequenas ações, grande impacto
“Para que o 50:50 funcione, é necessário realizar pequenas ações, que juntas criam o maior dos impactos.
Pequenas ações como contar quem está no seu programa. Isso leva alguns minutos, se tanto.
Ou compartilhar esses dados para conscientizar a equipe sobre a diversidade do conteúdo produzido. Isso pode levar menos de um minuto.
Ou pesquisar além de seus convidados regulares, para ver se há uma voz melhor.”
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Nem de cima, nem de baixo
“Todos podem fazer o 50:50 acontecer – ele começou com os jornalistas e não a partir da direção da BBC.
Impulsionar a inclusão não pode ser um movimento de cima para baixo ou de baixo para cima. Precisa ser dos dois.”
Representação no jornalismo muda as histórias
Por que aumentar a representação das mulheres?
“Uma das razões mais vitais para aumentar a representação das mulheres nas notícias e no entretenimento é que isso muda as conversas e as histórias que contamos.
Tomando como exemplo as perguntas sobre assuntos familiares feitas a entrevistadas: suponho que serão melhores se as equipes de conteúdo tiverem a adequada representação feminina.
Diversificar as pessoas que colocamos em nosso conteúdo como convidados e entrevistados é importante, mas focar nas pessoas que estão criando a narrativa editorial também faz parte do esforço.”
Outros setores além da imprensa
“Um dos grandes sucessos do 50:50 é que conseguimos adaptar a metodologia para organizações de outros setores.
Todos usam os mesmos princípios básicos quando analisam como devem falar com a mídia, se apresentar em painéis de conferências ou expor seu trabalho a clientes.
Isso proporciona um grupo mais amplo de porta-vozes diversos para a mídia.”
Representação da sociedade
“Precisamos oferecer uma representação verdadeira da sociedade atual.
Só podemos fazer isso garantindo uma diversidade de vozes no conteúdo que apresentamos e promovendo a diversidade de pensamento nas nossas redações e equipes de produção de conteúdo.
Essa maior diversidade de opinião causou um impacto na BBC, fazendo com que os programas fossem enriquecidos em termos de storytelling.
Em última análise, levou a um maior envolvimento com o público.
Como jornalistas, com quanto mais pessoas conversarmos, maior será a probabilidade de o conteúdo refletir melhor o nosso mundo.”
Este artigo faz parte da edição especial sobre representação de gênero na mídia
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