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Mesmo com acordo em Gaza, Trump perdeu o Nobel da Paz — mas pode vir forte em 2026

Donald Trump no parlamento de Israel

Presidente Trump assina livro de presença no Parlamento de Israel (foto: @POTUS)

O acordo de cessar-fogo em Gaza virou a bandeira de Donald Trump para ganhar o Prêmio Nobel da Paz. Ele se disse frustrado por não ter sido o escolhido pelo Comitê.

O vencedor foi anunciado — e não foi Donald Trump. O fato de o presidente americano não ter recebido o prêmio que tanto almejava provavelmente será a lembrança mais marcante do Prêmio Nobel da Paz de 2025.

O prêmio deste ano foi para María Corina Machado, líder da oposição da Venezuela. O Comitê Norueguês do Nobel concedeu a ela o prêmio “por seu incansável trabalho na promoção dos direitos democráticos do povo venezuelano e por sua luta por uma transição justa e pacífica da ditadura para a democracia”.

Os esforços de Machado são notáveis, e sua coragem pessoal merece reconhecimento. O que é menos claro é como sua escolha se encaixa nos critérios estabelecidos no testamento de Alfred Nobel.

Como é escolhido o vencedor do Nobel da Paz

Nobel determinou que o prêmio deveria ser concedido “à pessoa que tenha realizado o maior ou melhor trabalho pela fraternidade entre as nações, pela abolição ou redução dos exércitos permanentes e pela promoção de congressos de paz”.

É discutível se Machado se enquadra nesses critérios.

Na verdade, todo o processo em torno do Nobel da Paz de 2025 foi incomum, marcado por uma campanha pública a favor de um candidato específico.

O próprio Trump usou todas as oportunidades possíveis para se promover — inclusive em seu discurso na Assembleia-Geral da ONU em 23 de setembro, quando reiterou a alegação feita em agosto de ter “resolvido sete guerras”.

Essas afirmações foram amplamente questionadas — com razão. Cessar-fogos frágeis foram o máximo que ele conseguiu em alguns dos conflitos em que interveio.

Nobel da Paz: polêmicas e precedentes

Isso não necessariamente o desclassificaria — os critérios permitem premiar esforços, não apenas resultados.

Mas suas chances eram remotas, já que as indicações se encerram em 31 de janeiro, quando é elaborada uma lista restrita e começam as deliberações.

Nessa época, Trump havia desempenhado um papel em um cessar-fogo temporário na guerra em Gaza — mas a maioria de suas reivindicações ainda não havia se concretizado.

O prêmio já teve escolhas controversas no passado, como Henry Kissinger e Abiy Ahmed Ali.

Kissinger, polêmica no Nobel

Kissinger venceu em 1973 por encerrar a guerra do Vietnã, ao lado de Le Duc Tho, que recusou o prêmio. Mas, enquanto negociava a paz como secretário de Estado, Kissinger foi responsável por uma devastadora campanha de bombardeios no Camboja entre 1969 e 1973, entre outros episódios.

Abiy recebeu o prêmio em 2019 “por seus esforços para alcançar a paz e a cooperação internacional, especialmente pela iniciativa de resolver o conflito com a Eritreia”.

No entanto, isso não o impediu de liderar uma guerra civil brutal contra a Frente de Libertação do Povo Tigré, que custou centenas de milhares de vidas.

Nesse contexto, Trump parece um candidato menos problemático que Abiy ou Kissinger. Mas, comparado a outros presidentes americanos premiados, seu desempenho é mais frágil.

Theodore Roosevelt venceu em 1906 por mediar o fim da guerra russo-japonesa; Woodrow Wilson em 1919 por fundar a Liga das Nações; e Jimmy Carter em 2002 por décadas de promoção da democracia e dos direitos humanos. Em comparação, o histórico de Trump é bem menos consistente.

Trump: um histórico irregular

Embora mereça algum crédito por esforços e sucessos temporários, Trump está longe de ter um currículo de pacificador.

Seus oito meses de volta à Casa Branca, desde janeiro de 2025, dificilmente correspondem aos critérios definidos por Alfred Nobel.

Trump ameaçou anexar a Groenlândia e incorporar o Canadá como o 51º estado americano, uniu-se a Israel em bombardeios contra o Irã durante a chamada “guerra de 12 dias” e conduziu uma campanha aérea letal contra supostos traficantes venezuelanos.

Essa mistura de pacificação e beligerância o distingue de Barack Obama, que venceu em 2009 “por seus esforços para fortalecer a diplomacia internacional e a cooperação entre os povos” — uma decisão polêmica à época, por ser mais aspiracional do que baseada em realizações concretas.

Talvez o melhor resultado do Nobel da Paz de 2025 — e do fato de Trump não ter vencido — seja o incentivo para que ele redobre seus esforços como mediador.

O presidente já afirmou ter encerrado sete guerras e pode conquistar outro êxito com o acordo de cessar-fogo em Gaza.

Se quiser permanecer na disputa pelo prêmio de 2026, Trump não pode permitir que suas alegações grandiosas sejam desmentidas. Se conseguir evitar que esses conflitos voltem a explodir, terá prestado um serviço à paz — independentemente de suas motivações.


Este artigo foi publicado originalmente no portal acadêmico The Conversation e é republicado aqui sob licença Creative Commons.

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