Londres – Uma explosão de raiva contra jornalistas protagonizada por Robert Fico primeiro-ministro da Eslováquia, provocou protestos de organizações de liberdade de imprensa preocupadas não apenas com o clima de hostilidade insuflado pelo governante mas também com o possibilidade de o país ganhar um órgão para controlar a mídia que desafia atos do governo.
Ao ser questionado durante uma entrevista coletiva na terça-feira (8) sobre divergências na coalizão que sustenta sua administração, Fico explodiu e chamou os profissionais de imprensa de “bastardos sanguinários”.
O primeiro-ministro seguiu com as ofensas, acusando os jornalistas que criticam seu governo de estarem “possuídos pelo diabo”, “movidos por ódio”.
Robert Fico, que sobreviveu a um atentado a bala em maio, culpou a mídia pelo ataque que quase custou sua vida.
“Vocês só querem mal, mal, mal e mal, e é por isso que o clima está do jeito que está.”
Insultos do primeiro-ministro da Eslovávia ‘colocam jornalistas em perigo’
O Comitê para a Proteção dos Jornalistas condenou os comentários depreciativos, e pediu às autoridades eslovacas que garantam que os jornalistas possam fazer seu trabalho sem medo de represálias.
“Estamos alarmados”, disse Attila Mong, representante do CPJ na Europa em Berlim.
“Essa retórica hostil dos mais altos níveis do governo coloca jornalistas em perigo e corrói a confiança pública na mídia. Autoridades do governo devem apoiar o trabalho dos jornalistas em vez de difamá-los.”
Segundo o CPJ, o mais recente ataque verbal de Fico à imprensa ilustra uma tendência preocupante de crescente hostilidade em relação à mídia.
Na entrevista, o governante reclamou que “a imprensa não o deixa em paz”, e endereçou queixas a dois veículos de oposição, Denník N e Sme e Aktuality.sk, com os quais não dialoga mais.
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Autoridade para controlar a imprensa na Eslováquia
Na sequência da explosão, Robert Fico afirmou que “o caos de mídia” que assola a Eslováquia não existe em lugar nenhum da Europa, e sinalizou apoio ao plano de uma autoridade nacional de mídia para controlar a imprensa, instrumento usado por países reconhecidos pela censura e repressão.
O órgão poderia aplicar sanções a jornalistas que não corrigissem erros em suas reportagens, segundo o primeiro-ministro eslovaco. Ele defendeu que os profissionais de imprensa passem por cursos de requalificação.
A intolerância de governantes contra a imprensa, muitas vezes inspirada no padrão adotado por Donald Trump nos EUA, é vista com preocupação por organizações de defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão, pois acentuam hostilidade do público contra profissionais que muitas vezes resultam em agressões físicas e assédio.
Segundo o CPJ, após o atentado a Robert Fico jornalistas relataram um “padrão orquestrado” de abuso, com políticos atacando verbalmente repórteres em público e online, e seus apoiadores amplificando suas mensagens nas mídias sociais.
Vários temem que tais insultos pudessem facilmente se transformar em violência física novamente, como aconteceu com o assassinato do jornalista investigativo eslovaco Ján Kuciak em 2018, um caso que marcou o jornalismo na Europa e que ocorreu durante o primeiro mandato do atual premiê.
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