Há exatamente um ano, durante a preparação de uma edição especial do MediaTalks examinando os efeitos da pandemia sobre o jornalismo e a informação no mundo, os relatos das seis correspondentes brasileiras que colaboraram para o texto tinham pontos em comum, apesar de virem de países diversos.

Um deles era o medo da quebra de empresas jornalísticas, a despeito das taxas de audiência explodindo. O outro era o temor de que o ganho de confiança na mídia, apontado nas primeiras pesquisas pós-Covid, fosse temporário. E em todos, as fake news haviam se tornado um problema ainda maior.

Esta semana trouxe algumas respostas para as incertezas daqueles dias. Uma é que a quebradeira não se confirmou. Houve perdas − de empregos, de veículos que não resistiram, talvez por comorbidades anteriores. Mas não foi o “evento de extinção em massa” que alguns previram.

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Grupo The Economist mostra que reagir é preciso — e possível

Os resultados do grupo The Economist, que acabam de ser publicados, são mais um exemplo de reação àquele cenário desolador. A receita diminuiu 3%, o que chega a ser uma vitória diante da catástrofe que se apregoava. E o lucro bateu 27%.

Uma das medidas foi dar os anéis para não perder os dedos. O grupo fechou duas empresas deficitárias, sacrificando alguns empregos, mas preservando outros. Mergulhou da digitalização, reformulando a versão online e criando novos produtos digitais. A base de assinantes cresceu 9% e a fidelidade do leitor aumentou.

Mas, como diz um mandamento de comunicação, o que vale não é só o que se faz durante uma crise, mas o que se fez antes dela. E o The Economist já tinha deixado de ser apenas uma empresa que vende revistas.

O grupo tem três divisões − eventos corporativos, educação executiva e consultoria − que exploram a reputação da marca para gerar receita e reduzem a dependência do produto principal. Na crise, elas ajudaram equilibrar as contas.

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Imprensa ganha credibilidade no mundo, o que inclui o Brasil

Não foi a única empresa de mídia a contrariar previsões pessimistas − e o New York Times virou referência de crescimento na pandemia. Isso dá a pista para responder a outra questão levantada há um ano: o ganho de confiança se sustentaria?

A resposta veio no Relatório de Mídia Digital do Instituto Reuters, publicado nesta quarta-feira (23/6), e é boa. A confiança aumentou 44% globalmente, e o Brasil ficou em sétimo dentre 46 países onde a confiança na imprensa é mais alta.

Não é pouco, depois de um ano em que se agravaram os confrontos entre o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores com a mídia.

A resistência da imprensa como instituição no País mostrou-se alta, embora alguns veículos tenham sido afetados pela polarização, que reforçou a confiança sobre marcas conforme crenças políticas.

A credibilidade mostrada na imprensa constatada pelo Reuters é mais do que um reconhecimento a quem se desdobra para informar o público, e um bem para a democracia. Se bem aproveitada, pode se traduzir em negócio. Economist e New York Times servem como exemplo.

A capacidade do grupo The Economist de vender análises, atrair patrocinadores para eventos e alunos para seus treinamentos corporativos está diretamente relacionada à excelência de seu jornalismo e a confiança nele.

Fake news, as piores previsões se confirmaram um ano depois

Por outro lado, os temores sobre as fake news não eram infundados. O estudo do Instituto Reuters mostra o Brasil como o mais preocupado do mundo com a desinformação. E como o que mais enxerga o WhatsApp como canal de disseminação de fake news sobre a Covid-19.

Ainda que não seja surpresa, pois o problema já tinha sido identificado em outros estudos, é algo a ser tratado com atenção pelas plataformas, pelos cidadãos e pelas empresas, pelas ONGs, pela imprensa.

A educação é preocupação de especialistas em todo o mundo. Mas o que chama a atenção no estudo do Reuters é que a própria população brasileira tem consciência de que é bombardeada com desinformação pelas plataformas digitais, em uma escala significativa. E parece não saber o que fazer para discernir fato de fake. Teria sido um pedido de ajuda?

Veja a matéria completa sobre a nova edição do Relatório Reuters e as conclusões sobre o Brasil.

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