Depois da BBC, que mostrou o colapso em campo do jogador Christian Eriksen, mais uma emissora pública é criticada por suas decisões editoriais na Europa. Agora foi a vez da RAI, a rede estatal italiana, que abriu um debate no país por ter veiculado imagens de câmeras de segurança que mostram o momento em que um teleférico cheio de pessoas despencou no fim de maio na região do Piemonte.

A cabine é vista se aproximando de sua parada final antes de se elevar repentinamente, em seguida, acelerar de volta a montanha a 100 km/h, e se espatifar no chão, rolando montanha abaixo. Cinco famílias estavam a bordo, 14 pessoas morreram e apenas uma criança de cinco anos sobreviveu.

A filmagem foi obtida pelo canal RAI 3, que a exibiu pela primeira vez, com a cabine borrada. Desde então, o vídeo foi reproduzido total ou parcialmente por vários outros meios de comunicação italianos, com alguns apenas obscurecendo os rostos das vítimas. As imagens correram o mundo e foram publicados também por diversos veículos internacionais, entre eles vários brasileiros.

Dor não deve se tornar ferramenta de entretenimento

A Autoridade Italiana de Proteção de Dados instou as organizações de mídia e usuários de mídia social a não compartilharem as imagens por respeito às vítimas e seus parentes, “para que a dor não se torne uma ferramenta para entretenimento extra”.

A promotora do caso, Olimpia Bossi, falou da “absoluta inadequação” de transmitir as imagens:

“O sofrimento das famílias das vítimas não pode e não deve ser agravado por ações como esta”.

Os promotores afirmam que o freio de emergência do teleférico, que poderia ter evitado o acidente, foi desativado intencionalmente pelos acusados. Três suspeitos são investigados e um deles admitiu ter instalado no início deste ano um suporte em forma de garfo para desativar o freio que estava com defeito.

Dirigente da RAI diz que até ele ficou chocado com imagens veiculadas

Ressalvando sempre ter respeitado as escolhas editoriais dos diretores das emissoras e por isso nunca comentá-las publicamente, o presidente da RAI, Marcello Foa disse que neste caso não poderia ficar calado:

“É dever do serviço público, em circunstâncias como esta, avaliar cuidadosamente todas as implicações, começando pela ética e pelo respeito às vítimas e seus familiares.”

A prefeita local Marcella Severino disse que também ficou chocada com a decisão de mostrar o vídeo: “Não acho que foi apropriado para as vítimas e suas famílias”.

“Sensacionalismo nada tem a ver com direito de imprensa”

A senadora Laura Garvini disse em um post no Facebook que a transmissão da RAI “significa pisar na memória das vítimas e na dor de suas famílias:

“A espetacularização da morte, nada tem a ver com o direito de reportagem.”

A ex-ministra da Educação Valeria Fedeli também não poupou críticas. Ela disse que a RAI precisava explicar sua decisão, que revelou “total desrespeito pelas vítimas e seus familiares”. Para ela, a transmissão foi “ainda mais grave porque foi praticada por prestadores de serviços públicos”.

Jornal defende que imagens valem por 1000 palavras

Mas a avaliação do caso não atingiu uma unanimidade. O jornal La Stampa, um dos maiores da Itália, defendeu sua decisão de veicular o filme. O veículo argumentou que “as imagens são mais fortes do que 1.000 palavras e esclarecem como o funcionamento adequado do freio poderia ter evitado a tragédia”.

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