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Caso Zamora: Justiça da Guatemala revoga prisão domiciliar semanas após jornalista deixar cadeia e até presidente protesta

José Rubén Zamora, jornalista da Guatemala, foi preso em julho de 2022 e em maio de 2023 seu jornal, elPeriódico, fechou as portas

José Rubén Zamora, fundador do elPeriódico (foto: Georgia Popplewell via Flickr CC BY-NC-SA) 2.0)

Pouco menos de um mês após deixar a cadeia, o jornalista José Rubén Zamora, de 68 anos, teve sua prisão domiciliar revogada pela Justiça da Guatemala e seus advogados tentam cancelar a decisão para evitar que ele retorne ao cárcere.

Fundador e editor do elPeriodico, Zamora não chegou a completar nem um mês em casa: ele estava em prisão domiciliar desde 19 de outubro, após passar mais de dois anos detido sem um julgamento válido.

Foi justamente por isso que a decisão foi proferida, já que um juiz entendeu que a prisão preventiva havia excedido o período legal e estava violando os direitos humanos. Agora, a revogação pega de surpresa apoiadores e entidades que acompanham o caso e até o atual presidente do país, Bernardo Arévalo. 

Caso Zamora divide órgãos na Guatemala

Zamora foi preso em julho de 2022 após falsas acusações de lavagem de dinheiro, extorsão e obstrução da Justiça.

O caso logo ganhou repercussão dentro e fora da Guatemala, já que Zamora é um dos jornalistas mais respeitados do país, premiado por organizações internacionais por denunciar crimes de corrupção e crítico assíduo do ex-presidente Alejandro Giammattei.

Em 2023, ele foi condenado a seis anos de prisão por uma das acusações, mas a sentença foi anulada e um novo julgamento foi marcado para 2025. A defesa de Zamora aproveitou o impasse para pressionar pela prisão domiciliar, concedida no mês passado.

Durante uma conferência promovida pela Fundação Thomson Reuters em Londres em novembro, José Carlos Zamóra, filho do editor e também jornalista logo após o pai ter ido para a prisão domiciliar, falou que ainda seria uma batalha longa, e informou que mais de 10 advogados se sucederam na defesa, à medida em cada um deles ia sendo alvo de perseguições. 

A previsão do filho do jornalista estava certa. O Ministério Público da Guatemala apresentou um recurso se opondo à prisão domiciliar, que foi acatado pela Justiça no dia 15 de novembro.

O presidente Bernardo Arévalo lamentou a ação judicial:

“Mais uma vez, querem que José Rubén Zamora volte à prisão de uma forma totalmente abusiva e arbitrária. Nosso sistema de justiça está sendo testado, e o povo guatemalteco tem sido claro em exigir respeito pelo exercício do jornalismo.

Qualquer resolução que ataque a liberdade de expressão é ilegítima. O governo da Guatemala tomará todas medidas para defender a liberdade de expressão. ”

O apoio de Arévalo a Zamora irritou o MP guatemalteco:

“O Ministério Público lamenta as declarações do Presidente da República, Bernardo Arévalo de León, que constituem uma tentativa de violar a autonomia e independência que a Constituição e a legislação guatemalteca conferem ao Ministério Público e ao Poder Judiciário.”

O órgão ainda alertou que o não cumprimento de uma ordem judicial pode resultar em responsabilidade criminal para todos os envolvidos, desde policiais até ministros.

Em entrevista à RFI, Zamora disse que recebeu ofertas de asilo político, mas que para honrar a palavra perante o tribunal e o juiz que deu medidas alternativas, está disposto a esperar. “Se me mandarem de volta para a prisão, voltarei”, afirmou. 

ONG fala em “corrupção” do Judiciário da Guatemala

A ONG Repórteres sem Fronteiras se disse “alarmada” com a decisão de mandar Zamora de volta para a prisão e apelou para o presidente da Guatemala ajudar no caso:

“Esta é uma medida ultrajante que destaca a corrupção contínua do judiciário guatemalteco. A necessidade da libertação total e incondicional de Zamora nunca foi tão urgente.

Apelamos novamente ao presidente Arévalo para fazer tudo o que estiver ao seu alcance para garantir a liberdade total de Zamora e garantir sua proteção como uma prioridade urgente.”

A RSF também destacou que a perseguição incessante ao jornalista envia uma “mensagem assustadora” para os demais profissionais de imprensa que trabalham cobrindo abusos de poder no país.

Ao menos 25 jornalistas guatemaltecos estão exilados por enfrentarem acusações semelhantes as de Zamora, ressalta a ONG.

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