Milhares de jovens ativistas em todo o mundo marcharam no dia 19 de março  e farão greves pela ação climática como parte do Fridays for Future, movimento lançado por Greta Thunberg e outros organizadores. Os eventos são planejados em cinco continentes. O tema: #NoMoreEmptyPromises.

“Os que estão no poder continuam a entregar promessas vagas e vazias para datas longínquas que são muito tarde”, diz o comunicado da Fridays For Future. “O que precisamos não são metas sem sentido para 2050, cheias de lacunas, mas ações concretas e imediatas alinhadas com a ciência”.

Dilema desconfortável

Para alguns jornalistas, cobrir o ativismo apresenta um dilema desconfortável. Muita cobertura pode soar como torcida ou fazer os jornalistas parecerem ativistas, contradizendo noções de neutralidade. O trabalho de um repórter é cobrir as notícias, diz o argumento, não impulsionar um lado ou outro.

É justo. Mas os ativistas são criadores de notícias − assim como os políticos, cientistas e funcionários de corporações que cobrimos o tempo todo.

Jovens forçaram a discussão da questão ambiental

Grupos liderados por jovens mudaram a política climática global nos últimos dois anos e injetaram uma ênfase muito necessária no tema da justiça ambiental. Seja repreendendo as elites econômicas em Davos por seu esquecimento, como Thunberg fez, ou ocupando o escritório do Capitólio da presidente da Câmara dos Estados Unidos, como os ativistas do Movimento Sunrise fizeram para exigir que os democratas falassem sobre a mudança climática. Os jovens ativistas forçaram a discussão do clima pelos governos e, sim, as pautas da mídia em todo o mundo.

Durante a campanha presidencial de 2020 nos Estados Unidos a pressão dos jovens ativistas forçou o então candidato Joe Biden a fortalecer dramaticamente suas propostas climáticas, ao mesmo tempo em que ajudou a colocar a mudança climática entre os principais temas em debate. Grupos de ativistas liderados por jovens, entre eles o Sunrise, mobilizaram um grande número de novos eleitores, inclusive na Geórgia e em outros estados indecisos, que ajudaram os democratas a eleger Biden e a ganhar o domínio do Senado dos Estados Unidos. Agora, com Biden na Casa Branca, os ativistas continuarão a pressioná-lo a cumprir sua promessa de tratar as mudanças climáticas como uma “crise existencial” – assim classificada por ele, com razão.

Em suma, os ativistas do clima são uma força política poderosa. Cobri-los não é um ato de favoritismo da imprensa, mas simplesmente uma questão de contar com precisão a história do clima.

Na verdade, pode-se argumentar que os ativistas estiveram à frente dos jornalistas nessa questão. A cobertura da mídia sobre a crise climática há muito ficou para trás dos avisos de cientistas e outros especialistas. Especialmente nos Estados Unidos, onde a cobertura era esporádica, na melhor das hipóteses, e muitas vezes caía na mera apresentação de argumentos de ambos os lados, retratando criminosos e cientistas como igualmente confiáveis.

A melhoria da cobertura de notícias acompanhou o surgimento do movimento jovem pelo clima: de acordo com uma análise de 2020 feita pela Media Matters for America, a manifestação de ativismo climático em 2019 – especialmente a greve global de jovens em setembro daquele ano, liderada por Thunberg e envolvendo cerca de 6 milhões de pessoas − foi o que finalmente tirou a mídia de seu silêncio climático coletivo. Em outras palavras, apesar da riqueza de evidências que estabeleciam as mudanças climáticas como uma questão de enorme importância global, muitas organizações de notícias ainda precisavam ser tiradas das trevas.

Com a abordagem realista reinstalada na Casa Branca, começou uma nova era de possibilidades na questão do clima.

É mais importante do que nunca que os jornalistas cubram os grupos ativistas e suas atividades de forma precisa e justa, não dando a eles um tratamento diferente – de repulsa ou favorecimento – do que o dado a qualquer outro grupo criador de notícias.

Essa tarefa começa com um trabalho de melhor qualidade para retratar quem realmente é conduz o movimento climático. Mesmo depois que as organizações de notícias finalmente reconheceram que os jovens ativistas do clima estavam fazendo notícia, muitas matérias fixaram-se na celebridade de Thunberg e em um pequeno grupo de outras pessoas, ao mesmo tempo que ignoravam o conteúdo de sua mensagem.

“Em vez de se concentrar no clima e ouvir a mensagem científica, as pessoas estão me ouvindo e falando sobre mim”, comentou Thunberg em setembro de 2020.

Essa cobertura dá a impressão de que Thunberg era o único jovem ativista que valia a pena ouvir, uma representação distorcida.

“Querida mídia, vejo que você está escrevendo sobre o processo internacional de crise climática que @GretaThunberg e eu abrimos hoje com 15 outras crianças querelantes”, escreveu no Twitter, em 2019, Alexandria Villaseñor, uma proeminente ativista de Nova York. “Os outros querelantes têm nomes , experiências e histórias. Certifique-se de escrever sobre eles também”.

Alguns veículos até saíram-se bem apresentando uma série de ativistas em suas matérias e mesmo traçando seu perfil e seus feitos. Por exemplo, tanto a CNN quanto a PBS NewsHour publicaram recentemente extensas reportagens sobre ativistas indígenas em Minnesota lutando contra o oleoduto de areias betuminosas da Linha 3 supervisionado pela Enbridge, uma empresa multinacional canadense.

A correspondente da PBS, Ivette Feliciano, entrevistou Winona LaDuke, da organização de justiça climática indígena Honor the Earth, que disse que as emissões de gases de efeito estufa do gasoduto da Linha 3 são o equivalente a 50 novas usinas termelétricas a carvão: “Então, você sabe, se você está tentando salvar o planeta, esta não é a maneira de fazer isso.”

Os meios de comunicação falharam para mostrar a diversidade e a amplitude do movimento climático.

Em um caso emblemático de janeiro de 2020, a Associated Press cortou de uma foto a ativista climática negra Vanessa Nakate, de Uganda, para mostrar apenas seus quatro acompanhantes, todos jovens ativistas influentes brancos, incluindo Thunberg.

No mesmo episódio, a Reuters manteve Nakate na foto, mas a identificou incorretamente como a ativista zambiana Natasha Mwansa. A reação inicial da AP foi dizer que o corte tinha o objetivo de melhorar a composição da foto, mas em seguida a agência desculpou-se pelo erro. Nakate respondeu que a iniciativada AP era uma evidência de como os africanos e representantes de outros países pobres são frequentemente excluídos das conversas sobre o clima. “Isso mostrou como somos valorizados”, disse Nakate.

As questões climáticas modernas e os movimentos ambientais são diversos e enormes. Em vez de selecionar, endeusar e revisitar um punhado de celebridades, os jornalistas devem ouvir uma variedade de vozes, especialmente os ativistas em nível local que representam minorias, como grupos indígenas ou pessoas não brancas cujas comunidades são frequentemente afetadas de forma desproporcional pela mudança climática.

Por isso, reportagens criteriosas sobre o ativismo climático não podem deixar de questionar as propostas e ações dos grupos ambientais. Por exemplo, muitos jovens ativistas abordam a crise climática como uma questão interseccional, na qual outros temas − incluindo aqueles de raça, classe e gênero − moldam suas plataformas e seu trabalho.

Alguns dos grupos de defesa do clima mais bem financiados estão há muito tempo longe de serem diversos em sua equipe e liderança, apesar das repetidas promessas de melhoria. A cobertura de notícias deve envolver de forma contínua toda as agendas dos grupos ativistas, com atenção às suas complexidades e eficácia − e não apenas quando eles estão marchando nas ruas.

Como muitos ativistas diriam, em última análise a história do clima não é sobre eles. Trata-se de saber se a humanidade pode neutralizar a emergência climática a tempo de preservar um planeta habitável. Ao contar essa história, os jornalistas podem ajudar, a si próprios e ao seu público, a compreender o desafio que define o nosso tempo.

Mark Hertsgaard é correspondente ambiental do The Nation e autor de vários livros, incluindo HOT: Living Through the Next Fifty Years on Earth. Este artigo é parte da Covering Climate Now, uma colaboração de jornalismo global  destinada a fortalecer a cobertura jornalística sobre meio ambiente e mudança climática. Organizado por jornalistas e para jornalistas, o CCNow foi criado em abril de 2019, tendo como co-fundadores a Columbia Journalism Review, o The Nation e o The Guardian. Conta com mais de 400 veículos associados, que juntos atingem uma audiência superior a 2 bilhões de pessoas. Hertsgaard é co-fundador e diretor-geral da iniciativa.


Greve Global de Jovens pelo Clima movimenta oito cidades do Brasil

Pelo menos oito cidades do Brasil têm atividades programadas de adesão ao movimento #NoMoreEmptyPromises,  greve global de jovens pelo clima promovida pela Fridays for Future, cridado por Greta Thunberg em 2018. No Brasil, o nome do movimento foi adaptado para #ChegadePromessasVazias. O site da campanha aponta ações em São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Cuiabá, Balsa Nova (PA), Mossoró (RN), Santa Maria (RS) e Palhoça (SC). Desde 2018, já foram realizadas 228 ações em 104 cidades brasileiras. O grupo de Mossoró, que tem 1498 seguidores no Instagram, programou uma ação no centro da cidade. Já o grupo da Paraíba, que tem 1334 seguidores no Instagram, programou sua ação para o Parque da Lagoa, em João Pessoa.

Os países com mais ações realizadas são os Estados Unidos e a Alemanha, que superam a Suécia, terra natal de Thunberg. O Brasil é o país mais ativo do movimento na América do Sul e o 15º no mundo. Na América Latina, só fica atrás do México. O Instagram do Fridays for Future Brasil reúne 21,4 mil seguidores.

 

Mobilização no mundo engajará 752 cidades de 58 países

Na mobilização de 19 de março estão engajados ativistas do movimento em 752 cidades de 58 países. O Fridays for Future, ou FFF, é um movimento global de greve climática cuja origem remonta a agosto de 2018, quando Greta Thunberg, então com 15 anos, sentou-se do lado de fora do Parlamento sueco durante todos os dias letivos  das três semanas que antecederam as eleições na Suécia, clamando por uma ação urgente sobre a crise climática. Logo outras pessoas se juntaram a ela. No dia 8 de setembro, Greta e seus colegas grevistas decidiram continuar sua greve até que as políticas suecas se alinhassem ao acordo de Paris. Eles criaram a hashtag #FridaysForFuture e incentivaram outros jovens de todo o mundo a se juntar a eles. Isso marcou o início da greve escolar global pelo clima.

Seu apelo à ação desencadeou um despertar internacional, com estudantes e ativistas se unindo ao redor do mundo. Desde a primeira ação global em 2018, o movimento já realizou ações em 7970 cidades de 193 países. Entre os principais projetos destacados em seu site, está o SOS Amazônia.

Comunicado internacional do grupo destaca ativista brasileiro

O Fridays for Future tem procurado valorizar as ações dos ativistas locais, procurando dissociar a imagem do movimento da fundadora Greta Thunberg. Com esse objetivo, o comunicado internacional à imprensa sobre a manifestação de 19 de março ressalta os depoimentos de um ativista brasileiro, um polonês e outro filipino, além de Thunberg.

Na mensagem, o grupo diz que o objetivo da mobilização global é exigir ações imediatas dos líderes mundiais em resposta à crise climática que está em curso e que acarretou desastres que devastaram vários países no ano passado. São citados os incêndios florestais que aconteceram em Austrália, América do Norte e América Latina, as secas na África e as tempestades que assolaram a América Central e o Sudeste Asiático. O ativista brasileiro João Duccini declara:

“A ciência é clara: as mudanças climáticas estão exacerbando os desastres naturais ao tornar esses eventos mais fortes, mais intensos, mais frequentes e, portanto, mais destrutivos. A crise climática não é uma catástrofe distante. Ondas de calor, secas, inundações, furacões, deslizamentos de terra, desmatamentos, incêndios, perda de moradias e disseminação de doenças – é com isso que as pessoas e áreas mais afetadas estão lidando com cada vez mais frequência nos dias de hoje. Nossas vidas dependem de ações imediatas”.

Greta Thunberg arremata:

 “O que precisamos agora não é de promessas vazias. Quando sua casa está pegando fogo, você não espera 10, 20 ou 30 anos antes de chamar os bombeiros. Em caso de emergência, você age o mais rápido que puder.”