Para lidar com o assédio online direcionado aos seus profissionais, o grupo de mídia britânico Reach anunciou a criação de um novo cargo em sua estrutura: o de editor de segurança online. O candidato está sendo recrutado no mercado e terá a responsabilidade de prevenir e gerenciar episódios de ataques contra jornalistas resultantes da visibilidade de seu trabalho, com uma política de “tolerância zero”. 

Maior grupo de jornais do país, com títulos regionais e nacionais como o Daily Mirror e o Daily Express, o Reach é o primeiro a designar um editor para administrar situações de assédio online no Reino Unido.

Um dos casos mais recentes teve justamente como alvo uma jornalista de um veículo da empresa, o Hull Live, da cidade de mesmo nome, no nordeste da Inglaterra. 

Leia também: Variante Delta da Covid-19 vira munição para campanha antivacina do movimento radical QAnon

A repórter Anna Riley (que deixou o jornal) recebeu emails ameaçadores de Elizabeth O’Brien, de 31 anos, depois de assinar uma reportagem sobre a morte do Príncipe Philip, reproduzindo comentários de um político eleito local feitos em redes sociais.  

A mulher dirigiu insultos e ameaçou publicar o endereço da jornalista, falou de sua vida pessoal e a incitou a “se matar”. Na semana passada, foi condenada pela Justiça a pagar uma indenização, assumir as custas do processo e a uma pena de trabalhos comunitários. 

A repórter Anna Riley sofreu ameaças após assinar reportagem sobre o príncipe Philip. Foto: reprodução/Hull Live
Editor vai criar protocolos e fazer ponte com empresas de tecnologia

O Reach informou que a decisão de contratar este novo profissional foi tomada depois de uma pesquisa interna respondida por mais de 550 funcionários, que levou à criação de um grupo de trabalho para definir a melhor forma de conduzir as questões envolvendo segurança de jornalistas no ambiente virtual.

O editor de segurança online será responsável por dar suporte aos que sofrerem abusos, criar procedimentos para quando novos casos ocorrerem e liderar ações para prevenir ataques.

Entre as ações sob a sua alçada estará o diálogo com as plataformas de mídia social, resolvendo casos individuais e pressionando por ações para melhorar o problema.

Leia também: Infidelidade, favorecimento, mau exemplo? A crise de imagem que abateu o homem forte da Covid no Reino Unido

O editor-chefe do grupo, Lloyd Embley, disse que embora o Reach já contasse com um sistema para apoiar e proteger os profissionais vítimas de ataques, o aumento de casos determinou a necessidade de alguém dedicado a “enfrentar o problema de frente”:

“O abuso online se tornou endêmico em nossa indústria. Pode afetar gravemente a saúde mental de nossos jornalistas e às vezes até ameaça sua segurança física. Não permitiremos que nosso jornalismo seja silenciado ou que nossos colegas vivam com medo”.

Ataques se intensificaram depois da pandemia 

O Reino Unido não está entre os países mais violentos para jornalistas, de acordo com índices como o da organização Repórteres sem Fronteiras. O governo não promove nem endossa ataques à mídia.

No entanto, as ameaças à integridade de profissionais de imprensa têm aumentado por parte de setores da população, sobretudo os insatisfeitos com medidas de isolamento social e grupos antivacina.

Manifestante usa foto do premiê Boris Johnson. Foto: Jannes Van den wouwer Unsplash

Há também registro de ataques ligados a grupos de extrema-direita em relação a temas como imigração e liberdade religiosa.

Em março, o governo criou um Comitê Nacional para a Segurança do Jornalistas, com representantes da administração pública, do setor jornalístico, das forças policiais, das promotorias de Justiça e de entidades de defesa da liberdade de imprensa. A primeira tarefa do Comitê está sendo o desenvolvimento de um Plano de Ação Nacional, com iniciativas para garantir a segurança dos jornalistas.

Polícia britânica tem representante nacional para proteger jornalistas

Algumas iniciativas já saíram do papel mesmo antes do plano. O Conselho Nacional de Chefes de Polícia nomeou um representante, Gavin Stephens, para assumir a responsabilidade em nível nacional por crimes contra jornalistas. Cada unidade local da polícia terá um oficial designado para cuidar de ameaças à imprensa.

O comitê anunciou também o plano de treinar policiais para a investigação de crimes contra a imprensa e para a proteção dos jornalistas em coberturas de manifestações públicas, com o apoio do Sindicato Nacional de Jornalistas e da Sociedade de Editores.

Apesar das tensões naturais entre o governo e a mídia, e questionamentos recentes sobre bloqueios ao acesso à informações, a posição oficial da administração de Boris Jonhson em relação à liberdade de imprensa é de total condenação a qualquer ameaça.

No dia 14 de junho, o primeiro-ministro se manifestou quando um editor da BBC foi atacado e perseguido por manifestantes contrários ao isolamento social, em uma cena que se tornou viral na internet.

No Twitter, dele disse ser “uma desgraça” ver o jornalista Nick Watt perseguido enquanto fazia o seu trabalho. E que a mídia é vital para a democracia. 

Leia também

Usuários de redes “jovens”, como Snapchat e TikTok, preferem se informar com influencers