Londres – Dois anos após o início da guerra civil no Sudão, em 15 de abril de 2023, a situação para os jornalistas no país é alarmante, de acordo com um novo relatório publicado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
O conflito entre o exército regular e as Forças de Apoio Rápido não apenas mergulhou o Sudão em uma profunda crise humanitária, mas também impôs um preço terrível à liberdade de imprensa.
A RSF documentou os abusos cometidos por ambos os lados do conflito: ao longo destes dois anos, pelo menos sete jornalistas perderam a vida em decorrência do seu trabalho, 17 foram detidos, dois seguem presos e um está desaparecido.
Jornalistas mortos: O lado mais trágico da guerra civil
O balanço revela a extensão da violência e da repressão enfrentada pela imprensa no país africano.
As vítimas fatais da guerra civil são todas de veículos locais: Issam Hassan Morjan e Sami Abd el-Hafidh, da Sudan National Broadcasting Corporation (SNBC); Halima Idris Salim, do canal Sudan Bukra; Ahmed Youssef Arabi, da Blue Nile Channel; Khaled Balel, do Conselho Supremo de Mídia e Cultura do Sudão; o jornalista investigativo Muawiya Abdel Razek; e o cinegrafista Hatem Maamoun.
Segundo a Repórteres Sem Fronteiras, estes assassinatos ocorreram principalmente perto da capital, Cartum, mas também em Darfur do Norte e no estado do Mar Vermelho.
A RSF atribuiu quatro destes crimes às Forças de Apoio Rápido e três a grupos armados não identificados.
Além das mortes, o jornalista da agência de notícias SUNA, Abdel Rahman Warab, permanece desaparecido desde junho de 2023, supostamente sequestrado em Cartum pelas FAR.
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Detenções Arbitrárias e Jornalistas Atrás das Grades no Sudão
O número de jornalistas detidos arbitrariamente nos dois anos de guerra civil no Sudão também é motivo de grande preocupação para a organização de liberdade de imprensa.
Desde o início do conflito, dezassete profissionais da mídia foram presos pelas FAR ou pelo exército regular.
Haitham Dafallah, crítico das FAR, foi detido por mais de dois meses entre janeiro e março de 2024. Sidig Dalaï também foi preso em maio de 2024.
O relatório aponta que as detenções afetaram jornalistas freelancers e funcionários de diversos veículos, incluindo a rede pública sudanesa SNBC, o canal Al-Jazeera, a estação egípcia Al-Ghad e o site libanês Tayyar.
Atualmente, dois jornalistas continuam detidos: Hassan Hamed, da Independent Arabia, preso pelas forças governamentais em 9 de outubro de 2023, e Mamoun Hassan Hamid, colaborador da mídia detido pelas FAR em janeiro de 2024.
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Intimidação, Assédio e a Crise em Darfur do Norte
Além da violência física e das prisões, os jornalistas sudaneses enfrentam outras formas de intimidação. Pelo menos quatro profissionais ficaram feridos, e cerca de quinze foram vítimas de campanhas de assédio cibernético.
Jornalistas estrangeiros também relataram ser constantemente monitorados pelo exército regular, de acordo com o levantamento da RSF.
A situação em Darfur do Norte é particularmente grave, com relatos de massacres contra civis, censura, vigilância e ameaças contra fontes. Muitos jornalistas foram forçados a fugir da região.
RSF pede pressão sobre os dois lados da guerra civil no Sudão
A RSF está apelando à comunidade internacional para que pressione ambos os lados do conflito a proteger os jornalistas e garantir sua capacidade de trabalhar de forma independente e segura em todo o país.
A organização também exige a libertação imediata de Hassan Hamed e Mamoun Hassan Hamid.
A falta de acesso e os abusos contra os jornalistas criaram uma “verdadeira dissonância entre a tragédia humanitária de dois anos de guerra no Sudão e a falta de cobertura da mídia”, como afirma Martin Roux, Chefe de Crises da RSF:
“No norte de Darfur, o acesso ao terreno é tão difícil que a mídia está lutando para confirmar o número de mortes após ataques a civis.
Ambos os lados são igualmente culpados de abusos contra profissionais da mídia, que foram recebidos com completa impunidade.”
Mohamed Chouaib, um jornalista que permanece em Darfur do Norte, afirmou: “é nosso dever como profissionais e humanos permanecer […] para informar o mundo e dar voz às vítimas sob cerco”.
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