Londres – A COP29 em Baku não foi a primeira a se prolongar além da data prevista para o encerramento, nem a única cujo acordo final desagradou. Mas entra para a história pela reação dos países mais afetados pelas mudanças climáticas, que na plenária final constrangeram o presidente da cúpula, Mukhtar Babayev.
Atrasada 33 horas e realizada na madrugada de domingo (24) no Azerbaijão, a sessão deveria ser o palco para celebrar o sucesso da conferência.
No entanto, chegou ao fim com gosto amargo para Babayev, desafiado por representantes de países que rejeitaram o texto final, longe do financiamento almejado para a adaptação climática.
A principal intervenção foi a da negociadora da Índia, Chandni Raina, furiosa com o compromisso de US$ 300 bilhões por ano até 2035 assumido para apoiar os mais afetados pelo aquecimento global, quando o desejado era US$ 1,3 trilhão.
Ficou para o setor privado completar o que falta, na forma de investimentos, mas não foram definidas métricas ou regras.
Ela chamou o documento de “ilusão de ótica”, classificou-o como inaceitável e pediu que fosse registrada a objeção da Índia. Bolívia, Cuba e Nigéria endossaram suas palavras.
A representante do país africano arrematou: “é uma piada”.
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Países insatisfeitos deixaram a sala onde o acordo da COP29 era negociado
O drama tinha começado mais cedo, quando grupos de países insulares e de nações africanas deixaram a mesa de negociação.
Eles acabaram voltando e o texto foi fechado, mas os abraços protocolares quando a aprovação foi anunciada não refletem o que aconteceu em Baku: a divisão cada vez maior entre ricos e pobres sobre quem paga a conta das mudanças climáticas.
A COP29 deixou evidente que não é realista esperar paciência dos países mais afetados, que recusam a ideia de que ajuda financeira é “caridade”.
A imprensa internacional dedicou amplos espaços à decepção com o acordo e à reação de nações insatisfeitas, um tema que deve pautar a mídia e a diplomacia daqui por diante.
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A herança da COP29 para Belém
E daqui por diante tem Belém.
Os acontecimentos em Baku deixam a COP30 no Brasil com um peso ainda maior, o de tentar desatar o nó que o Azerbaijão não conseguiu – ou não quis, na visão de críticos.
O presidente do país, Ilham Aliyev, fez em seu pronunciamento uma declaração de amor aos combustíveis fósseis, classificando-os como “dádiva de Deus”.
O Brasil não fez feio como na COP28, em que ganhou o “Fóssil do Dia”, em “reconhecimento” à entrada do país como membro observador da OPEP e ao leilão de áreas de exploração em locais ambientalmente sensíveis, apelidado pelos críticos de “leilão do fim do mundo”.
A Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, transitou pelas reuniões principais, teve destaque na imprensa internacional e fez alianças. Adotou um discurso diplomático, sem deixar de ser assertiva. Ela sabe o que tem pela frente.
A responsabilidade do Brasil foi destacada por Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, que espera que a COP30 possa preencher as lacunas deixadas pela conferência de Baku:
“A presidência da COP29 foi desastrosa, perdendo apenas para o conteúdo do texto aprovado, absolutamente insuficiente para qualquer solução da crise climática.
O desfecho escancara que os países ricos fogem de qualquer responsabilidade, além de deixar aberta a conta do financiamento.
A COP30, sob a liderança do Brasil, terá que ser muito competente para preencher as lacunas, promover o avanço de ambição e manter o objetivo de 1,5ºC vivo.”
Em entrevista coletiva no último dia da cúpula em Baku, Marina Silva demonstrou ter plena consciência do desafio.
Fez um discurso conciliador, usando a metáfora das mulheres fiandeiras da floresta para clamar por união e diálogo, e disse que Belém será ‘a COP das COPs”.
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Este artigo faz parte da edição especial MediaTalks COP29. Leia aqui a revista completa.