A disputa entre política e imprensa pública nos EUA ganhou novo capítulo após uma importante decisão judicial favorável ao governo de Donald Trump em sua tentativa de fechar de vez a rede de notícias Voice of America (VoA).
O Tribunal de Apelações do Distrito de Columbia, que julga casos relativos ao governo federal, revogou neste sábado (3) uma decisão judicial anterior que obrigava a recontratação de funcionários da emissora, gerando incerteza sobre o futuro da empresa de mídia estatal americana.
A decisão partiu de um painel com três juízes, com maioria formada por Neomi Rao e Gregory Katsas, indicados pelo ex-presidente Donald Trump, que votaram contra a reintegração.
Por que a decisão judicial contrária a Trump foi revogada
O processo foi aberto no dia 21 de março por funcionários da VoA e por organizações como Repórteres Sem Fronteiras (RSF), American Federation of Government Employees (AFGE), American Foreign Service Association (AFSA) e o sindicato de jornalismo The Newsguild-CWA.
Na sentença anterior, de 22 de abril, o juiz Royce Lamberth, do Tribunal do Distrito de Columbia, havia determinado a reintegração de mais de 1,3 profissionais e a liberação temporária de verbas, sob o argumento de que a ordem de Trump contraria a Primeira Emenda da Constituição e que a missão da Voice of America de fornecer notícias precisas e objetivas globalmente é essencial para combater a desinformação e promover a liberdade de imprensa no mundo.
No entanto, o Tribunal de Apelações considerou que o juiz distrital original havia ultrapassado sua jurisdição ao intervir nas ações da Agência de Mídia Global dos EUA (USAGM).
A juíza Cornelia Pillard, indicada por Barack Obama, foi a única a discordar, destacando que a revogação compromete o papel informativo da VOA e prejudica outras emissoras como a Radio Free Europe/Radio Liberty, também financiadas pelo governo.
Kari Lake comemora vitória judicial do governo Trump contra Voice of America
Kari Lake, ex-candidata a governadora do Arizona e atual assessora sênior da USAGM, celebrou a decisão que revogou a sentença de 22 de abril.
Em publicação na rede X (ex-Twitter), ela declarou que a nova sentença foi uma “grande vitória para o presidente Trump e para o Artigo II da Constituição”.
Lake também criticou o juiz distrital que havia ordenado a recontratação, dizendo que ele “não poderá administrar a agência como parecia querer”.
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O papel estratégico da Voice of America
A Voice of America, fundada em 1942, é uma emissora pública voltada para audiências internacionais, especialmente em países onde a liberdade de imprensa é limitada.
Ao longo das décadas, se consolidou como fonte confiável de notícias globais, com mais de mil funcionários e noticiário em dezenas de idiomas.
Sob o governo Trump, no entanto, a VoA e outras emissoras associadas enfrentaram reestruturações administrativas. Em março, uma ordem executiva dissolveu a liderança da USAGM e promoveu mudanças profundas na gestão das redes estatais.
A decisão foi tomada no âmbito dos cortes de verbas realizados pelo departamento de eficiência governamental (DOGE, na sigla em inglês), liderado pelo bilionário Elon Musk.
Donald Trump justificou o ato como parte de um esforço para reduzir o que ele chamou de “propaganda antiamericana” financiada pelos contribuintes. Ele descreveu a VoA como a “Voz da América Radical”.
Elon Musk apoiou a decisão, chamando a Voice of America de “um grupo de pessoas radicais de esquerda queimando dinheiro dos contribuintes”.
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Futuro incerto para os funcionários e a agência
Com mais de mil profissionais ainda aguardando uma definição sobre seus empregos, a decisão judicial amplia a incerteza sobre o funcionamento da VoA e das demais emissoras públicas.
Especialistas alertam para o risco de politização da cobertura jornalística em um ambiente onde mudanças administrativas refletem diretamente na linha editorial.
Ao mesmo tempo em que tenta fechar as redes vistas como inimigas e investe contra empresas de mídia privadas, na semana passada a Casa Branca lançou um site chamado Wire, que agrega notícias favoráveis ao governo de Donald Trump.
O portal reúne matérias publicadas por veículos de direita e também inclui conteúdos produzidos pelo próprio governo.
Segundo um funcionário da Casa Branca, o objetivo do site é oferecer aos apoiadores de Trump um espaço centralizado para acessar e compartilhar notícias alinhadas à visão de sua administração.
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