Londres – A entrada do Zoológico de Londres, junto ao Regent’s Park, foi o local escolhido pelo misterioso artista Banksy para o último mural de uma série retratando animais nas ruas da capital britânica, depois de encantar o público com uma nova obra por dia desde 5 de agosto.
O painel que apareceu na manhã de terça-feira (13) mostra um gorila levantando a porta metálica que serve de fundo para o trabalho, permitindo que vários pássaros escapem. Os olhos de outros animais podem ser vistos espreitando na escuridão, parcendo aguardar o momento de sair.
Como sempre tem feito desde o dia 5 de agosto, quando os animais começaram a aparecer em vários pontos de Londres, Banksy assumiu a autoria do novo trabalho postando uma foto em sua conta no Instagram sem qualquer comentário, deixando que o público tente adivinhar o significado.
No sábado, citando uma fonte autorizada, o jornal The Guardian disse que o objetivo era alegrar o público depois dos protestos violentos da extrema direita no país.
Mas em se tratando de Bansky, que usa sua arte como forma de ativismo social e político, é difícil acreditar que a imagem de liberdade de animais não tenha um sentido além da diversão, já que proteção animal é uma de suas bandeiras.
Novo Banksy no Zoo é o nono em uma semana em Londres
Na segunda-feira (13) um rinoceronte foi pintado em uma parede de Charlton, interagindo com um automóvel adornado com um cone de trânsito no capô que fez lembrar uma fêmea da espécie. Poucas horas depois a obra foi vandalizada.
No domingo (11), o “Banksy do dia” havia aparecido no centro de Londres: um cardume de peixes nas paredes envidraçadas de uma cabine policial, com um guarda fotografando a cena e uma placa ao fundo onde se lê: “se você pode ver [essa placa], nós podemos ver você”.
Seira uma uma crítica à vigilância, ou reconhecimento do trabalho da polícia para conter os manifestantes de extrema direita? A pergunta ainda não teve resposta, assim como a principal delas: quem é Banksy?
Afinal, quem é Bansky?
Ele seria britânico, nascido em Bristol, no final dos anos 1970 ou início dos anos 1980. Bristol é uma cidade multicultural e conhecida por seu ativismo e sua arte de rua.
Ali ele começou a desenhar murais, que frequentemente contêm mensagens políticas, sociais e contra o sistema.
Como muitos que praticam a street art ele usa a técnica de estêncil, uma espécie de molde para os desenhos, que permite fazer a obra rapidamente, evitando que o autor seja visto ou capturado por interferir em espaços privados ou públicos.
Ele nunca confirmou a identidade oficialmente, mas supostamente seu nome poderia ser Robert Banks.Em uma entrevista recém-descoberta para uma rádio, em 2023, ele foi perguntado sobre este nome, e respondeu apenas que se chamava “Robbie”.
Outra tese aceita é que ele se chamaria Robin Gunningham, coerente com o apelido Robbie. Ou ainda o músico Robert Del Naja, do grupo Massive Attack.
Há versões também de que ele não seria um, mas vários artistas sob o mesmo nome. Certamente ele trabalha com ajudantes, mas a tese de que não há um Banksy por trás de tudo não é muito aceita.
Impacto do artista vai além do mistério
O mistério sobre quem é Banksy é uma curiosidade, mas o valor do seu trabalho reside nos temas que aborda, como capitalismo, consumismo, guerra, liberdade, e direitos dos animais.
Ele faz também performances e instalações. A mais recente delas foi durante o festival de música de Glastonbury, realizado no auge da campanha eleitoral, em que o tratamento a imigrantes que cruzam o canal da Mancha em pequenos barcos era um dos temas mais polêmicos.
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Banksy inovou na arte e inscreveu nome na cultura pop
Os adversários das teses defendidas por Banksy em suas obras costumam questionar seu valor artístico, mas o mercado e críticos independentes são unânimes em reconhecer seu trabalho.
No domingo, o respeitado crítico de arte britânico Will Gompertz escreveu um artigo no jornal The Times a propósito da série de animais espalhados por Londres e afirmou:
“Banksy não faz apenas autopromoção— ele é um dos nossos grandes artistas”.
Algumas de suas obras têm um impacto significativo na cultura pop e na arte contemporânea. Em 2018, por exemplo, uma de suas pinturas, “Girl with Balloon”, foi parcialmente destruída em um leilão logo após ser vendida por mais de um milhão de libras.
Um dispositivo oculto na moldura da pintura a fragmentou em tiras logo após o martelo bater, o que foi interpretado como uma crítica ao mercado de arte.
No sábado Banksy instalou um gato se alongando, estampado na estrutura de um outdoor desocupado junto a um galpão abandonado em Cricklewood, noroeste de Londres. Mas horas depois ele foi removido pelos donos da estrutura, sob vaias do público, e supostamente seria levado para uma galeria.
Animais: alegria e mensagens políticas
Algumas especulações haviam associado o tema das novas obras de animais em Londres com o conceito de ‘selvageria’, embora alguns animais retratados sejam bem pacíficos, até que o objetivo de alegrar o público foi revelado.
Mas olhando a obra de Banksy, não se pode descartar que a representação de bichos também queira transmitir alguma coisa, como ele fez ao longo de sua trajetória.
- Ratos são um dos temas mais recorrentes na obra de Banksy. Ele os usa como símbolo dos marginalizados, dos excluídos e como metáfora para os seres humanos que lutam contra o sistema. Um exemplo famoso é o rato segurando uma placa dizendo “Why?”, que apareceu em várias partes de Londres. Os ratos de Banksy são vistos como uma crítica ao controle e à vigilância estatal, e uma representação daqueles que operam nas sombras, sem serem notados, mas que têm um impacto significativo.
- Chimpanzés aparecem em suas obras para satirizar o comportamento humano e criticar o poder e a autoridade. Em uma obra famosa, “Laugh Now”, um chimpanzé aparece com uma placa que diz “Laugh now, but one day we’ll be in charge” (“Ria agora, mas um dia estaremos no comando”), sugerindo uma revolta dos oprimidos.
- Pombos na arte de Banksy são interpretados como simbolismo de resistência ou para denunciar racismo e xenofobia. Uma instalação famosa mostra pombos segurando placas com mensagens anti-imigração, criticando o preconceito contra imigrantes e minorias.
Para o crítico Will Gompertz, o trabalho de Banksy vai “ecoar através dos tempos”.
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