Londres – O primeiro ato do novo primeiro-ministro de Portugal, Luís Montenegro, colocou em pauta os limites aceitáveis de modernizar símbolos de países, prática conhecida em marketing como rebranding e que pode ser arriscada até para marcas comerciais.
Montenegro, que tomou posse na terça-feira (3) junto com os 17 ministros que formam o novo gabinete de centro-direita, trouxe de volta a logomarca do governo com elementos tradicionais da bandeira e consagrados na Constituição, que havia sido aposentada pelo governo de António Costa, do Partido Socialista, há menos de um ano, em um projeto que custou 74 mil euros aos cofres públicos.
A controvérsia da marca renovada em setembro de 2023 vai além da questão estética e à necessidade de simplificar o desenho para funcionar melhor no ambiente digital. Os símbolos que haviam sido retirados são associados a questões sensíveis como colonialismo e religião.
Símbolo de Portugal mais inclusivo
O autor da logo mais moderna adotada há menos de um ano, o designer Eduardo Aires, disse ter como objetivo tornar a imagem “mais inclusiva, plural e laica”, segundo o Manual de Marca. E fez isso removendo imagens que remetem a valores tradicionais.
O escudo de armas é um símbolo de guerra. As cinco quinas representam as chagas de Cristo. As torres remetem aos castelos conquistados dos mouros. A esfera armilar é o símbolo que o rei Dom Manuel I escolheu para representar as conquistas da navegação portuguesa, associadas ao colonialismo.
A logomarca minimalista continha apenas um quadrado, um retângulo e um círculo com as cores da bandeira nacional, bem mais limpa visualmente do que a anterior – mas o rebranding não agradou a todos.
Alguns viram um ovo no círculo amarelo, outros reclamaram da total ausência de elementos da bandeira como uma tentativa de renegar a história.
Montenegro havia prometido na campanha eleitoral que traria os símbolos de volta, e cumpriu rápido, restabelecendo imediatamente a marca anterior, criada em 2011. Durante a campanha, ele disse no Twitter / X:
“Com o meu governo, deixaremos de usar o novo símbolo. No nosso projeto não faremos sucumbir as nossas referências históricas e identitárias a uma ideia de sofisticação.”
No dia seguinte à posse, a logomarca foi substituída no site do governo e nas comunicações oficiais, mas ainda levará tempo para sumir de todos os espaços, inclusive em sinalização urbana, o que demandará mais investimentos.
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Opiniões divididas em Portugal
A decisão dividiu opiniões. O designer Eduardo Aires, que na época foi criticado pelo desenho, acha que a volta atrás pode ser uma estratégia política.
Em entrevista ao jornal Público, Aires disse considerar a mudança uma tentativa de separar o novo governo do Partido Socialista e atrair o eleitorado do Chega, partido de direita que ganhou força no país recentemente.
Mas não é bem o que pensam vários especialistas em branding de Portugal, que também não tinham visto com bons olhos a remoção total dos elementos tradicionais e saudaram na imprensa local o retorno à marca anterior, enquanto outros criticaram o desperdício de recursos para desfazer o rebranding.
Nas redes sociais, os comentários são essencialmente políticos, relacionados ao abandono de valores tradicionais associados ao país, ainda que alguns critiquem também o desenho da marca simplificada, comparado a ovo, jogos de memória e até a bandeira da Itália, apesar do amarelo.
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