Londres – A reação de ativistas pró-guerra na Rússia contra uma festa de famosos em Moscou que pediu aos convidados para comparecerem com traje “quase nu” gerou uma onda de protestos, boicotes, multas e até prisões, sob a alegação de desrespeito aos soldados que combatem na Ucrânia.
O evento, organizado pela influenciadora Anastasia Ivleeva, despertou a ira de Yekaterina Mizulina, chefe da Liga da Internet Livre, um grupo de pressão alinhado ao Kremlin que defende regras rígidas sobre o que pode ser feito online.
A partir da manifestação dela pedindo “boicote em nível de Estado” para os que “vivem em um mundo diferente do resto do país”, convidados tiveram contratos cancelados, foram cortados de aparições pré-gravadas na TV e estão recebendo punições, a começar pela organizadora, que está sendo investigada em um processo que pode render prisão de até cinco anos.
Soldados da Rússia na Ucrânia ‘desrespeitados’
O caso acontece na sequência de uma série de medidas de caráter conservador adotadas pelo regime de Vladimir Putin, como a proibição do movimento LGBT.
Mas o conflito na Ucrânia foi o principal argumento de autoridades e figuras influentes da sociedade favoráveis à invasão do país pela Rússia.
“Realizar tais eventos num momento em que nossos homens estão morrendo na ‘operação militar especial’ e muitas crianças estão perdendo seus pais é cínico”, disse Yekaterina Mizulina, criticando as fotos da festa em que a influenciadora aparece com pouca roupa recebendo os convidados.
O evento, no clube noturno Mutabor, foi programado para durar dois dias, era aberto a quem pagasse 11 mil rublos (R$ 560) pelo ingresso e reuniu celebridades e artistas populares na Rússia, como Filipp Kirkorov, Lolita, Dima Bilan e a apresentadora de TV Ksenia Sobchak, afilhada de Putin.
O convite pedia um traje “quase nu”, interpretado pelos participantes de formas diversas – de lingeries provocantes a quase nada ou jóias caras para esconder parte da anatomia.
Anastasia Ivleeva disse ter ‘vestido’ joias no valor de 23 milhões de rublos (R$ 1,2 milhão), parte delas cobrindo seu traseiro.
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Prisão por vandalismo e propaganda gay
O rapper Nikolai Vasilyev usou apenas um par de tênis nos pés e uma meia cobrindo os órgãos genitais. Na sexta-feira (22) ele recebeu ordem de 15 dias de prisão por “vandalismo” e uma multa em 200 mil rublos por “propaganda gay”.
Logo em seguida o artista zombou da punição nas redes sociais, mas no mesmo dia apareceu em um vídeo publicado pela agência de notícias estatal RIA Novosti pedindo desculpas por seu suposto apoio à comunidade LGBT.
“Não apoio a comunidade LGBT de forma alguma. Não tive a intenção de fazer propaganda. Condeno os apoiadores do movimento LGBT.”
Influenciadora pode ter que pagar indenização a veteranos na guerra da Ucrânia
Depois da controvérsia sobre a festa, Anastasia Ivleeva inicialmente usou sua conta no Instagram, com mais de 18 milhões de seguidores, para defender o encontro.
Mas desde então sua imagem foi removida das campanhas da operadora de telefonia móvel russa MTS, e eautoridades fiscais abriram uma investigação que pode valer uma pena de cinco anos caso ela não consiga comprovar a origem dos recursos.
Além disso, ativistas protocolaram uma ação contra a influenciadora exigindo indenização de 1 bilhão de rublos por “sofrimento moral”, a ser destinada a um fundo de veteranos da guerra da Ucrânia.
Nesta quarta-feira (17) Ivleeva mudou de postura, dizendo-se arrependida e pedindo uma “segunda chance”.
Se depender dos apoiadores de Vladimir Putin e da guerra na Ucrânia, vai ser difícil.
Vladislav Pozdnyakov, líder de um influente grupo nacionalista, disse no Telegram: “Anastasia Ivleeva, que organizou uma festa satânica nua no clube Mutabor da capital, será investigada pelo gabinete do procurador-geral”.
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