O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) condenou a decisão da Casa Branca de bloquear o acesso da agência de notícias Associated Press (AP) a eventos oficiais por se recusar a usar a nomenclatura “Golfo da América” em substituição a “Golfo do México”, apontada como a ação mais recente da briga histórica de Donald Trump com grande a imprensa nas primeiras semanas da nova administração.
A CEO do CPJ, Jodie Ginsberg, afirmou que a medida segue um padrão de difamação e punição da imprensa por parte do governo Trump, o que para a instituição é “inaceitável”.
“Retaliar a AP – uma das principais provedoras mundiais de notícias baseadas em fatos – por seu conteúdo enfraquece o compromisso declarado do presidente dos EUA com a liberdade de expressão […].”
Ao anunciar a decisão de manter o nome Golfo do México, a AP salientou que a nova denominação só é válida nos EUA, e seu conteúdo é distribuído internacionalmente.
Em resposta, no dia 11 de fevereiro um repórter da agência foi impedido de cobrir um evento na Casa Branca, dando início a mais uma briga com a imprensa.
Outros profissionais tiveram na sequência o acesso bloqueado a solenidades no Salão Oval e a viagens no avião presidencial Air Force One, durante as quais são realizadas coletivas para jornalistas.
Nesta terça-feira (19), Trump confirmou em uma coletiva de imprensa que a AP seguiria banida até voltar atrás em sua decisão sobre o nome do Golfo, sob o argumento de que a nomenclatura virou lei no país.
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CPJ recorda briga histórica de Trump com a imprensa
Para o CPJ, a atitude do governo de Donald Trump em relação à AP faz parte de uma longa lista de preocupações envolvendo a forma como a imprensa vem sendo tratada em seu governo, um padrão que vem de longe.
Citando dados do site de notícias Axios, o CPJ destacou que Trump esteve envolvido em pelo menos 29 ações de difamação relacionadas à imprensa desde que anunciou sua primeira candidatura à presidência, em 2015.
A organização de liberdade de imprensa salienta que esses processos geralmente envolvem litígios longos e caros, que podem abalar as finanças de um veículo de comunicação, além de encorajarem autoridades locais a seguirem o exemplo e de levarem à prática de autocensura.
O histórico de Trump com a imprensa inclui um processo de difamação contra a ABC, que em dezembro concordou em pagar US$ 15 milhões (R$ 85 milhões) para encerrar a briga envolvendo o âncora George Stephanopoulos.
Anteriormente ele já se referiu aos veículos de notícias como “inimigos do povo“, e chamou as redes CNN e NSBC de “campo inimigo”.
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Investigações sobre órgãos de imprensa
O CPJ apontou ainda um potencial uso indevido dos poderes da Comissão Federal de Comunicações (FCC) – responsável por regular o setor de comunicação dos EUA – para conceder e rescindir licenças de transmissão local.
Nas últimas semanas, a FCC abriu investigações sobre estações como a NPR e a PBS, duas grandes redes públicas de mídia.
Segundo a entidade, o órgão também está investigando a estação de rádio da Califórnia KCBS, por informar os ouvintes sobre onde os agentes do Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA estariam realizando batidas para deportação.
“Esses tipos de ações punitivas prejudicam a capacidade dos veículos de imprensa de fazerem seu trabalho de forma eficaz”, afirmou o CPJ ao condenar as brigas de Trump com a imprensa.
Fim do financiamento da imprensa independente
Outro motivo de preocupação da entidade é com o congelamento dos fundos da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID). Organizações independentes de notícias que eram auxiliadas pela agência serão prejudicadas.
Esses veículos – muitos sediados em países governados por regimes autoritários – enfrentam restrições, e sem a ajuda externa, não conseguem operar.
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Ataque direto aos veículos de comunicação
O Comitê de Proteção a Jornalistas chamou também atenção para os ataques pessoais dirigidos a jornalistas por líderes da atual administração dos EUA, o que inclui o presidente Donald Trump, advertindo que tal comportamento pode estimular ataques físicos e online contra eles.
Membros do alto escalão do governo americano já usaram linguagem depreciativa contra veículos como Voice of America, Radio Free Europe/Radio Free Liberty, entre outras.
Para o CPJ, esses veículos notícias fornecem uma defesa crítica contra a propaganda disseminada por governos não democráticos em todo o mundo.
” À medida que os EUA buscam perseguir a meta de Trump de ‘esperança, prosperidade, segurança e paz’, seria importante que a administração aceitasse, promovesse e protegesse uma imprensa pluralista e livre, conforme garantido pela Primeira Emenda da Constituição”.
A Primeira Emenda da Constituição dos EUA garante a liberdade de expressão, mas não protege discursos que incentivem ou justifiquem atos violentos.
Uma das poucas grandes redes de notícias dos EUA que Trump considera aliada é o canal conservador Fox News.
Diversos apresentadores da rede passaram a integrar a equipe de governo, e a nora do presidente estreará um programa no horário nobre.
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