Londres – O concurso de fotografia World Report Award – Documenting Humanity, realizado pelo Festival de Fotografia Ética de Lodi, na Itália, anunciou os sete vencedores de sua edição 2023, com uma série da brasileira Luisa Dörr entre os melhores trabalhos do ano.
O objetivo do prêmio é promover o compromisso social por meio da fotografia, reconhecendo imagens que retratem de pequenos dramas cotidianos a grandes tragédias humanitárias como a guerra da Ucrânia.
O conflito foi o tema da série do ucraniano Evgeniy Malokletka que conquistou o primeiro lugar no concurso com um registro dramático da devastação na cidade de Mariupol. Fotos da mesma reportagem também venceram outros prêmios, como o World Press Photo.
Brasileiros destacados no concurso de fotografia
O trabalho de Luisa Dörr ficou entre os sete conjuntos de imagens destacados como os melhores do ano pelos jurados.
Outros dois brasileiros, Rafael Alves e Ian Cheibub, classificaram-se entre os finalistas. Os três exibirão seus trabalhos no Festival, um dos maiores eventos de fotografia do mundo.
Radicada na Bahia e especializada em questões sociais, Luisa Dörr documentou uma iniciativa original que acontece na Bolívia: jovens skatistas de Cochabamba praticam o esporte usando roupas tradicionais das mulheres do altiplano como forma de combater a discriminação e quebrar os estereótipos associados a elas.
O coletivo se chama ‘ImillaSkate’. Imilla é uma palavra aimará e quíchua que significa ‘meninas’.
As jovens desafiam as rampas trajando as ‘polleras’, trajes volumosos com origens no século XVI, durante a conquista espanhola. A vestimenta foi imposta à população nativa, mas acabou se tornando parte da identidade local.
Dani Santiváñez, 26 anos, é uma das criadores do projeto, que começou em 2018 com o objetivo de funcionar como um “um grito de inclusão”, como explica a fotógrafa.
Eles não usam as polleras diariamente, apenas para andar de skate. Assim como ocorreu no passado, as polleras se adaptaram novamente, agora combinadas com meias esportivas e tênis.
“As Imillas, que praticam para competir em torneios locais, usam essa roupa e seus skates como veículos naturais para empoderar as mulheres e transmitir sua mensagem de inclusão e aceitação da diversidade”, diz Luisa Dörr.
Ianomâmis e evangelização no concurso de fotografia
Os dois brasileiros que terão seus trabalhos exibidos no Festival de Fotografia Ética ficaram entre os finalistas do finalistas do concurso World Report Award. Eles retrataram o drama dos ianomâmis e faces da evangelização no país.
A foto de Raphael Alves retrata uma mulher ianomâmi com malária grave e desnutrição recebendo assistência após desembarcar de um avião em Boa Vista, Roraima. Em janeiro de 2023, o governo brasileiro declarou situação de emergência para a crise.
“Mas em 2021, a região já registrava quase 50% dos casos de malária de todo o país, em decorrência do desmatamento e poluição deixadas pelo garimpo ilegal. Hoje, são mais de 4 mil indígenas com déficits nutricional e com doenças graves”, salienta o fotógrafo.
Ian Cheibub foi finalista na categoria reservada a estudantes. Estudante de mídia na Universidade Federal Fluminense, ele documentou na série ‘Gólgota’ as diferentes faces da evangelização no Brasil.
“A palavra significa “O Lugar da Caveira” em hebraico. Na Bíblia, a colina onde Jesus foi crucificado. No Império Romano era a pena mais cruel. Em Israel representa o principal ponto de peregrinação”, explica.
Ele tentou encontrar as lacunas entre os católicos e os tupiniquins, o Jesus verde e amarelo e as contradições que ele traz.
Guerra na Ucrânia retratada é tema de dois trabalhos vencedores
O vencedor do World Report Award foi o fotógrafo ucraniano Evgeniy Maloletka com a série ‘O cerco de Mariupol’, escolhida pelo júri como a melhor entre as sete premiadas deste ano.
Maloletka é um fotógrafo de guerra, jornalista e cineasta que desde 2014 cobre a guerra da Ucrânia.
Este ano ele ganhou o prêmio de melhor Foto do Ano no concurso de fotojornalismo World Press Photo com uma das imagens dessa série premiada, que retrata uma grávida sendo retirada de uma maternidade bombardeada em Mariupol.
Seu trabalho mostra a cidade de Mariupol, sitiada durante a invasão russa, quando as forças da Rússia e da separatista República Popular de Donetsk – que reivindicava a cidade – entraram em combate com as tropas ucranianas.
A batalha começou em 24 de fevereiro de 2022 e terminou em 20 de maio de 2022, quando a Rússia anunciou que as forças ucranianas em Mariupol haviam se rendido.
As forças russas sitiaram completamente a cidade em 2 de março. A Cruz Vermelha descreveu a situação como ‘apocalíptica’, e as autoridades ucranianas acusaram a Rússia de arquitetar uma grande crise humanitária na cidade. Os funcionários da Cruz Vermelha relataram que cerca de 21 mil civis foram mortos na época.
Entre as sirenes, por Gerd Waliszewski, Estados Unidos
O fotógrafo americano Waliszewski foi o vencedor na categoria Estudante do concurso promovido pelo Festival de Fotografia Ética de Lodi também com um ensaio sobre a guerra na Ucrânia, mas mostrando a atitude dos jovens perante o conflito.
A série dá uma visão da realidade de uma geração que se confronta diariamente com a fragilidade da vida e da nação.
As imagens mostram como os jovens tentam viver na dura realidade da Ucrânia dominada pela guerra. Uma rotina constantemente interrompida pelas sirenes de alerta e pelos mísseis.
“Meu projeto destaca os jovens ucranianos como um símbolo do futuro, pois eles são a geração sobre a qual recairá a maior responsabilidade pela reconstrução do seu país após o fim da guerra”, disse o fotógrafo.
“Que tipo de país a Ucrânia se tornará se for reconstruída por uma geração traumatizada pela guerra?”
Confira os outros vencedores da competição
O júri do Festival de Fotografia Ética escolheu a imagem feita por Hasan Mohammad Rakibul, de Bangladesh, como a melhor foto única do World Report Award deste ano.
A imagem aborda o aquecimento global e o impacto desproporcional que ele tem em certos países em comparação com outros. É o caso de Bangladesh, que passou a sofrer mais com desastres naturais.
Ciclones e maremotos afetam a área costeira do país. As planícies da costa têm milhões de pessoas que dependem do mar para sua subsistência.
A última geração: sonho de Zoey, por Bob Miller, Estados Unidos
O fotógrafo e cineasta americano Bob Miller também teve seu trabalho entre os sete melhores do ano. A série documenta o desaparecimento de fazendas de médio porte nos Estados Unidos.
A imagem mostra Zoeh Allen de 11 anos cavalgando sem sela pelos campos de milho e soja.
“Zoeh e seu avô Jackie ‘Jackrabbit’ Allen vivem nas colinas de Loretto, Kentucky (EUA). Os Allens representam o melhor que as fazendas americanas têm a oferecer. São 260 acres mantidos por várias gerações através do trabalho árduo.”
As fazendas tradicionais de médio porte estão quase extintas nos Estados Unidos, desenraizadas por uma economia agrícola próspera, mas implacável, que favorece os extremos, explicou o fotógrafo.
“Aqueles que permanecem encontram-se à beira de um abismo cada vez maior, no qual mais de quatro milhões de fazendas desapareceram desde 1948.”
Todo mundo em mim é um pássaro, por Sarah Pabst, Alemanha/Argentina
A fotojornalista alemã que vive entre seu país e a Argentina foi premiada por uma reportagem que conta sua relação com a perda do irmão e a gravidez.
Há seis anos quando seu irmão teve uma morte súbita, o mundo de Sarah mudou e a dor passou a acompanhá-la. Mas o falecimento do irmão deu a ela o dom de perceber a vida de maneira diferente.
Um mês depois, Sarah descobriu que estava grávida. Transcendendo entre seu país de origem, a Argentina e sua terra natal, a Alemanha, a fotógrafa explica que “este trabalho desfez a distância, movendo-se entre o tempo, as estações, os países e o espaço”.
“Através das imagens, procuro a magia do comum, o que significa viver, perder e, acima de tudo amar”.
Alpaqueros, por Alessandro Cinque, Peru
Vencedor da categoria Reportagens Curtas do prêmio do Festival de Fotografia Ética de Lodi, o fotojornalista peruano já havia sido premiado este ano como a melhor série no concurso World Press Photo.
Seu projeto mostra como a mudança climática no Peru afeta os criadores de alpaca, criando ‘migrantes climáticos’ forçados a se mudar para altitudes cada vez maiores ou abandonar seu estilo de vida e se mudar para cidades baixas, ameaçando assim a perda de identidade cultural andina.
Os animais desempenham um papel crítico nas comunidades locais onde as culturas não podem ser cultivadas e a única atividade econômica, além da mineração, é a criação das alpacas.
A mudança climática representa um risco crescente para os animais e comunidades que elas sustentam.
A série também mostra os esforços científicos que buscam contribuir para combater os efeitos das mudanças climáticas nas alpacas e criar mais resiliência nos genes dos animais.
Festival de Fotografia Ética
Criado em 2010 pela organização sem fins lucrativos Gruppo Fotografico Progetto Immagine, com sede em Lodi, Itália, o Festival de Fotografia Ética é uma iniciativa destinada a aproximar o grande público das questões sociais por meio da fotografia.
A programação é composta por exposições de fotojornalistas internacionais premiados, reuniões, workshops, revisões de portfólios, exibições de vídeo, visitas guiadas, palestras, apresentações de livros e ações educacionais para estudantes, que acontecem durante todo o mês de outubro.
Uma das exposições será a dos vencedores e finalistas do World Report Award.
As imagens foram publicadas com a autorização da organização do concurso de fotografia World Report Awards e não podem ser reproduzidas.
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