Mas isso não foi nada comparado ao número de pedaços de plástico menores e coloridos que minhas companheiras de tripulação e eu coletávamos dia após dia.
X Trillion, um novo documentário exibido em cinemas independentes no Reino Unido, traça o progresso daquela viagem de 3 mil milhas náuticas pelo do Pacífico Norte. do Havaí a Vancouver.
Foi uma viagem pioneira, com tripulação formada só por mulheres. A viagem foi organizada pela eXXpedition, uma organização sem fins lucrativos que realiza expedições de pesquisa usando barcos a vela (e agora virtualmente) para investigar as causas e soluções para o problema global da poluição plástica.
O trailer do filme mostra um pouco sobre como foi a viagem e o que foi encontrado.
Uma semana após o início desta viagem de três semanas, vimos um enorme amontoado de redes, cordas e outros materiais plásticos formando o que é conhecido como “arte fantasma” – à medida que essas artes de pesca descartadas, perdidas ou abandonadas flutuam, elas se agregam formando uma massa maior.
Este material fantasma pode capturar, ferir e até matar animais selvagens marinhos, incluindo tartarugas que pesquisei durante muitos anos.
A bola de quatro metros de detritos que vi era pesada demais para ser puxada para dentro do barco eXXpedition. A nossa equipe anexou nela um localizador de satélite, e oceanógrafos da Universidade do Havai acompanharam o seu progresso à medida que viajava milhares de quilômetros acumulando cada vez mais detritos.
Tempos depois a bola foi recolhida por um barco maior em uma viagem de limpeza.
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Expedição analisou o lixo plástico achado no oceano
Embora as grandes redes fantasmas tenham sido chocantes, foi a enorme escala de microplásticos que mais chocou a mim e ao resto da tripulação da eXXpedition.
Muitas pessoas pensam na grande mancha de lixo do Pacífico como uma enorme ilha de plástico flutuante. Mas na verdade parece um oceano aberto e imaculado até que olhamos mais de perto e observamos as águas superficiais, onde encontramos milhares de pequenos pedaços de plástico.
Para coletar amostras de microplásticos nas águas superficiais, usamos uma rede de arrasto manta. Com suas asas de metal e boca larga, esse tipo de rede lembra uma arraia manta.
À medida que é arrastada ao lado do barco durante períodos de 30 minutos a uma velocidade constante de dois nós, recolhe minúsculas partículas sólidas da superfície.
O meu trabalho a bordo era coordenar o recolhimento de dados, ajudar a padronizar os métodos de amostragem e garantir que as amostras de microplásticos chegassem aos nossos dez parceiros científicos em todo o mundo.
Amostras obtidas com a rede permitiram-nos recolher dados sobre a abundância, tipo e fontes potenciais de fragmentos de plástico presentes no Pacífico Norte.
A maioria dos pedaços de plástico que coletamos eram fragmentos duros que podem ser ingeridos por engano por animais marinhos vulneráveis, como as tartarugas.
Uma das amostras que recolhemos continha 507 pedaços de plástico – o que equivale a mais de meio milhão de pedaços num raio de 1 km² do oceano.
Uma estudante de mestrado da Universidade de Exeter, Lowenna Jones, analisou essas 507 peças e encontrou 28 tipos diferentes de polímeros plásticos. Isto mostra que o plástico vem de muitas indústrias, aplicações e produtos diferentes.
Muitos dos nossos dados foram enviados para o Instituto 5 Gyres, nos EUA, onde cientistas estimaram recentemente que existem mais de 170 bilhões de pedaços de plástico nos oceanos do mundo.
Tendo estudado os efeitos da poluição plástica em pequenas tartarugas juvenis para o meu doutorado , compartilhei o meu conhecimento sobre a questão da poluição plástica e os seus efeitos nos ecossistemas marinhos aos outros 13 membros da tripulação que tinham conhecimentos e experiências diferentes – alguns eram designers, escritores e professores.
Procurando soluções para o mar de lixo
O filme X Trillion pretende aumentar o conhecimento sobre a questão da poluição plástica. A investigação científica pode ajudar-nos a construir uma imagem mais precisa do que se passa no oceano.
Por exemplo, contaminantes nocivos como os bifenilos policlorados – produtos químicos industriais tóxicos que estão agora proibidos – ainda persistem no ambiente.
Estes podem aderir à superfície dos plásticos.Uma vez ingeridos, esses produtos químicos tóxicos podem causar ainda mais danos à vida selvagem.
Projetos como o eXXpedition podem esclarecer os efeitos que os plásticos podem ter na vida selvagem. Esta informação pode ser um catalisador para a mudança quando utilizada de forma eficaz para informar e melhorar a política de poluição plástica, como o tratado global sobre plásticos que está atualmente sendo negociado.
Com uma maior consciência sobre a poluição plástica, parece haver um impulso crescente para inovar. Estão sendo produzidos novos produtos inteligentes, mas é possível fazer mais para limitar o consumo excessivo.
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O que a sociedade pode fazer para proteger o oceano
Como sociedade, precisamos de mudar a forma como valorizamos materiais como os plásticos. Os plásticos descartáveis ainda são um grande problema. Usar um material projetado para durar para sempre apenas uma vez e depois descartá-lo não faz sentido.
Em clima de esperança, este novo filme sobre a viagem eXXpedition mostra como realmente é o oceano remoto e provoca reflexão sobre o entendimento das pessoas a respeito do que acontece com os itens plásticos comuns. Se não forem gerenciados adequadamente, todos esses resíduos plásticos acabam circulando no mar aberto.
Os seres humanos causaram o problema da poluição plástica, então podemos projetar soluções para resolver isso. Todos têm o poder de fazer a diferença.
Isso pode ser tão simples quanto investir em uma garrafa de bebida reutilizável em vez de usar garrafas plásticas descartáveis. A minha garrafa viajou pelo mundo comigo durante mais de dez anos – reabastecê-la poupou inúmeras garrafas de plástico que iriam para o lixo.
Com muito mais pessoas a tomarem pequenos passos como este, podemos ajudar a evitar que mais lixo plástico entre nos cursos de água e nos oceanos.
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Sobre a autora
Emily Duncan é bióloga conservacionista com 10 anos de experiência trabalhando em pesquisa marinha, especializada em impactos e monitoramento da poluição plástica. Depois de concluir o seu doutoramento ‘Investigação dos impactos da poluição plástica nas tartarugas marinhas’ na Universidade de Exeter, trabalhou em vários projetos, desde a National Geographic Sea to Source Expedition, que avalia a poluição plástica ao longo do rio Ganges, até à investigação da distribuição de artes fantasmas em o mar profundo que rodeia os Açores.
Este artigo foi publicado originalmente no portal acadêmico The Conversation e é republicado aqui sob licença Creative Commons.