A Austrália deu um passo ousado no debate global sobre redes sociais e infância: anunciou que crianças e adolescentes menores de 16 anos não poderão mais criar ou manter contas no YouTube a partir de dezembro de 2025. A medida é parte do Online Safety Amendment (Social Media Minimum Age) Act 2024.

Com isso, o país se torna o primeiro a impor esse tipo de restrição à plataforma de vídeos mais popular do mundo, enfrentando o gigante tecnológico Google. A decisão anunciada nesta quarta-feira (30) reacende um dilema: é possível, na prática, limitar o acesso de crianças a plataformas digitais?

O governo australiano diz que sim. Mas a polêmica está apenas começando.

YouTube não estava incluído na lei sobre acesso de crianças a redes na Austrália 

A Online Safety Amendment (Social Media Minimum Age) Act 2024 da Austrália determina que plataformas digitais devem impedir o acesso de menores de 16 anos a partir de 10 de dezembro, sob pena de multas que podem chegar a 49,5 milhões de dólares australianos.

Sem contas no YouTube, as crianças não poderão comentar, publicar vídeos ou receber recomendações personalizadas, embora possam assistir a conteúdos sem login. 

Inicialmente, o YouTube havia sido poupado por ser considerado uma plataforma com conteúdo educacional.

Mas essa visão mudou após um parecer da comissária de segurança online, Julie Inman Grant, que apontou o uso de algoritmos e recursos interativos como características típicas de redes sociais.

Segundo ela, 37% dos menores relataram ter visto conteúdos nocivos no YouTube — mais do que em qualquer outra plataforma.

“Os algoritmos de recomendação igualam o YouTube a qualquer outra rede social”, afirmou.

O departamento liderado por Grant será o responsável pela implementação e fiscalização do cumprimento da lei.

Ela assegurou que haverá monitoramento constante para verificar se a medida seja cumprida por parte das plataformas, que deverão criar mecanismos para impedir contas abertas por menores de 16 anos e remover as que já existam. 

Reino Unido segue mesmo caminho 

A nova legislação da Austrália desafia gigantes tecnológicas e levanta dúvidas sobre sua aplicação no mundo digital descentralizado.

Debate semelhante acontece no Reino Unido, onde há uma semana entrou em vigor a nova Lei de Proteção Online impondo restrições severas para acesso de menores a plataformas digitais, com destaque para sites de pornografia. 

Governo afirma que medida é para proteger crianças

A ministra dos Serviços Sociais da Austrália, Anika Wells, defendeu a proibição de contas de menores de 16 anos no YouTube com veemência:

“As redes sociais têm responsabilidades sociais, e não há lugar para algoritmos predatórios direcionados a crianças”.

Ela comparou o ambiente digital a “ensinar crianças a nadar no oceano aberto com ondas e tubarões”.

O primeiro-ministro Anthony Albanese também manifestou apoio:

“As mídias sociais estão prejudicando nossas crianças, e eu quero que os pais australianos saibam que os estamos apoiando”.

Ele reconheceu que a medida não resolve tudo, mas disse acreditar que ela fará diferença.

Google critica decisão e pais expressam preocupação

O Google, proprietário do YouTube, se posicionou contra a nova legislação, alegando que a plataforma tem valor educacional e oferece espaço para expressão criativa.

A empresa cogita recorrer à Suprema Corte da Austrália por entender que a lei fere a liberdade de comunicação política garantida pela Constituição.

Apesar das críticas, o governo assegura que o acesso a vídeos públicos continuará liberado, sem necessidade de login, e que o YouTube Kids permanecerá disponível por ser considerado seguro.

Serviços educacionais, jogos online e plataformas de saúde não serão afetados, segundo o governo. 

Restrição no YouTube inaugura novo capítulo regulatório

Com a nova legislação, a Austrália lança um experimento regulatório que poderá influenciar outras nações. 

Mas a eficácia da regra dependerá da capacidade técnica das plataformas de verificar idades e do apoio da sociedade, incluindo dos pais.

Uma pesquisa realizada em 2022 no Reino Unido a pedido do Ofcom, o órgão regulador de comunicações britânico, revelou as táticas usadas pelos menores de idade para burlar os controles de idade das plataformas – alguns contando com a ajuda dos próprios pais