Em resumo
- País governado por uma junta militar desde 2021, Mianmar ocupa o 169º lugar no Índice Global de Liberdade de Imprensa da RSF.
- Regime anunciou medidas para permitir a cobertura das próximas eleições, rotuladas de ‘táticas para legitimar novas restrições’.
A Repórteres Sem Fronteiras instou o governo de Mianmar a não apenas permitir a cobertura liver das eleições, mas também libertar mais de 50 jornalistas que seguem presos no país.
O regime militar de Mianmar, um dos países que mais reprime a imprensa no mundo, anunciou que a mídia local será “autorizada” a cobrir as eleições gerais programadas para ocorrer entre dezembro de 2025 e janeiro de 2026.
Por trás dessa reforma, supostamente uma medida de abertura, a junta está de fato preparando as condições para controlar a cobertura de uma votação que já começou a bloquear, denuncia a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
“O anúncio da junta — um regime considerado um dos Predadores da Liberdade de Imprensa de 2025 — de que veículos locais e estrangeiros serão autorizados a cobrir as eleições vem com condições restritas, já que as autoridades militares especificaram que o credenciamento oficial deve ser obtido”, aponta a entidade.
Restrições para imprensa cobrir as eleições em Mianmar
Em julho de 2025, a junta militar que governa o país desde 2021 adotou uma lei sobre interferência eleitoral que prevê pesadas sentenças de prisão para qualquer pessoa que divulgue informações destinadas a “destruir uma parte do processo eleitoral”, sem especificar o que isso representa na prática.
De acordo com a RSF, o secretário do Conselho de Imprensa Independente de Mianmar (IPCM), Toe Zaw Latt, denunciou a lei como um texto projetado para “intimidar jornalistas, para torná-los com medo de criticar ou fazer reportagens livremente”.
As eleições planejadas pela junta militar foram descritas como uma “fraude” pelo Relator Especial da ONU, Tom Andrews, e por vários especialistas internacionais, que citam a falta de independência no processo eleitoral e a contínua repressão da oposição, destacou a RSF.
Para Cédric Alviani, diretor da RSF na região Ásia-Pacífico, “ao fingir permitir a cobertura da mídia enquanto reprime jornalistas por mais de quatro anos, a junta de Mianmar está expondo a profundidade de sua hipocrisia”.
“Ninguém se engane: esta medida é simplesmente uma tática para legitimar novas restrições.
Se a junta realmente deseja mostrar até mesmo uma aparência de mudança positiva, deve libertar imediatamente os 51 jornalistas detidos, abrir verdadeiramente o país à mídia internacional e encerrar sua política de controle sistemático sobre a imprensa.”
Jornalismo independente praticamente desapareceu em Mianmar
Mianmar ocupa o 169º lugar entre 180 países e territórios no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da RSF de 2025. O país é o segundo maior carcereiro de jornalistas do mundo, logo atrás da China.
Desde o golpe de fevereiro de 2021, o jornalismo independente quase desapareceu de Mianmar sob a violenta repressão do regime, em uma situação dramática descrita pela RSF e documentada por diversas organizações internacionais.
- Mais de 200 jornalistas foram presos, pelo menos 51 dos quais permanecem atrás das grades até hoje.
- Os que tentaram expor a repressão do regime foram sistematicamente torturados – espancados, submetidos a violência sexual e privados de sono e alimentação.
- Sete jornalistas e defensores da liberdade de imprensa foram executados.
- Cerca de 60 meios de comunicação foram forçados ao exílio, principalmente para a Tailândia, de acordo com números da RSF.
- As licenças de 15 meios de comunicação foram revogadas arbitrariamente, forçando suas equipes a trabalhar no subsolo devido ao aumento dos riscos de segurança.
- A maioria da mídia estrangeira também se retirou do país: a Agence France-Presse (AFP) é agora a única agência de notícias internacional com um escritório em Mianmar.
- As paralisações da Internet impedem os jornalistas de trabalharem ou se comunicarem, criando “buracos negros de informação” em certas regiões.
Em resposta à repressão, a RSF tem fornecido assistência de emergência a mais de 350 jornalistas por meio do Projeto de Liberdade de Imprensa de Mianmar – uma iniciativa que apoia jornalistas exilados do país (estimados em cerca de 300 somente na Tailândia) e aqueles que ainda trabalham clandestinamente no território.
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