Diversas organizações de direitos civis e liberdade de imprensa dos EUA e internacionais tentaram em vão impedir que o jornalista salvadorenho Mario Guevara fosse deportado dos EUA nesta sexta-feira (3), apesar de o último recurso possível da defesa ter sido recusado ontem.
A família confirmou que Guevara foi colocado em um voo rumo a El Salvador à 4h da manhã de hoje (horário local). Ele estava em um centro de detenção de imigrantes na Lousiania, para onde foi transferido depois que o processo chegou ao fim.
A deportação foi resultado de uma decisão judicial emitida em 18 de setembro pela Junta de Apelações de Imigração dos Estados Unidos, que ordenou sua remoção imediata para El Salvador três meses depois de ele ter sido preso enquanto cobria um protesto contra Donald Trump em Atlanta.
A tentativa de barrar a deportação ganhou força nas últimas semanas, com entidades como a ACLU (União Americana pelas Liberdades Civis), o Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) e o Projeto de Responsabilidade Governamental apresentando uma petição de emergência para suspender a ordem.
Elas alegavam que Guevara estava sendo alvo de retaliação por seu trabalho jornalístico, especialmente por cobrir operações policiais e migratórias que envolvem comunidades latinas. O jornalista ganhou um prêmio Emmy pelo seu trabalho.
Mas a Corte de Apelações do 11º Circuito dos EUA rejeitou na quinta-feira uma moção de emergência apresentada pelos advogados de Guevara para suspender a deportação.
Quem é Mario Guevara?
Mario Guevara é um jornalista investigativo que vivia nos Estados Unidos há mais de duas décadas e tinha visto de trabalho válido.
Natural de El Salvador, ele se estabeleceu em Atlanta, Geórgia, onde trabalhou como repórter cobrindo temas sensíveis como imigração, violência policial e ações do ICE (Serviço de Imigração e Controle de Aduanas).
Reconhecido por sua atuação em defesa das comunidades imigrantes, Guevara se tornou uma figura respeitada no jornalismo local, frequentemente expondo abusos cometidos por autoridades em operações migratórias.
Em 2024 ele fundou o canal independente MG News, que transmite principalmente pelo Facebook e pelo site noticiasmg.com. Sua página no Facebook tem mais de 700 mil seguidores.
Como e por que ele foi preso?
Mario Guevara foi preso em 14 de junho de 2025, enquanto cobria um protesto contra Donald Trump no condado de DeKalb, região metropolitana de Atlanta, junto com outros profissionais de imprensa.
Ele atuava como jornalista no local, usando colete com identificação de imprensa e transmitindo ao vivo pelas redes sociais, quando foi abordado por agentes e detido.
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As autoridades alegaram que ele estava envolvido em obstrução, reunião ilegal e uso indevido de via pública, entre outras infrações menores.
No entanto, todas as acusações foram posteriormente arquivadas por falta de provas. Mesmo assim, Guevara foi transferido para um centro de detenção do ICE, com base em um antigo processo de imigração reaberto após sua prisão.
A defesa e organizações de direitos civis afirmam que sua detenção foi uma forma de retaliação institucional, já que Guevara vinha publicando reportagens críticas sobre ações policiais e migratórias.
A prisão durante o exercício da atividade jornalística reforça a tese de que ele está sendo punido por seu trabalho.
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A mobilização para impedir a deportação
A petição de emergência apresentada por grupos como a ACLU e o CPJ argumenta que Guevara estava sendo punido por exercer seu direito constitucional à liberdade de expressão.
“Estamos diante de um caso emblemático de retaliação institucional contra um jornalista que ousou mostrar o que muitos preferem esconder”, afirmou um porta-voz da ACLU.
Além disso, há preocupações com a segurança de Guevara caso seja enviado de volta a El Salvador, país que enfrenta altos índices de violência e repressão contra jornalistas.
A defesa sustenta que ele corre risco de perseguição política e física, o que justificaria a suspensão da deportação com base em tratados internacionais de direitos humanos.
Família do jornalista devastada
“As palavras não podem começar a descrever a perda e a devastação que minha família sente. Estou em total choque e descrença de que o governo puniu meu pai por simplesmente fazer o trabalho de sua vida, o jornalismo”, disse Oscar Guevara, filho de Mario Guevara, à ACLU.
“Meu pai nunca deveria ter que enfrentar mais de 100 dias de detenção. Ele é o centro da nossa família. Ele é a razão pela qual nosso lar é um lar. Para mim, ele é minha rocha, e eu não sei como será a vida sem ele aqui agora que ele será deportado.
Oscar contou que teve um tumor cerebral em 2021, e contou com o pai para apoiá-lo nos primeiros passos da recuperação.
“Agora, terei que gerenciar meus cuidados de saúde por conta própria e viver a milhares de quilômetros de distância separado dele. Minha família foi dilacerada sem uma boa razão, e só posso esperar que um dia possamos nos reunir.”
Presidente de El Salvador é aliado de Donald Trump
O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, é amplamente visto como um aliado político de Donald Trump, com quem compartilha uma retórica nacionalista e uma postura dura contra o crime e a imigração.
Recentemente, o governo salvadorenho aprovou uma lei de “agentes estrangeiros”, considerada por organizações internacionais como draconiana e repressiva, que exige que indivíduos e instituições que recebam apoio financeiro do exterior se registrem como tais e enfrentem restrições severas.
A medida, inspirada no modelo russo, tem sido amplamente criticada por seu impacto direto sobre a liberdade de imprensa, já que muitos veículos independentes e ONGs dependem de financiamento internacional para operar.
Como resultado, diversos jornalistas e ativistas já deixaram o país, temendo perseguição, censura e represálias legais. O ambiente político atual em El Salvador levanta sérias preocupações sobre o destino de Mario Guevara em solo salvadorenho.
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