Seis grandes editoras dos EUA entraram com um processo contra o Departamento de Educação da Flórida para tentar derrubar uma lei estadual que autoriza a remoção de livros de escolas e bibliotecas se forem considerados “obscenos”, em vigor desde julho de 2023. 

Entre as mais de 1,6 mil obras proibidas em escolas do ensino fundamental, médio e superior estão livros contemporâneos e clássicos da literatura universal como “Por Quem os Sinos Dobram”, de Ernest Hemingway; “As Aventuras de Tom Sawyer”, de Mark Twain; “O Diário de Anne Frank” e até dicionários de inglês e o livro Guinness de recordes. 

O processo de 94 páginas foi protocolado em um tribunal federal de Orlando na sexta-feira (29) pelas editoras Penguin House, Hachette Book Group, HarperCollins Publishers, Macmillan Publishers, Simon & Schuster e Sourcebooks, tendo como co-autores a associação de escritores Authors Guild, vários escritores, estudantes e pais de alunos. 

Lei de banimento de livros da Flórida ‘viola Primeira Emenda’ 

Promulgada sob a administração do governador conservador da Florida, Ron DeSantis, a lei HB 1069  tem um dispositivo que permite ao estado proibir conteúdo que “retrate ou descreva conduta sexual” sem precisar considerar o valor literário, artístico ou cultural da obra como um todo.

Também expandiu as barreiras processuais ao exigir que as escolas removessem um livro dentro de cinco dias a partir da objeção de um pai a um livro e que a obra permanecesse indisponíveis até que a objeção fosse resolvida.

Os autores do processo argumentam que a HB 1069 é muito ampla e viola a liberdade de expressão protegida pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA.

E que essa liberdade inclui o direito de autores e editoras de comunicar ideias a estudantes e os direitos dos estudantes de receber essas ideias sem interferência indevida do Estado.

A ação judicial afirma ainda que a lei que permite a remoção de livros viola uma jurisprudência estabelecida em 1973, no julgamento do processo Miller x California. 

A Suprema Corte dos EUA decidiu que quando uma obra não é considerada obscena, ela é uma expressão protegida constitucionalmente pela Primeira Emenda.

Os demandantes argumentaram na sexta-feira que a censura excessiva do estado a obras com conteúdo sexual ignora o padrão estabelecido. 

Proibição de livros é censura a autores, diz sindicato 

Mary Rasenberger, CEO da Authors Guild, disse: 

“Proibições de livros censuram as vozes dos autores, negando e silenciando suas experiências e histórias vividas. Essas proibições têm um efeito assustador sobre o que os autores escrevem e prejudicam sua reputação ao criar a falsa noção de que há algo indecoroso em seus livros.

No entanto, esses mesmos livros edificam os jovens há décadas, expandindo mundos e fomentando a autoestima e a empatia pelos outros. Todos nós perdemos quando as verdades dos autores são censuradas.”

Sydney Booker, porta-voz do departamento de educação da Flórida, chamou o processo das editoras de “uma farsa”, em resposta a um questionamento feito pelo site de notícias políticas The Hill.

Ele afirmou que “não há livros proibidos na Flórida. Material e instruções sexualmente explícitos não são adequados para escolas.”

Não é o que pensam entidades de defesa da liberdade de expressão, como o PEN America. Em maio, a entidade havia entrado com um processo contra o condado de Escambia contestando remoções e restrições de mais de 1,6 mil livros de bibliotecas escolares, ao lado de pais e alunos. 

Desde que uma onda conservadora passou a avançar nos EUA, sobretudo após a administração de Donald Trump, outros estados também passaram a legislar contra livros com base em conteúdo sexual – e a serem questionados judicialmente. 

Já existem litígios em curso em Iowa, Texas e Arkansas. E recentemente Idaho e Alabama aprovaram legislação semelhante à da Flórida.