Londres – Um inusitado retrato do diretor de cinema Alfred Hitchcock segurando um ganso depenado, que ilustrou a capa da edição de Natal da revista Harper’s Bazaar em 1973, é um dos trabalhos que celebrizaram o escocês Albert Watson como um dos grandes mestres da fotografia de arte contemporânea.
A foto de Hitchcock, primeira celebridade que fotografou, e também imagens como as de Andy Warhol, Mick Jagger e um retrato da modelo Kate Moss nua, no dia de seu aniversário de 19 anos, foram reunidas em um livro da editora Laurence King Publishing.
Watson nasceu em Edimburgo em 1942 sem a visão de um dos olhos. Estudou design gráfico no Duncan of Jordanstone College of Art and Design em Dundee, e cinema e televisão no Royal College of Art em Londres. Em 1970, foi morar nos Estados Unidos com sua esposa, Elizabeth, e foi em Los Angeles que começou a tirar fotos, como hobby.
Carreira em fotografia de arte começou com Max Factor
Suas primeiras fotos profissionais foram feitas para um diretor de arte da Max Factor, que lhe ofereceu sua primeira sessão e comprou três das suas fotos.
Seu estilo atraiu a atenção de revistas como Mademoiselle, GQ e Harper’s Bazaar.
Watson fotografou para centenas de campanhas publicitárias, dirigiu comerciais para TV e fez pôsteres para os principais filmes de Hollywood. A partir daí se tornou uma referência em fotos de moda, arte e retratos de famosos.
O livro “Albert Watson: Creating Photographs” apresenta em 128 páginas as cem imagens mais conhecidas do fotógrafo, com as histórias por trás de cada trabalho.
E também dicas e ideias de como trabalhar a iluminação e lentes, usar a criatividade e conselhos sobre como entrar no mercado.
Considerado pela Photo Districk News como um dos 20 fotógrafos mais influentes de todos os tempos, Watson já recebeu vários prêmios, incluindo um Lucie Award, um Grammy Award, três Andys, um Der Steiger Award, um Hasselblad Masters Award, a Medalha do Centenário e um prêmio pelo conjunto da obra da Royal Photographic Society.
A Rainha Elizabeth II concedeu ao escocês uma Ordem do Império Britânico em junho de 2015 por sua contribuição vitalícia para a arte da fotografia.
Conheça alguns dos retratos que ilustram seu novo livro, como algumas das fotos foram feitas e conselhos sobre a arte de fotografar.
Waris Dirle – Marrocos – 1993
A foto que ilustra a capa do seu novo livro foi feita em 1993 em Ouarzazate, no Marrocos. Watson conta como foi:
“Eu estava fazendo um projeto para uma revista alemã, a Stern, e acabei no Marrocos, trabalhando com a Waris, uma modelo conhecida na época.
Cheguei com um pedaço de tecido vermelho e coloquei luzes de fundo no tecido, com filtros vermelhos nas luzes. Então, não só o tecido era vermelho, mas a luz que batia nela também.
E quando você faz isso, você obtém um efeito de neon maravilhoso. Também trouxe corante alimentar para tingir a língua da modelo de vermelho, um dente de ouro que encontrei em uma loja de souvenirs na Times Square, e um papel dourado que enrolei como cifres”.
Albert Watson – Waris Dirle – Marrocos – 1993
Kate Moss – Marrocos – 1993
“Em 1993, fiz uma sessão de fotos durante um dia inteiro com Kate Moss sob luz natural, às vezes com apenas um pouco de efeito estroboscópio. Foi a única vez que trabalhei com ela, e rendeu algumas fotos incríveis.
Fizemos as fotos em uma villa no Marrocos chamada Dar Tamsna. Ela era uma modelo promissora na época e voou de Londres para a sessão.
Era para a Vogue alemã, e eles queriam que tudo fosse bonito e voltado para a pele. Começamos o dia às 7h30 e trabalhamos até as 22h. No final, ela me disse que fazia 19 anos naquele dia”.
Albert Watson – Kate Moss – Marrakech – Marrocos – 1993
Al Pacino – Nova York – 1996
“Preparando-nos para fotografar o ator Al Pacino, ligamos para seu assessor de imprensa e perguntamos se precisavam de algo especial, como uma comida específica. Eles disseram: “Não, ele nunca vai comer nada. Mas ele gosta de um bom café”.
Descobrimos qual era o seu café favorito – expresso com um toque de limão – e eu até aluguei uma máquina de café expresso e comprei meio quilo de seu café favorito.
Então, quando ele entrou e pediu uma xícara de café, eu pude surpreende-lo com o seu tipo favorito, com uma rodela de limão.
Isso pode parecer exagero, mas esses pequenos detalhes podem realmente ajudar”.
Albert Watson – Al Pacino – Nova York – 1996
Mick Jagger e o leopardo – Los Angeles – 1992
“A foto foi planejada para o 25º aniversário da revista Rolling Stone e eu ia fazer uma foto de Mick Jagger dirigindo um Corvette com um leopardo sentado ao lado dele. Tivemos um problema: isso foi antes do digital (…)
O leopardo era bravo. Então tivemos que construir uma divisória de vidro entre Mick Jagger e o leopardo para que o animal não pudesse chegar até ele. Quando estávamos construindo isso, tive a ideia de fazer uma dupla exposição dele e do leopardo. (…)
Fotografei o leopardo e no visor da câmera Hasselblad, desenhei com um marcador de porcelana onde estavam os olhos e a boca do animal, depois rebobinei o filme, o coloquei de volta no início e na mesma posição.
Então eu inseri o Mick Jagger no rosto do leopardo – os olhos eram uma combinação perfeita – e eu filmei os 12 quadros novamente. (…). E dos 12 quadros, quatro deles combinavam. Foi apenas sorte. É apenas uma exposição dupla”.
Breaunna com máscara de gato – Las Vegas – 2001
“Existem muitas maneiras de fotografar pessoas. Você poderia ser um fotógrafo invisível, como Henri Cartier-Bresson – ninguém nunca soube que ele estava tirando uma foto.
Mas se você é um fotógrafo de retratos, ou quer ser, você tem que ser uma pessoa sociável. Você precisa ser amoroso com a pessoa que está fotografando, interessado nela”.
Albert Watson – Breaunna com máscara de gato – Las Vegas – Hilton – 2001
Mike Tyson – Catskills – Nova York, 1986
“Em 1986 fiz uma sessão de fotos com um jovem Mike Tyson em Catskill, em Nova York. Já tinha fotografado muitos lutadores bons, inclusive Evander Holyfield. Tivemos uma ideia de fazer um boxeador pelas costas.
A força de um boxeador está em seu pescoço… Eu fiz Mike Tyson malhar cerca de quinze minutos antes de fazer a foto.
Você pode ver as gotas de suor nele… Muitas pessoas olharam aquela foto e disseram: “Aquele é Mike Tyson”. Isso foi um sucesso.
Então é mais uma vez: preparação, preparação, preparação… Pense sobre o que você pode fazer. Tenha um plano antes de começar. Principalmente com uma celebridade”.
Albert Watson – Mike Tyson – Catskills – Nova York – 1986
Leslie Winer – Yohji Yamamoto – Londres – 1989
“Aprender fotografia é como aprender a dirigir um carro. A primeira vez que você entra em um carro, você pensa: “Eu nunca vou conseguir fazer isso. Eu vou bater na parede ou pior, me matar”.
Depois de uma semana de aulas, você se sente um pouco melhor com relação às coisas. Então, dois anos depois, você começou a dirigir quase automaticamente. Você entra em um carro e liga-o automaticamente, muda de marcha, olha no espelho.
Depois de superar o obstáculo das coisas técnicas em um carro, você aprendeu a dirigi-lo. Gosto de usar isso como uma analogia para a fotografia”.
Albert Watson – Leslie Winer – Yohji Yamamoto – Londres – 1989
Andy Warhol – Nova York – 1985
“Quando você está fotografando uma pessoa, é importante olhar bem o rosto.
O rosto está cheio de geografia. É uma paisagem de colinas e vales, então olhar vai te ajudar a imaginar o que fazer com a iluminação, e também a dar sugestões de maquiagem e cabelo.
O cabelo vai ficar para cima? Para baixo? Você pode usar um pouco de vento? O cabelo faz parte da geografia”.
Albert Watson – Andy Warhol – Nova York – 1985
Homenagem a Malcon X – Harlem – 1992
“Como fotógrafo, você tem que ficar alerta sempre. Para a 150ª edição da revista The Face , em 1992, eu estava querendo fazer um ensaio de moda inspirado no líder negro, nacionalista e ativista de direitos humanos Malcolm X.
Depois de muita pesquisa, planejei uma cena com duas pessoas, uma sendo Malcolm X e outro fazendo o papel de seu protegido que virou denunciante Louis Farrakhan, juntos, basicamente um retrato.
Pouco antes de fazer a cena estava passando na televisão do motorista da locação um velho filme noir.
Eu olhei e havia três pessoas na tela: uma pessoa estava gritando com outra, e a pessoa no meio estava tentando evitar que qualquer violência acontecesse.
Quando eu vi, imediatamente chamei meu assistente, coloquei-o em um terno e usei ele como a terceira pessoa.
Na foto, meu assistente está à direita lado a lado a gritar com Malcolm X. Então, meu assistente se tornou Farrakhan e o cara no meio se tornou um guarda-costas de Malcolm X, por assim dizer.
A foto foi criada por algo que eu tinha visto minutos antes em um filme antigo”.
Tree in Mist – Fairy Glen – Isle of Skye – Escócia – 2013
“Em 2013, fiz uma viagem para a Ilha de Skye na costa noroeste da Escócia. Eu estava procurando paisagens emocionais, inspiradas por coisas como Senhor do Anéis e Game of Thrones. (…)
Como eu poderia deixar a foto mais emocionante, mais incomum, mais mágica e, para mim o mais importante, mais memorável?
Usei o livro de Degas como força motriz. A fotografia é uma atividade artística. Mergulhe sempre que possível em livros, museus, galerias.
Não olhe apenas para livros de fotografia, olhe para os livros de arte. Olhe o que é incrível sobre pintores modernos, como Francis Bacon, Picasso, os Impressionistas.
Olhe para Leonardo da Vinci, Raphael, Michelangelo, ou mesmo de volta às pinturas rupestres.
Olhe para todo o portfólio do artista, não apenas pelo que eles são famosos – então vá além dos dançarinos de Degas e estude suas paisagens. Sempre envolva-se com a arte. Você nunca sabe o que o inspira…”
Albert Watson – Tree in Mist – Fairy Glen – Isle of Skye – Escócia – 2013
Albert Watson – Creating Photographs faz parte da série de livros de fotografia de arte Masters of Photography da Laurence King Editora e pode ser comprado no Brasil pela Amazon e outras lojas online.
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