Londres – Embora os três primeiros episódios da série Harry & Meghan da Netflix, exibidos na quinta-feira (9), não contivessem ataques diretos a integrantes da família real como muitos temiam, a imprensa britânica reagiu com fúria, o que em parte se explica por ter sido a mídia a mais atacada no programa, sobretudo os tabloides.
No documentário apresentado como uma história de amor contada por eles próprios e ilustrada com cenas inéditas cedidas para o programa, Harry e Meghan falam do racismo inconsciente que existe na realeza e do passado escravocrata, chegando a mostrar uma ilustração sobre o papel da monarquia no tráfico de escravos.
Mas eles não citaram qualquer situação de racismo deliberado contra Meghan, como fizeram na entrevista à apresentadora americana Oprah Winfrey em 2021. Já a imprensa foi alvo direto de críticas de racismo, além de ser demonizada pela intrusão.
Série Harry e Meghan não agradou aos tabloides
A resposta apareceu nas primeiras páginas desta sexta-feira. Os jornais tabloides foram os mais agressivos, alguns endossando um movimento para que Harry e Meghan percam os títulos de duque e duquesa de Sussex.
Eles seguem usando os títulos apesar de todas as críticas ao sistema com o qual romperam em 2020 ao se mudarem para os EUA, no que ficou conhecido como Megxit, referência ao Brexit.
Para o Daily Mail, o Palácio viu o programa como um “ataque ao legado da rainha” e “tentativa de derrubar a monarquia”. Fontes ouvidas pelo jornal, corroborando a crítica feita por Harry e Meghan sobre o relacionamento próximo entre o Palácio de Buckingham e os chamados correspondentes reais, recriminaram a alusão ao Império 2.0 feita pelos Sussex.
O jornal escala seus melhores colunistas reais na capa, comentando o programa. O Daily Mail pertence a um conglomerado de mídia comandado por Jonathan Harmsworth, o 4º Visconde de Rothermere, herdeiro de uma dinastia de nobres que fundou a publicação em 1896, no auge do Império Britânico.
O Daily Express igualmente demonstrou sua proximidade com as fontes do Palácio de Buckingham. “A realeza está ‘profundamente chateada’ com as calúnias de Harry”, diz a manchete, completando: .“O príncipe Harry disparou uma nova salva de tiros em sua guerra contra a monarquia”.
Fiel ao estilo, o jornal ilustrou a capa com uma foto do rei Charles com fisionomia triste, que obviamente não foi feita após o programa.
E se referiu, como vários outros, ao curto período transcorrido desde a morte da rainha Elizabeth II e à crise do custo de vida que assola o país – e que até onde se sabe a monarquia oficial não está fazendo nada de concreto para atenuar.
O The Sun usou em sua manchete a frase “Harry the Nasty” (Harry, o desagradável”), uma referência à capa do jornal que noticiou o príncipe Harry usando um uniforme nazista em uma festa à fantasia, cujo título era “Harry the Nazi”.
O jornal afirma que o príncipe William se sente “traído” pela decisão de Harry de permitir críticas a seu irmão e à esposa Kate.
No programa, Meghan contextualiza as diferenças entre seu estilo americano e os rigores da monarquia, contando ter recebido William e Kate para jantar usando um jeans rasgado e descalça, e dado um abraço neles, o que segundo ela não faz parte dos costumes locais. Mas ela não menciona objetivamente uma reação negativa dos dois ao abraço ou ao seu traje.
O The Times, que pertence ao mesmo grupo editorial do The Sun (de propriedade do magnata da mídia Rupert Murdoch), se concentrou em uma das controvérsias em torno do documentário: se o Palácio de Buckingham teria sido abordado para comentar a série antes de ir ao ar, como está nos créditos iniciais da série da Netflix.
Assim como outros, o jornal cita uma fonte do Palácio, que confirmou o recebimento uma abordagem de uma produtora independente, não respondida porque supostamente a autenticidade do pedido não pôde ser verificada.
A capa chama o seriado de “novela dos Sussexes”.
Outro grande jornal, o Daily Telegraph, conservador e monarquista, ateve-se a uma suposta ofensa à memória da rainha. O seriado Harry e Meghan da Netflix foi classificado como “ataque direto ao legado da falecida rainha”.
O texto abaixo do título principal aponta o programa como “profundamente ofensivo” por tachar a Commonwealth (Comunidade Britânica das Nações) como “Império 2.0”. E em um texto assinado pela editora assistente Camilla Tominey, a série foi chamada de “desavergonhada história de um lado só, cheia de meias-verdades”.
Já o Guardian, que não morre de amores pela monarquia e não tende a embarcar na defesa apaixonada feita por outros jornais do país, deu três estrelas à série, considerada pela crítica de TV Lucy Mangan “um frenesi renovado, mas a história permanece a mesma”. Ela diz que para a família real pode ser doloroso, mas “para o restante de nós é apenas entretenimento”.
O jornal Metro, distribuído gratuitamente no transporte público, destaca a fala do príncipe Harry de que os membros da família real não se casam por amor e sim por conveniência. O jornal sugere que seria uma referência ao pai, o rei Charles, e ao irmão, William.
É fato que o rei não casou por amor com a mãe de Harry, a princesa Diana. Mas ele acabou se casando com sua grande paixão, a agora rainha consorte Camilla. E William teve um longo romance com Kate Middleton antes do casamento, sem sugestões de que seria um arranjo de conveniência.
No entanto, a alusão foi tomada como ofensa também ao irmão, seguindo o roteiro da fúria da mídia britânica com o seriado da Netflix.
Os três episódios finais da série Harry & Meghan serão exibidos pela Netflix no dia 15 de dezembro.
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