Londres – O ex-soldado Ben Roberts-Smith, o mais condecorado veterano o de guerra vivo da Austrália e uma celebridade no país, foi derrotado nesta quinta-feira(1) em um processo de difamação movido contra três jornais australianos e jornalistas que denunciaram crimes de guerra no Afeganistão. 

As reportagens foram publicadas em 2018 pelo The Sydney Morning Herald, The Age e The Canberra Times, acusando o ex-soldado das forças especiais de uso da força contra afegãos desarmados, de forma “insensível e desumana”, segundo a sentença do juiz federal Anthony Besanko. 

O resultado desfavorável a Roberts-Smith, isentando os jornais e os jornalistas Nick McKienze, Chris Masters e David Wroe de culpa, foi saudado como uma vitória da liberdade de imprensa. 

Crimes de guerra imputados a um herói nacional

Aos 44 anos, Roberts-Smith recebeu as maiores condecorações militares do país, incluindo, incluindo a Victoria Cross, por suas ações durante seis missões no Afeganistão. Ele foi um dos convidados para os funerais da rainha Elizabeth II, em 2022. 

Ao deixar as forças armadas, iniciou uma carreira como palestrante e executivo de executivo de uma rede regional de mídia, atividades que a derrota judicial deve afetar.

O processo de difamação pedia reparação por reportagens sobre o Afeganistão e também sobre bullying e violência doméstica. 

Mas os atos no Afeganistão são os mais graves. As reportagens revelaram que o ex-soldado teve participação direta no assassinato ilegal de seis afegãos.

Com base em depoimentos de outros soldados que presenciaram os atos, os jornais afirmaram que Roberts-Smith matou a tiros um adolescente afegão desarmado e chutou um homem algemado de cima de um penhasco, ordenando depois que fosse morto a tiros.

Os jornais também relataram que ele pressionou um soldado australiano de patente inferior a executar um afegão idoso e desarmado para “dar sangue ao novato”.

Outro caso foi o da morte de um afegão que tinha uma perna protética. Segundo o juiz, o ex-soldado foi “tão insensível e desumano que levou a perna protética de volta para a Austrália e encorajou seus soldados a usá-la como caneca para beber cerveja”. 

O que pode acontecer com o ex-soldado 

O veredito não tem implicações criminais, pois é resultado de uma ação de difamação movida pelos jornais. O autor pedia uma indenização de valor não revelado, mas deve ter que arcar com custas judiciais. 

Robert-Smiths não compareceu ao tribunal para o julgamento. Ele se defendeu afirmando que os fatos eram fantasiosos e as testemunhas ouvidas pelos jornais eram soldados fracassados invejosos do seu sucesso. 

Para fundamentar o pedido de reparação, o advogado do ex-soldado citou a perda de uma suposta oferta de sociedade em uma grande empresa de consultoria empresarial e de 475 mil dólares australianos em palestras como resultado das denúncias.

Seu advogado, Arthur Moses, disse à imprensa local que examinará a possibilidade de recurso.  

Por motivo de segurança nacional, a exposição de motivos pra a sentença que confirmou a veracidade dos crimes de guerra atribuídos ao ex-soldado só será publicada na próxima semana. 

Nas redes sociais, as opiniões se dividiram, com muitos usuários apoiando o ex-soldado e relativizando os atos cometidos na guerra do Afeganistão. 

James Chessell, editor-chefe do grupo Nine, dono do The Sydney Morning Herald e do The Age, descreveu o veredicto como “uma vitória para os bravos soldados que serviram seu país com distinção e tiveram a coragem de falar a verdade sobre o que aconteceu”.

Processos de difamação se tornaram instrumento de governos ou indivíduos insatisfeitos com cobertura de imprensa negativa, como fez o ex-soldado incomodado com as revelações de crimes praticados na guerra. 

Mesmo quando terminam em derrota para os autores, causam desgaste e têm o poder de desestimular o jornalismo crítico.