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Quanto mais rico e democrático o país, menor o engajamento da população com o ativismo climático, diz estudo

Manifestante pedindo compromissos por mais recursos para ação climática durante a COP29 em Baku

Manifestação na COP29 por mais recursos para financiar ação climática (Foto: UN Climate Change - Kamran Guliyev)

Estudo feito por pesquisadores da Universidade Queensland, na Austrália analisando um amplo conjunto de indicadores econômicos, políticos e sociais, constatou que a solidez econômica e democrática de uma nação não está relacionada a uma maior participação cidadã no combate à mudança climática.

Pessoas que vivem em países mais ricos e democráticos, com acesso facilitado a informações confiáveis sobre a crise da mudança climática, tema da COP30 em Belém, tenderiam a ser mais engajadas no ativismo climático – mas o que acontece na prática é justamente o oposto.

É o que revela um estudo publicado no Journal of Environmental Psychology, com dados de quase 90 países e análises que desafiam suposições comuns sobre mobilização ambiental.

O trabalho foi liderado pelos pesquisadores Matthew Hornsey e Angela Pearson, da Universidade de Queensland, na Austrália.

A pesquisa mostra que os habitantes de países menos favorecidos e menos democráticos apresentam maior disposição para agir — e destaca o papel crucial das vozes marginalizadas na linha de frente da mudança climática.

Democracia e ativismo climático: uma relação inversa

Para compreender por que a disposição para participar de ações climáticas varia tanto entre diferentes nações, os pesquisadores analisaram um amplo conjunto de dados que incluiu indicadores sociais, econômicos e políticos de 88 países.

Os dados foram coletados do banco de dados do Climate Change Opinion Survey, conduzido pelo Yale Program on Climate Change Communication em parceria com a Meta (Facebook), que reúne informações de 185 mil participantes de 111 países.

A pesquisa encontrou uma correlação negativa entre o nível de riqueza e democracia de um país e o envolvimento de sua população com o ativismo climático.

Em vez de promover maior mobilização, ambientes mais ricos e democráticos parecem, em média, reduzir a probabilidade de engajamento direto.

Os pesquisadores sugerem que isso pode ser explicado pela distância maior dos efeitos do clima, ou interesses econômicos que travam medidas de combate ao aquecimento global, como limitação ao desmatamento e redução do uso de combustíveis fósseis.

Segundo os autores, esse dado desafia a expectativa de que democracias mais abertas incentivariam a participação cidadã em causas ambientais.

Em contraste, os países com classificações mais baixas em índices de democracia mostraram populações mais ativas na causa climática, embora em alguns  deles a repressão a protestos possa desestimular essa participação.

Riqueza e ativismo climático: hipótese da precariedade

O estudo não encontrou relação significativa entre os níveis de emissões de CO2 per capita e o engajamento em ativismo climático. Tampouco houve correlação direta entre o ativismo e a vulnerabilidade climática, medida por índices de risco.

Isso reforça a ideia de que os fatores estruturais da sociedade e a percepção de risco – e não apenas o efeito direto de eventos climáticos ocorridos no local – têm peso maior na disposição para agir do que apenas impactos ambientais imediatos.

Os autores propõem a “hipótese da precariedade” como explicação: a insegurança material constante em países mais pobres aumenta a percepção de risco climático, o que pode motivar maior engajamento na ação climática coletiva.

Os autores também testaram se os resultados se manteriam consistentes ao considerar apenas intenções de engajamento, excluindo os participantes que já estavam envolvidos em campanhas. Os padrões se mantiveram parecidos.

Quando a preocupação vira ação nas democracias ricas

Apesar da tendência geral de menor engajamento, o estudo aponta uma nuance importante: quando a preocupação com o clima está presente em países ricos e democráticos, ela tem maior chance de se traduzir em ações concretas.

Isso sugere que o contexto socioeconômico e político pode moderar o efeito da preocupação individual, tornando-a um estímulo mais forte ao comportamento ativista nessas regiões.

Nesse ponto, o Brasil se destaca em uma outra pesquisa também publicada recentemente: é um dos países onde a população está mais consciente da relação entre eventos climáticos extremos e as mudanças climáticas, a chamada “atribuição”.

Vozes marginalizadas no ativismo climático global

O estudo também sublinha o protagonismo das populações marginalizadas, frequentemente vistas apenas como vítimas da crise climática.

Os autores ressaltam que essas comunidades têm desempenhado um papel fundamental como catalisadoras da mobilização ambiental global. Essa perspectiva desafia visões paternalistas e amplia a compreensão sobre quem são os verdadeiros agentes da mudança.

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