Londres – O Parlamento da Geórgia anulou o veto da presidente do país, Salome Zourabichvili, e decidiu seguir em frente na adoção de uma lei de “agentes estrangeiros” ao estilo da que existe na Rússia, tendo como alvo a imprensa e organizações de defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão.
O projeto de lei que dispõe sobre “Transparência da Influência Estrangeira”, proposto pelo primeiro-ministro Irakli Kobakhidze, do partido Georgian Dream, havia sido aprovado no dia 18 de maio por 84 votos a 30.
A vantagem permitiu ao partido que tem maioria na casa tornar inválido em uma sessão realizada na quarta-feira (28) o veto da presidente cujas funções são apenas cerimonais, ignorando os protestos que tomaram conta da capital, Tiblisi, e as ameaças da União Europeia de que o caminho para integrar o bloco se tornará mais difícil para a Geórgia.
Lei da Geórgia inspirada na Rússia
A nova lei, inspirada na legislação que vem sendo utilizada pelo regime de Vladimir Putin para sufocar a mídia independente e impedir a atuação de organizações não-governamentais na Rússia, determina que entidades sem fins lucrativos e omeios de comunicação que recebam mais de 20% do seu financiamento de fontes baseadas no exterior se registrem como “organizações que defendem os interesses de uma potência estrangeira”.
Elas terão que apresentar contas financeiras anuais detalhadas e estarão sujeitas a medidas de controle e monitoramento de suas atividades que ainda não foram detalhadas, segundo o Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ).
As organizações que não se registem ou não forneçam os dados exigidos poderão ter que pagar multas de 25 mil lari (equivalente a US$ 9,5 mil) e multas mensais de 20 mil lari (US$ 7,5 mil) por não cumprimento continuado das regras.
O CPJ informou que o texto da lei foi alterado para permitir que indivíduos também possam ser multados, e que o pagamento seja imediato, sem prazo para recurso.
Em 21 de maio, a Comissão de Veneza, um órgão consultivo jurídico do Conselho da Europa, apelou às autoridades da Geórgia para revogarem a lei, dizendo que ela “tem o efeito objetivo de arriscar a estigmatização, o silenciamento e, eventualmente, a eliminação de associações e meios de comunicação que recebem até mesmo uma pequena parte dos seus fundos do exterior.”
Em 23 de maio, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, anunciou uma política de restrições de vistos a indivíduos “responsáveis ou cúmplices em minar a democracia na Geórgia” em conexão com a lei do agente estrangeiro, incluindo aqueles responsáveis por uma “campanha de violência ou intimidação” para reprimir as críticas ao projeto de lei.
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Reações à nova lei não fizeram governo da Geórgia recuar
A população da Geórgia reagiu com protestos nas ruas contra a aprovação do projeto de lei, proposto pelo partido Georgian Dream, comandado pelo bilionário Bidzina Ivanishvili, que hoje é seu presidente honorário e que supostamente tem laços com a Rússia.
O “dream” (sonho) que dá nome ao partido refere-se ao ingresso do país na União Europeia, o que abriria possibilidades de crescimento e emprego. No entanto, autoridades da UE manifestaram-se claramente sobre o risco de o caminho ser interrompido se a lei entrar em vigor.
Por isso, os protestos foram dominados pelos jovens, interessados nas oportunidades para o seu futuro e preocupados com uma onda de repressão como ocorre na Rússia.
Uma primeira tentativa de aprovação, em 2023, havia sido sustada depois de protestos, mas desta vez o governo resolveu seguir em frente, com a certeza de que conseguiria aprovar o projeto.
Segundo a Organização Mundial contra a Tortura (OMCT), desde meados de abril, quando os protestos começaram, pelo menos 300 pessoas foram presas na Geórgia ,e muitas sofreram com a brutalidade policial durante a repressão policial às manifestações contra a introdução da lei do “agente estrangeiro”.
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