Londres – No mesmo dia em que o repórter do Wall Street Journal Evan Gershkovich foi condenado na Rússia a 16 anos de cadeia por crime de espionagem, a jornalista russo-americana Alsu Kurmasheva, de 47 anos, foi sentenciada a seis anos e meio de prisão em um julgamento secreto confirmado pelas autoridades russas apenas nesta segunda-feira (22).
Ela vive em Praga e é editora do noticiário tártaro-bashkir da Radio Free Europe/Radio Liberty (RFE/RL), financiada pelo Congresso dos EUA. A jornalista não se registrou como “agente estrangeiro” ao viajar por motivos familiares para Kazan, na Rússia, sendo acusada de ter entrado no país para coletar informações sobre atividades militares.
Quando se preparava para retornar a Praga, em 2 de junho, seus dois passaportes foram confiscados. Kurmasheva ficou aguardando a devolução e acabou presa em outubro, com a prisão preventiva estendida várias vezes até o julgamento secreto na sexta-feira (19).
Jornalista condenada na Rússia não teve o mesmo tratamento de repórter do WSJ
Kurmasheva foi acusada em decorrência de seu suposto envolvimento na distribuição de um livro baseado em histórias de moradores da região do Volga que se opõem à guerra russa contra a Ucrânia. O livro foi publicado pelo serviço Tatar-Bashkir da RFE/RL em novembro de 2022.
A Rússia geralmente realiza julgamentos a portas fechadas, mas emitir um veredito e sentenciar dessa maneira é “extremamente heterodoxo”, segundo a Federação Internacional de Jornalistas.
O presidente da RFE/RL, Stephen Capus, classificou a condenação de Kurmasheva como “uma zombaria da justiça”.
“A condenação ilustra o nível sem precedentes de despotismo que permeia um judiciário russo que recebe ordens do Kremlin. A RSF está indignada com esta sentença infundada, que visa dissuadir jornalistas de viajar para a Rússia e pressionar os Estados Unidos. Ela deve ser libertada imediatamente”, disse Jeanne Cavalier, da organização de liberdade de imprensa Repórteres Sem Fronteiras.
Apesar da dupla nacionalidade e de trabalhar para um veículo de mídia financiado pelos EUA, ela não está tendo o mesmo apoio concedido pelo governo a Evan Gershkovich.
O caso dele foi denominado como “detenção injusta”, o que obriga os EUA a adotarem medidas mais efetivas em busca da repatriação, incluindo uma possível troca de prisioneiros, possibilidade admitida tanto por autoridades americanas quanto pela Rússia.
Isso foi feito em dezembro de 2022 no caso da atleta de basquete americana Brittney Grinner, condenada por porte de óleo de cannabis. Ela foi trocada por um traficante de armas russo que estava cumprindo pena em Ohio.
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A acusação contra a jornalista russo-americana
Além da dupla nacionalidade, a repórter Alsu Kurmasheva também tem contra si o fato de trabalhar para a Radio Free Europe, que tem estado na mira da repressão do governo da Rússia.
A lei do agente estrangeiro, utilizada como argumento para a detenção da repórter, foi criada em 2014 e determina que pessoas ou entidades que recebam recursos do exterior se cadastrem junto às autoridades.
O regulamento passou a ser instrumento para a repressão de jornalistas e veículos de comunicação pelo governo Putin antes mesmo do início da guerra com a Ucrânia.
Nem Dmitry Muratov, que ganhou o prêmio Nobel da Paz em 2021, escapou do rótulo e de suas consequências. A designação dificulta a obtenção de recursos de propaganda, assinaturas ou doações para manter as atividades jornalísticas.
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Alsu Kurmasheva fazia reportagens sobre comunidades de minorias étnicas no Tartaristão e Bashkortostan, na Rússia, e é editora do serviço.
Segundo o Comitê de Proteção a Jornalistas, em agosto de 2022 a polícia de Kazan revistou as casas de sete profissionais e colaboradores da emissora e interrogou-os sobre o trabalho para a Radio Free Europe.
Citando a agência de notícias estatal Tatar-Inform, o Comitê de Proteção a Jornalistas relatou que as autoridades acusam Kurmasheva de ter “conduzido deliberadamente uma coleta direcionada de informações militares sobre as atividades da Rússia pela Internet, a fim de transmitir informações a fontes estrangeiras”, o que teria ocorrido em setembro de 2022.
Ela também foi acusada de usar informações sobre a universidade do Tartaristão compartilhadas por professores convocados para o exército para preparar “materiais analíticos alternativos” para “autoridades internacionais relevantes e para conduzir campanhas de informação que desacreditam a Rússia”.
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