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Questão que divide muitos pais virou discórdia entre acadêmicos: contar ou não a crianças a verdade sobre Papai Noel?

Foto: divulgação Discover Finland

Londres – A eterna batalha natalina entre pais divididos sobre mentir ou contar a verdade sobre o Papai Noel ganhou neste Natal um palco inusitado: o mundo acadêmico. 

Dois filósofos com visões opostas entraram no debate explorando os impactos da “mentira do Papai Noel” na educação dos filhos à luz da ética e da confiança em artigos no portal Acadêmico The Conversation e despertaram polêmica. 

A controvérsia começou com um artigo do professor de filosofia Joseph Millum, da Universidade St Andrew, justificando por que os pais não devem mentir aos filhos sobre a existência de Papai Noel. Dias depois veio a réplica do também professor de filosofia Tom Whyman, da Universidade de Liverpool, que sem se referir ao colega, defendeu a manutenção do mito, deixando as crianças descobrirem a verdade sozinhas. 

Papai Noel e a honestidade entre pais e filhos 

Pai de crianças pequenas, Whyman ampliou a questão: “até que ponto os pais devem ser honestos com os filhos de forma geral, e o que é ‘ser honesto'”?

Ele argumenta que a crença no Papai Noel é um elemento importante na infância, comparando-a à necessidade de proteger as crianças de realidades muito duras do mundo.

“Se eu me sentisse compelido a contar tudo aos meus filhos, eu relataria o estado triste do mundo, da existência, e a minha resignação ainda mais profunda de que nada de positivo pode ser feito sobre isso.”

O professor de filosofia acredita que a crença num mundo mágico, onde o bom comportamento é recompensado, como no caso do Papai Noel, ajuda a moldar cidadãos críticos e otimistas. 

E cita uma fala do filósofo Nietzsche para defender a importância da ilusão na infância: “‘Iluda seus filhos’”. 

Para Whyman, a descoberta da verdade sobre o Papai Noel, quando feita na idade certa, pode ser um passo importante para o desenvolvimento da autonomia e do senso crítico da criança. 

Mentir sobre Papai Noel é ‘antiético’

Do outro lado do debate, Joseph Millum, da Universidade de St. Andrews, considera antiético mentir para as crianças sobre o Papai Noel, ainda que a intenção seja boa.

 Ele argumenta que a mentira, mesmo que “branca”, é uma forma de manipulação que pode prejudicar a confiança da criança nos pais.

“Primeiro, mentir prejudica a autonomia…contar mentiras para crianças para fazê-las se comportarem é manipulador. Isso as impede de decidir pelos motivos certos.”

Millum baseia sua opinião em pesquisas que associam a criação de filhos com base em mentiras a problemas de relacionamento entre pais e filhos adultos. 

Gail Heyman, professora de psicologia da Universidade da Califórnia em San Diego, define essa prática como “parentalidade mentirosa” e, em um de seus estudos, constatou que quatro em cada cinco pais admitiram ter mentido para influenciar o comportamento ou as emoções dos seus filhos.

‘Mentira natalina não protege crianças’

Millum também argumenta que a mentira do Papai Noel não se justifica pela necessidade de proteger as crianças de verdades desagradáveis, como a miséria do mundo, tese de seu opositor.

“Mas isso não justifica a mentira do Papai Noel porque não está protegendo as crianças de verdades desagradáveis. Afinal, não achamos que famílias que não celebram o Natal estejam quebrando a confiança de seus filhos.”

Millum menciona ainda pesquisas que investigaram as reações de crianças ao descobrirem a verdade sobre o Papai Noel.

Em um estudo de 1994 com 52 crianças, a idade média da descoberta foi de sete anos, e as reações foram variadas: metade se sentiu triste, decepcionada ou enganada, enquanto três em cada cinco disseram ter ficado felizes.  Mas segundo ele, nenhuma dessas reações foi muito intensa.

Um estudo semelhante realizado em 2024 com 48 crianças, com idade média de descoberta aos oito anos, obteve resultados similares: quase metade relatou emoções negativas, enquanto um número similar se disse feliz.

Para Millum, a magia do Natal pode ser vivenciada sem recorrer à mentira e as crianças podem desenvolver a sua imaginação de outras formas.

Ele sugere que, em vez de perpetuar a mentira, os pais celebrem um Natal “onde todos saibam que o Papai Noel é faz de conta.”

Para quem continua na dúvida sobre o que fazer neste natal, os dois artigos podem ser lidos na íntegra aqui: 

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