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Fotógrafo do Xingu apresenta na COP28 imagens de sua aldeia e da recriação de uma gruta sagrada

Londres –  A história da recriação de uma gruta sagrada para os povos do Alto Xingu, que teve suas inscrições em pedra destruídas em 2018, será contada durante a COP28 por um de seus principais protagonistas: o fotógrafo e cineasta indígena Piratá Waurá, que vive na aldeia Topepaweke, em Mato Grosso. 

A apresentação foi marcada para o Resilience Hub, espaço da conferência do clima dedicado a mostrar como a criatividade pode ajudar na resiliência das comunidades ameaçadas, junto com Thiago Jesus, produtor cultural e pesquisador da organização não-governamental People’s Palace Projects (PPP). 

Piratá, que também atua como professor local do povo Waujá, viajou para a COP28 como parte do time de acadêmicos e experts em clima levados pela Queen Mary University of London, onde a ONG está baseada. 

O olhar de um fotógrafo indígena na COP28 

Como fotógrafo e cineasta, ele documentou a vida na aldeia e recuperação da gruta do Kamukuwaká, alvo de uma tentativa de apagamento cultural e desapropriação das terras um mês antes da eleição de Jair Bolsonaro, e que está sendo reproduzida em tamanho real para garantir que o conhecimento tradicional da aldeia continue sendo passado para as futuras gerações. 

“Nós indígenas somos rios, somos árvores, somos animais. A natureza é parte integral da nossa identidade, portanto é indivisível para nós. As mudanças climáticas e a destruição do planeta são uma ameaça direta à nossa existência e à nossa cultura. ” 

Veja as imagens 

Amanhecer no rio Batovi, um dos afluentes do rio Xingu que dá nome ao território indígena. Com as mudanças climáticas e o avanço da soja e pasto, o rio sofre com assoreamento e contaminação por agrotóxicos.

Foto: Piratá Wuará

As crianças da aldeia brincam no rio, como seus ancestrais faziam 

Foto: Piratá Wuará

Pintura corporal tradicional para os rituais xinguanos inspirada no mito sagrado do Kamukuwaká, que permeia todo o conhecimento cosmológico de 16 povos do primeiro território indígena demarcado do Brasil.

Foto: Piratá Wuará
A vida na comunidade

Vista aérea da aldeia Piyulaga – a maior aldeia do povo Wauja no território do Xingu. São cerca de 700 integrantes da etnia vivendo hoje em oito aldeias no Alto Xingu. 

A aldeia é formada por casas tradicionais em disposição circular. No meio fica a chamada casa dos homens, centro das decisões e dos rituais da aldeia.

Foto: Piratá Wuará

A foto mostra o pajé e artesão Kamo Waurá usando semente de urucum para pintar o pote em cerâmica, enquanto mostra à sua neta Yakuwipu Wuará as histórias desta arte ancestral. A pintura corporal e a cerâmica conectam o povo do Xingu aos espíritos da floresta, o que é parte integral da sua identidade.

Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
Os rituais vivos 

No registro de Piratá, o cacique Akari Waurá ensina flauta a seu filho Ahula Waurá. Ela é normalmente tocada apenas uma vez por ano durante o ritual da colheita do pequi.

Para o povo Wauja, o som da flauta é uma forma de comunicação com os espíritos da árvore de pequi para que no próximo ano traga ainda mais frutos.

Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
Foto: Piratá Wuará
A recuperação da gruta

A gruta do Kamukuwaká, cuja história será apresentada pelo fotógrafo Piratá Wuará na COP28,  é um patrimônio cultural tombado pelo IPHAN, mas na demarcação da área indígena, em 1964, ficou de fora do limite abrangido pela medida 

Os petroglifos milenares esculpidos na gruta foram destruidos por fazendeiros locais em setembro de 2018, um ato de apagamento da memória coletiva do povo.

Foto: Piratá Wuará

As inscrições são consideradas o livro do conhecimento do povo xinguano. O povo Waujá peregrinava até a gruta para aprender sobre a história de seus ancestrais e praticar os rituais de danças, cantos, pintura corporal e em cerâmica inspirados nos desenhos.

Piratá e os Waujá lideraram uma aliança internacional de artistas e pesquisadores para a recriação dos petróglifos digitalmente com base na memória coletiva, construção de uma réplica em tamanho real da gruta restaurada e visualização em realidade virtual para as escolas em quatro aldeias. 

“Tudo isso para que garantir que o conhecimento tradicional da gruta, fundamental para a integridade cultural Waujá, continue sendo passado para as futuras gerações de líderes indígenas”, diz Thiago Jesus, da People’s Palace Projects, responsável pela iniciativa que será mostrada na COP28. 

Waujá mostra a parede da gruta sagrada do Kamukuwaká destruída. Foto: Piratá Wuará
Akari Waurá, guardião da gruta,  sentado ao lado da parede talhada com as inscrições feitas pelo mito do Kamukuwaká. Foto: Piratá Wuará
Em abril de 2024, com apoio da Peoples Palace Projects, a comunidade vai receber a réplica dessa caverna, que será transportada do estúdio em Madri para o território do Xingu.
Foto: divulgação People’s Palace Project
Um um centro cultural e de monitoramento territorial que vai abrigar a gruta. Os integrantes da aldeia já estão realizando rituais que não faziam há décadas em preparação para esse momento.
“Esse “museu” Waujá vai tanto celebrar os conhecimentos ancestrais quanto produzir conhecimento sobre mudanças ambientais no ar, na água, incêndios e desmatamento. Para os povos indígenas, cultura e preservação são uma coisa só”, diz Jesus. 
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