- O que aconteceu: O uso das iniciativas de regulação digital em curso no Brasil como uma das justificativas para elevar as tarifas sobre produtos brasileiros exportados para os EUA foi duramente criticado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
- O documento oficial assinado pelo presidente Donald Trump determinando impostos de até 50% sobre produtos brasileiros refere-se aos esforços judiciais e legislativos do Brasil para responsabilizar as empresas de mídia social pela disseminação de desinformação em suas plataformas.
A Repórteres Sem Fronteiras (RSF) considera que a ordem executiva de Donald Trump, que associa tarifas comerciais dos EUA a medidas brasileiras de regulação digital, faz um uso distorcido da defesa da liberdade de expressão para proteger interesses da Big Techs.
RSF condena associação entre tarifas e regulação digital
O documento assinado por Donald Trump em 30 de julho cita diretamente decisões e propostas legislativas brasileiras voltadas à moderação de conteúdo nas redes sociais como justificativa para impor tarifas de até 50% sobre produtos do país.
Para a RSF, essa associação configura uma distorção grave do conceito de liberdade de expressão.
A organização afirma que “muitas dessas ‘violações’ referem-se aos esforços judiciais e legislativos do Brasil para responsabilizar as empresas de mídia social pela disseminação de desinformação em suas plataformas”.
Em nota oficial, a RSF classifica como “cínica e enganosa” a utilização da liberdade de expressão como argumento para medidas comerciais punitivas. Artur Romeu, diretor da RSF América Latina, afirmou:
“Usar a liberdade de expressão como pretexto para sanções comerciais é cínico e enganoso. A liberdade de expressão não desculpa a desinformação e não é um escudo para a influência corporativa.
O Brasil não deve recuar dos esforços regulatórios legítimos destinados a fortalecer o direito a informações confiáveis e proteger o debate democrático online.”
Brasil segue modelo internacional de regulação
A RSF destaca que as medidas brasileiras se alinham com os debates democráticos globais sobre regulação de plataformas, inspirando-se na Lei de Serviços Digitais (DSA) da União Europeia.
O objetivo é enfrentar o vácuo regulatório que tem permitido a circulação de conteúdos perigosos, deliberadamente falsos e prejudiciais ao debate público.
“A liberdade de expressão não significa que o discurso público deva ser livre de fatos”, afirma a organização.
Ao contrário do que sugere a ordem executiva, as iniciativas brasileiras buscam fomentar um ecossistema digital mais saudável, com responsabilização das plataformas e incentivo à circulação de informações confiáveis.
Pressão corporativa e lobby internacional
Um dia antes da emissão da ordem, em 29 de julho, o vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, participou de uma reunião com representantes da Meta, Google, Amazon e outras gigantes digitais, ao lado de William Kimmitt, subsecretário de Comércio dos EUA para Comércio Internacional.
Segundo a RSF, esse encontro evidencia como o governo dos EUA apoia o lobby corporativo da Big Tech em negociações bilaterais que envolvem tarifas, moderação de conteúdo e possíveis ajustes antitruste.
“Essa pressão corre o risco de atrasar ou enfraquecer o esforço democrático do Brasil para regular as plataformas digitais, o que é essencial para fomentar informações confiáveis e promover um espaço digital mais saudável.”
Sanções ao STF agravam tensão diplomática
No mesmo dia da ordem executiva, os EUA também anunciaram sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acusando-o de suprimir a liberdade de expressão por ordenar a remoção de conteúdo e suspensão de contas associadas à desinformação.
A RSF alerta que essa retórica não é nova: desde janeiro, a entidade vinha advertindo sobre a “armação” da liberdade de expressão pelo governo Trump, que agora se intensifica com medidas punitivas contra o Brasil.
“Iniciativas para combater a desinformação, o discurso de ódio e os danos online são essenciais para proteger o jornalismo e o debate democrático. Também é crucial que a sociedade civil esteja envolvida nas discussões regulatórias para evitar que a Big Tech dite as regras do jogo.”