Londres – A organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) afirmou neste domingo que os ataques que feriram vários profissionais de imprensa e custaram a vida de um cinegrafista da Reuters na fronteira do Líbano com Israel no dia 13 de outubro teriam sido deliberados, “visando explicitamente os veículos de jornalistas”.
A organização fez uma investigação e divulgou um vídeo de reconstrução da tragédia que resultou na morte de Issam Abdallah em Alma el-Chaab, reunindo depoimentos de testemunhas, cenas filmadas no local que mostram um helicóptero sobrevoando o grupo e análises de especialistas em balística.
Duas equipes que estavam próximas foram atingidas. Em ambas havia profissionais de diversos meios de comunicação, incluindo a Al Jazeera, rede árabe de propriedade do governo do Catar, que tem sido objeto de pesadas críticas do governo de Israel pela sua cobertura do conflito em Gaza.
Cinegrafista da Reuters cobria confronto entre Hezbollah e Israel no Líbano
Os sete jornalistas tinham montado posições de transmissão para cobrir a troca de tiros entre as forças do Hezbollah e o exército israelense. Dois ataques de intensidades diferentes, com cerca de trinta segundos de intervalo, atingiram o local exato onde estavam.
O primeiro matou o fotojornalista da Reuters Issam Abdallah e feriu gravemente a correspondente da Agência France-Presse ( AFP ) Christina Assi. O segundo explodiu o veículo da Al Jazeera nas imediações, ferindo vários profissionais.
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“As conclusões iniciais da investigação mostram que os repórteres não eram vítimas colaterais do tiroteio. Um dos veículos, marcado como “imprensa”, foi alvejado, e também ficou claro que o grupo estacionado ao lado era de jornalistas”, diz a Repórteres Sem Fronteiras..
Acusado pelo incidente por várias testemunhas, o exército israelense declarou imediatamente que “lamentava” e que estava “investigando o assunto”, segundo a RSF.
Uma semana depois dos acontecimentos, a RSF reconstruiu o que teria acontecido entre as 16h45, hora das primeiras imagens registradas, e por volta das 18h, hora da morte de Issam Abdallah.
Profissional da Reuters morreu no primeiro ataque
Os dois ataques ocorreram em intervalos de 37 a 38 segundos, no local os jornalistas estava há mais de uma hora. O primeiro matou Abdallah, cinegrafista da equipe da Reuters no Líbano, de 37 anos.
O segundo ataque, mais poderoso, com carga útil de mais de 3 kg equivalente a TNT, de acordo com a perícia balística da RSF, incendiou o veículo da Al Jazeera, um Toyota branco, ao lado do qual o repórter estava, ferindo os jornalistas Carmen Joukhadar e Elie Brakhya , bem como seu colega da AFP, Dylan Collins.
O impacto deslocou o veículo cerca de 90 graus de sua posição original. De acordo com a análise, os tiros vieram do leste de onde os jornalistas estavam; da direção da fronteira israelense.
“Dois ataques no mesmo local num espaço de tempo tão curto (pouco mais de 30 segundos), vindos da mesma direção, indicam claramente um alvo preciso”, diz a RSF:
É pouco provável que os jornalistas tenham sido confundidos com combatentes, até porque não se escondiam: para terem um campo de visão claro, estavam há mais de uma hora ao ar livre, no topo de uma colina.
Eles usavam capacetes e coletes à prova de balas com a inscrição “imprensa”. O carro deles também foi identificado como “imprensa” graças a uma marcação no teto, segundo testemunhas.”
Helicóptero sobrevoou local do ataque
A presença de um helicóptero na cena foi destacada pela RSF como evidência de que os jornalistas haviam sido identificados pelas forças militares antes do bombardeio.
A aeronave foi vista por volta das 16h45, como relata uma das jornalistas da Al Jazeera entrevistadas no vídeo.
Segundo Edmond Sassine, jornalista da estação de televisão libanesa LBCI que estava trabalhando a cerca de cem metros de seus colegas da Reuters , Al Jazeera e AFP, o helicóptero era um Apache israelense.
Cinco dias antes, os jornalistas da Al Jazeera tinham sofrido um ataque semelhante na aldeia de Dhayra, no sul do Líbano. Segundo os seus testemunhos, um helicóptero israelita sobrevoou-os antes de um míssil cair ao lado do seu carro – do mesmo modelo como o bombardeado em 13 de Outubro – também com a palavra “imprensa”.
Em 2022, a repórter da Al Jazeera Shireen Abu Akleh foi morta por soldados israelenses quando cobria uma operação na Cisjordânia.
O governo de Israel anunciou na semana passada a intenção de suspender as atividades da rede Al Jazeera.
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