Londres – Violência contra jornalistas, desinformação e discurso de ódio nas redes sociais durante campanhas eleitorais entraram no radar da Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), que em pouco menos de uma semana levantou preocupações sobre o efeito das disputas entre candidatos no ecossistema de informação em duas ocasiões diferentes.
No Dia Internacional Contra a Impunidade de Crimes contra Jornalistas, a organização divulgou um levantamento sobre violência contra jornalistas em períodos eleitorais: entre janeiro de 2019 e junho de 2022, foram registrados 759 ataques individuais, incluindo cinco assassinatos, ocorridos durante 89 eleições em 70 países.
Na semana passada, a Unesco publicou um extenso plano de ação para conter a desinformação online, resultado de contribuições de 134 países durante 18 meses.
Unesco analisou percepções sobre desinformação em países que irão às urnas
Não há nada diferente do que já se sabe: a desinformação é um flagelo, não é culpa somente de um agente, faz mal à sociedade e é preciso adotar medidas para controlá-la − muitas das quais já levantadas em outros documentos.
Mas para sublinhar a importância de que as palavras se transformem em ação, a organização divulgou junto com o plano uma pesquisa feita pelo instituto Ipsos em 16 países que terão eleições gerais em 2024, com resultados que merecem atenção porque procuram refletir o impacto da desinformação sobre a democracia.
O Brasil não está entre os pesquisados, mas terá eleições municipais em 2024.
E entre os pleitos do ano que vem estão os dos EUA, que pode devolver Donald Trump de volta à Casa Branca, e da Ucrânia, que pode mudar os rumos da guerra com a Rússia.
Percepção sobre impacto é alta
Foram entrevistados mais de oito mil adultos usuários de internet de países classificados em blocos por seu IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Quase nove em cada 10 deles (87%) acham que a desinformação já teve grande impacto na vida política do seu país e temem seus efeitos nas próximas eleições.
O discurso de ódio é outro problema. Postagens classificadas dessa forma foram vistas por 67% dos entrevistados, sobretudo em Facebook (58%), TikTok (30%), Twitter/X (18%) e Instagram (15%).
A pesquisa é mais uma a confirmar que as redes sociais já ultrapassam a imprensa escrita, o rádio e até a televisão como fonte de informação diária.
Em média, nos 16 países pesquisados, quase um a cada seis internautas as utilizam para acompanhar os acontecimentos, muito à frente da televisão (44%).
Mas os contextos locais não são os mesmos. O Ipsos identificou que a televisão é a fonte principal de notícias nos países mais desenvolvidos (55%, em comparação com 37% para as redes sociais), enquanto perde em países com IDH mais baixo (37% contra 68%).
Por idade, a pesquisa confirma o gap geracional no que diz respeito a fontes de informação: pessoas com menos de 35 anos são mais inclinadas a usar as redes sociais (67%) do que as de 55 anos ou mais (31%).
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Estudo da Unesco examinou confiança nas fontes
Mas a boa e velha TV continua tendo um papel importante em campanhas eleitorais devido à sua confiabilidade. Rádio e imprensa escrita também não fizeram feio no estudo da Unesco.
Na média global, 66% dos entrevistados disseram confiar nas notícias transmitidas pela televisão, 63% nas notícias da rádio e 61% nas notícias da imprensa escrita, em comparação com apenas 50% nas notícias recebidas por redes sociais.
Nos 16 países, 68% dos internautas consideram as redes sociais o ambiente em que a desinformação é mais difundida, muito à frente dos grupos em aplicativos de mensagens (38%) e de websites ou apps de veículos de comunicação (20%).
A quem cabe a solução?
O estudo da Unesco apurou que plataformas e governos são vistos como responsáveis por, respectivamente, 90% e 87% dos entrevistados. E os países com IDH mais baixo são os que mais esperam intervenção governamental.
A pesquisa completa pode ser vista aqui.
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