Joshua Gulam professor de cinema
Joshua Gulam

George Clooney pediu na semana passada a Joe Biden, que está buscando um segundo mandato como presidente dos EUA, para “se afastar” a fim de proteger a democracia contra a volta de Donald Trump.

Em um artigo de opinião para o New York Times, o ator de Hollywood pediu ao Partido Democrata que substituísse Biden por um candidato mais jovem, alertando: “Não vamos ganhar com esse [candidato a] presidente.”

O artigo de Clooney foi uma resposta ao debate presidencial em 28 de junho, quando Biden tropeçou em suas palavras em muitas ocasiões e lutou para se igualar à energia de Trump.

O impacto da manifestação de George Clooney sobre Biden

As consequências desse debate foram catastróficas para os democratas , alimentando preocupações de que Biden (aos 81 anos) não está mentalmente ou fisicamente apto o suficiente para um segundo mandato como presidente.

E, após a tentativa de assassinato  contra Trump em um comício na Pensilvânia em 13 de julho, acredita-se que o apoio popular à campanha do ex-presidente aumentará significativamente, tornando a tentativa de reeleição de Biden ainda mais difícil.

Nas últimas semanas, vários especialistas e doadores democratas emitiram alertas sobre a probabilidade de uma vitória retumbante de Trump em novembro. Mas eu diria que foi Clooney quem teve o maior impacto nas discussões em torno da candidatura de Biden.

Como uma grande estrela e democrata de longa data, Clooney exerce influência significativa sobre a política liberal nos EUA e no exterior.

Quando ele fala sobre política, a grande mídia tende a ouvir ( para o bem e para o mal ).

Esta última intervenção continua o longo histórico de campanha de Clooney e fortalece sua reputação como o “liberal líder” em Hollywood atualmente.

Um ‘atorvista’ comprometido

Clooney não é novato em campanhas ou temas políticos. Em 2003, ele se manifestou contra a invasão do Iraque pelos EUA, acusando o então presidente, George W. Bush, de administrar o governo como a família criminosa fictícia de The Sopranos .

Esse ativismo antiguerra rendeu a Clooney um grau de credibilidade entre pessoas da esquerda e centro-esquerda, e ele continuou demonstrar peso em debates sobre questões políticas ao longo da década.

Na década de 2010, Clooney se tornou um dos apoiadores mais destacados do presidente Barack Obama.

George Clooney, que criticou Joe Biden, conversando com Barack Obama
George Clooney e Barack Obama em reunião na Casa Branca em 2010 (foto:

Durante a campanha presidencial de 2012, Clooney organizou uma série de eventos de arrecadação de fundos democratas que geraram mais de US$ 15 milhões para a campanha de reeleição de Obama.

Essas atividades alimentaram relatos sobre a amizade próxima da dupla, incluindo histórias amplamente divulgadas de Clooney e Obama indo a “encontros para jantar” e jogando basquete.

Além da política eleitoral, Clooney participou de uma ampla gama de campanhas humanitárias. Em 2013, o ator explicou que usa uma parte do dinheiro de seus acordos de patrocínio para ajudar a financiar um satélite que “monitora abusos de direitos humanos” na fronteira entre o Sudão e o Sudão do Sul.

George e Amal Clooney unidos no ativismo

As credenciais de Clooney foram reforçadas ainda mais por seu casamento com a renomada advogada de direitos humanos Amal Alamuddin .

Após o casamento, em 2014, o casal estabeleceu a Clooney Foundation for Justice , uma organização que reúne evidências de “abusos em massa de direitos humanos” e fornece aconselhamento jurídico gratuito às vítimas.

Como qualquer celebridade que se dedica à política, Clooney recebeu sua cota de críticas. Em 2006, o desenho animado South Park dedicou um episódio inteiro para “zoar” da benevolência liberal de Clooney, dizendo que a “nuvem de presunção” de seu discurso de aceitação do Oscar ameaçava engolir a Califórnia.

Críticas mais recentes ao ator destacaram um conflito entre seu humanitarismo e seu trabalho com a Nespresso, a marca de café de propriedade da Nestlé que o emprega como “embaixador”.

Apesar dessas críticas, Clooney é regularmente descrito como um operador político eficaz . Ele foi elogiado por atingir o equilíbrio certo entre mensagens sérias e charme mais descontraído, evitando assim a “pregação” que faz tropeçar muitos liberais de Hollywood.

No século 21, poucas estrelas se envolveram mais diretamente na política de Washington do que Clooney. E ainda menos ainda conseguiram combinar o ativismo com um nível tão forte de apelo.

De Beatty a Clooney

As atividades políticas e de caridade de Clooney se encaixam em uma tradição mais longa do liberalismo de Hollywood. Suas tentativas recentes de moldar a estratégia do Partido Democrata lembram aquelas de ícones anteriores, incluindo o ator e cineasta americano Warren Beatty .

Em seu excelente livro, Hollywood Left and Right , o historiador Steven J. Ross examina o apoio de Beatty a causas liberais tanto na tela quanto fora dela.

Entre 1970 e 1988, quando estava no auge de seu estrelato, Beatty fez longas pausas na atuação e na direção para trabalhar em três campanhas presidenciais democratas – primeiro para George McGovern na eleição de 1972, depois para Gary Hart em 1984 e 1988.

Desde que se voltou para a política no início dos anos 2000, Clooney tem sido consistentemente aclamado como um “sucessor” de Beatty. Deixando de lado o fato de que Beatty é muito mais radical politicamente, a comparação entre ele e Clooney faz muito sentido.

Assim como Beatty, Clooney é um antigo galã que transformou sua imagem ao combinar sua atuação com passagens de sucesso crítico por trás das câmeras.

Clooney candidato?

Clooney também tem passado tando tempo falando de política eleitoral que os comentaristas sempre perguntam :”Quando ele próprio concorrerá a um cargo?”.

A mesma pergunta foi feita a Beatty duas décadas antes.

Mas o que mais claramente conecta Clooney e Beatty é sua marca de liberalismo populista. Em seu momento mais efetivo, ambas as estrelas tiveram sucesso em enquadrar a política liberal de uma forma que agrada mais do que apenas democratas ferrenhos.

Parte da eficácia de Clooney vem de seus papéis em filmes e programas de TV extremamente populares, que tendem a escalar o ator como um patife adorável ou um anti-herói convincente .

É interessante considerar como os personagens que Clooney interpreta na tela alimentaram sua campanha fora da tela – e se sua última intervenção na política eleitoral o escalará como herói ou vilão.


Sobre o autor

Joshua Gulam é acadêmico e professor de estudos de cinema e mídia com interesse particular em cinema comercial, indústria cinematográfica de Hollywood, estrelato e ativismo humanitário de celebridades, dedicando-se a examinar os vínculos entre cultura popular e forças sociais, setoriais e políticas.

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no portal acadêmico The Conversation e é republicado aqui sob licença Creative Commons.