Londres – Um mês após o golpe de estado no Níger, 80 jornalistas e entidades de imprensa africanas publicaram um apelo conjunto ao Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CNSP) pedindo o fim das violações da liberdade de imprensa no país.
O documento lista ameaças e intimidações de profissionais de imprensa, agressões físicas e a suspensão das transmissões das redes francesas France 24 e rádio RFI.
“Em nome dos que se solidarizam com jornalistas nigerianos e correspondentes internacionais, reiteramos a necessidade […] de uma cobertura diversificada e confiável dos acontecimentos, com respeito aos padrões éticos da profissão. Exigimos que a junta respeite o direito à informação e ao pluralismo e à independência dos meios de comunicação”, diz o carta.
Golpe no Níger ‘desafia direito de informar e ser informado’
A iniciativa foi da organização Repórteres Sem Fronteiras, que em abril fez um relatório documentando as violações da liberdade de imprensa na região do Sahel, uma faixa que começa no Mar Vermelho e termina no Oceano Atlântico, cruzando total ou parcialmente 16 países.
“A liberdade de imprensa e o pluralismo da informação foram diretamente desafiados. mas os direitos de informar e de ser informado não podem ser suprimidos no contexto da instabilidade política do golpe no Níger”, diz Sadibou Marong, diretor da RSF na região subsaariana.
A organização destaca algumas das violações desde o golpe militar que derrubou o presidente do Níger, Mohamed Bazoum.
- Como resultado da tensão com a França, da qual o Níger é uma ex-colônia, as emissoras RFI e France 24 foram suspensas por tempo indeterminado em 3 de agosto.
- Dois dias após o golpe, indivíduos não identificados atacaram equipes da emissora de rádio e televisão nigeriana Anfani e danificaram uma câmara do canal de televisão privado Bonferey. O ataque aconteceu durante uma conferência de imprensa de mulheres do partido político do presidente deposto.
- Soufiane Mana Hassan, editor do jornal Le Témoin de l’Histoire, disse à RSF que no dia 28 de julho indivíduos não identificados o ameaçaram na rua perto de sua casa, dizendo-lhe para ter cuidado com o que publicava em seu jornal e nas redes sociais.
- Poucos dias depois, a blogueira e jornalista Samira Sabou foi interrogada por um militar, que a contactou por telefone, criticando uma das suas publicações nas redes sociais. A jornalista havia compartilhado uma mensagem do presidente deposto Mohamed Bazoum.
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Estrangeiros no alvo da junta militar
Ameaças e intimidações também visam jornalistas estrangeiros, segundo a organização.
Em 19 de agosto, os jornalistas independentes Amaury Hauchard e Stanislas Poyet, que residem em Niamey e contribuem para vários meios de comunicação internacionais, foram atacados física e verbalmente enquanto cobriam uma reunião de “voluntários pela pátria”.
O passaporte de Poyet e os equipamentos fotográficos e de rádio dos jornalistas foram roubados. Os dois foram espancados, com Hauchard precisando levar pontos no lábio.
Anne-Fleur Lespiaut, correspondente no Níger para o canal internacional de língua francesa TV5 Monde, foi alvo de uma campanha de assédio online por parte de apoiadores da golpe militar.
Alguns exigiram que ela fosse declarada “persona non grata”, enquanto outros pediram um “acerto de contas”.
A lista de 80 signatários da carta endereçada à junta responsável pelo golpe militar no Níger inclui entidades internacionais e locais como Comitê para Proteção de Jornalistas, Federação Internacional de Jornalistas, Artigo 19, ‘Maison de la Presse” do Níger, Federação de Jornalistas Africanos (FAJ), Media Foundation for West Africa (MFWA) e Norbert Zongo Cell para o Jornalismo Investigativo na África Ocidental (CENOZO).
O apelo foi endossado por profissionais de imprensa e dirigentes de veículos da África do Sul, Burkina Faso, Benin, Burundi, Camarões, Cabo Verde, Djibuti, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Libéria, Mali, Madagascar, Malaui, Ilhas Maurício, Nigéria, República do Congo, Senegal, Ilhas Seicheles, Serra Leoa, Sudão do Sul e Chade.
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